Muitos eventos importantes marcam a nossa vida. Mas que valor ou significado você atribuiria a uma experiência trivial, como, digamos, em caso de insônia?

Numa escala mais ampla como você enxerga sua vida em geral: é desajustada ou coesa? À medida que você vive de um dia para o outro, já sentiu que na sua luta pela sobrevivência pode estar perdendo o quadro maior? Os detalhes do seu dia-a-dia (trabalho, pressões) empacam suas prioridades maiores – como encontrar o amor e construir um relacionamento? Numa hora de sofrimento e angústia, você consegue reconhecer que aqueles momentos escuros podem ser parte de uma história mais ampla? Você consegue ver a linha que conecta os fragmentos da sua jornada, ou apenas se move de um momento para outro, tentando tirar o melhor daquilo que surge em seu caminho?

Bem, Purim nos ensina uma ou duas coisas sobre os eventos aparentemente aleatórios da nossa vida.

O maior codificador da Lei Judaica (Rabi Yaakov Halevi, 1360-1427) escreve que o leitor da Meguilá levanta a voz quando começa a ler as palavras na Meguilá (o Rolo lido em Purim relatando a história inteira de Purim) “naquela noite o sono do rei foi perturbado”, porque o milagre básico de Purim começa neste ponto.

Devido à sua insônia, o rei ordenou que o livro de crônicas, que registrava a história do seu reinado, fosse lido para ele. A história que leram era como Mordechai, algum tempo antes, tinha salvado a vida do rei numa tentativa de assassinato. Isto fez o rei ter vontade de recompensar Mordechai, o que deu início a uma série de eventos, como está relatado na Meguilá, o que levou ao milagre de Purim salvando toda a nação judaica da aniquilação.

Isto reflete uma dos temas mais poderosos de Purim: aquilo que você vê não é aquilo que recebe. Num nível superficial, a noite insone do rei – bem como outros eventos aparentemente desconectados e insignificantes na história – seria descartada como algo trivial. Na verdade, aquele se tornou um ponto crucial que mudou o curso da história! Se o rei tivesse dormido pacificamente (e por que não deveria?), ele não teria sido lembrado de Mordechai salvando sua vida e o restante da narrativa jamais teria se desenrolado como foi.

A história de Purim – e a história por trás da história – nos ensina como olhar para nossas vidas de maneira completamente nova e revolucionária.

O Talmud diz: “Aquele que lê a Meguilá de trás para diante não cumpriu a mitsvá.” Por que alguém desejaria ler a história ao contrário? O Baal Shem Tov explica a declaração dessa maneira: Aquele que lê a narrativa de Purim como se tivesse acontecido “lá trás” no passado (com efeito, ler a história de trás para diante, com o final ficando mais perto de nós que o começo), não cumpriu a mitsvá, que exige de nós que leiamos e vejamos a história como se estivesse se desenrolando e ocorrendo hoje, do inicio até a sua conclusão.

A história de Purim é a história de nossas vidas. Nossas vidas, assim como a narrativa de Purim, é dirigida por um roteiro oculto, difícil de reconhecer na hora, mas em retrospecto emerge à medida que descobrimos a narrativa subjacente que leva à salvação. Um quadro mais amplo toma forma a partir de eventos aparentemente desconectados, incluindo os menores detalhes que podemos ignorar completamente e deixar de lado devido à sua trivialidade.

Imagine: Um homem não consegue adormecer e o destino de um povo é mudado para sempre! Quantos outros detalhes estranhos na existência estão afetando nossas próprias vidas enquanto falamos?

Muito antes de Kierkegaard escrever que “você somente consegue entender a vida de trás para diante, mas devemos vivê-la adiante,” temos a história de Purim que nos conta o misterioso drama interior que modela nossas vidas exteriores. O nome de D'us não é jamais mencionado na Meguilá inteira, enfatizando que o Coreógrafo Divino fica por trás do cenário, até mesmo quando Ele comanda uma série de eventos, que para nós podem parecer aleatórios, quando na verdade são molduras de um drama maior se desenrolando.

Purim nos ensina como discernir a narrativa oculta ocorrendo hoje em nossas vidas. Como ver a floresta para as árvores. Ajuda-nos a transcender o momento e conectá-lo com a visão acurada da história de nossa vida.

Portanto da próxima vez que você não conseguir dormir – ou sentir algo aparentemente trivial – você nunca sabe: pode ser o início da sua salvação.