Você já se sentiu empacado em sua vida? Incapaz de cair fora da rotina?

Na porção dessa semana da Torá, Yosef está mais do que empacado. Tendo quase sido morto pelos irmãos, ele é jogado num fosso, depois vendido como escravo, termina indo para o Egito, depois é jogado na prisão. Durante 13 anos Yosef sofreu até que as coisas, milagrosamente, deram uma virada.

Qual foi a atitude de Yosef durante todo esse tempo? Ele tinha todas as desculpas para se fazer de vítima e sentir pena de si mesmo. Afinal, ele não fora apanhado num sofrimento sem esperança? Tinha todos os motivos para ficar furioso e vingativo. Em vez disso Yosef, com a cabeça erguida, aceita aquilo tudo e jamais se esquece de D'us e de seu pai, Yaacov. E quando ele finalmente se reúne com seus irmãos 22 anos depois, conta a todos eles, que ficam chocados: “vocês me venderam aos egípcios. Mas não se preocupem nem se sintam culpados… pois D'us enviou-me à frente de vocês para salvar vidas. Houve uma fome na região… D'us enviou-me antes de vocês para assegurar que vocês sobrevivessem na terra e para sustentá-los com grande liberdade. Não foram vocês que me enviaram para lá, mas D'us. Ele me fez vizir do faraó, chefe de todo o governo e governante de todo o Egito.”

Yosef não se sentiu empacado. Ele sempre soube, embora pudesse não ter visto com os próprios olhos, que “não foram vocês que me enviaram para cá, mas D'us.”

Imagine: um rapaz de 17 anos vendido como escravo, 13 anos depois ele se liberta do cativeiro e se torna vice-rei do Egito. Cerca de 7 anos depois ele transforma o Egito numa superpotência; 22 anos depois de ser vendido, ele controla o destino de seus irmãos e de seu pai, e ainda mais, de toda a população do mundo!

Você ainda está se sentindo empacado?


Passei o último fim de semana num retiro em Running Springs, Califórnia. Aninhados nas serenas montanhas de San Bernardino, com 200 pessoas interessantes, celebramos juntos a vida e suas infindáveis possibilidades.

A Sra. Miriam Swerdlov, uma educadora instigante e envolvente, com uma boa dose de humor, contou-me a seguinte história:

Ela certa vez viajou com um grupo para uma convenção de inverno em Detroit. O voo de retorno estava atrasado por causa de uma tempestade de neve. Eles telefonaram e avisaram o Rebe que estavam “empacados no aeroporto” esperando que a neve diminuísse. O Rebe pediu ao secretário que perguntasse a eles o que significava a palavra “empacado”. Não, não a tradução literal; é que o Rebe nunca tinha ouvido dizer que uma pessoa estivesse empacada em alguma situação. Jamais ficamos empacados num lugar.

Há um motivo para estarmos onde quer que estejamos.

Por obra da Divina Providência, ontem mesmo tive o privilégio de conhecer em primeira mão uma pessoa que, de todas as maneiras, seria considerada “empacada”, mas encontrou uma saída.

Um certo Rabino dá de cara comigo numa loja, e pergunta se me conhece de algum lugar (se alguém não pode ficar “empacado” então acho que “dá de cara” também não é a expressão certa). Não me lembrava, mas ele sim. “Certa vez fui consultar você a respeito da publicação de meu comentário sobre o Talmud em inglês,” ele me disse. Um comentário com 25 volumes. Não é todo dia que você encontra alguém que escreveu 25 volumes sobre o Talmud.

Se isso não é suficiente, então ouça: “E o que você faz atualmente?” pergunto.

“Dirijo uma escola para jovens adultos com doenças mentais, como autismo, esquizofrenia, bipolar, Síndrome de Down e Síndrome de Asperger.”

Engulo em seco.

O rabino me conta que ele próprio tem quatro filhos com problemas mentais, e quem o motivou de abrir essa escola especial foi o Rebe. Anos atrás o Rebe tinha dito a ele: “através de ‘v’shenantem vanecha” você merecerá ‘vedibarta bam.’” Educando seus filhos em Torá você será abençoado para que você e eles se comuniquem – e se conectem.

O rabino então abriu a escola, que agora educa, segundo ele, 28 alunos especiais. Nos doze anos desde a fundação, a escola produziu oito estudantes que se integraram a instituições educativas comuns, e quatro e graduaram-se e conseguiram empregos formais.

“As palavras do Rebe se cumpriram? A educação das crianças melhorou visivelmente a capacidade de elas se comunicarem?”

“Deixe-me contar-lhe o seguinte episódio,” ele me disse, “e você julgará por si mesmo se houve uma melhora visível nas crianças.”

“Na conclusão de um semestre celebramos a formatura de alguns dos nossos alunos. Como uma parte do nosso apoio financeiro vem dos Estados Unidos, sentimos que seria apropriado organizar um evento semelhante em Nova York, para que os patrocinadores vissem com os próprios olhos o progresso das crianças que eles estão ajudando a educar.

“No evento, realizamos um Siyum haShas (conclusão do Talmud), e eu disse ao meu filho autista que ele seria o próximo orador. Meu filho, por falar nisso, nunca tinha discursado perante o público. Eu o apresentei, e eis aqui o que ele disse:

“Vocês sabem o que está escrito no último Rashi de todo o Talmud? O Talmud conclui com a declaração: ‘aquele que estuda as leis da Torá todo dia tem garantida a vida no Mundo Vindouro, pois diz Halichot (os caminhos do mundo) são seus (Chabakuk 3:6). Não leia halichot, mas halachot (Leis da Torá).’ Rashi explica que ‘halochot’ significa ‘mishne u’breisah, halacha l’moshe m’sinai’ (corpos de lei diferentes).

“Mas há uma outra ‘halacha-halicha’, outra forma de movimento, que Rashi não menciona: a tarefa que meu pai assumiu ao estabelecer nossa escola, e o grande progresso que os alunos têm feito, a partir das ‘conchas’ em que estavam fechados até atingirem alturas inimagináveis…”

Esse é o triunfo do espírito humano. Nunca fica preso, nunca engaiolado, nunca sem esperança. Sempre repleto de esperança, entusiasmo e a crença nas infindáveis possibilidades.

Baseado no acima, parece apropriado que a descrição da escola do rabino não seja de “para estudantes com problemas mentais”, mas sim “crianças especiais”, não como eufemismo, mas para reconhecer as forças especiais que suas almas encerram.


Escrevo estas palavras hoje, Yud Tet Kislev, outro grande dia de triunfo – quando um homem, aprisionado pelo regime do czar, foi libertado da prisão. O Alter Rebe, Rabi Shneur Zalman de Liad, reconheceu, como Yosef fizera muitos anos antes, que não estava “empacado”; seu cativeiro era parte do plano mais elevado de D'us. E na verdade, sua prisão e liberdade subsequente – assim como a de Yosef – tornou-se um feriado permanente, celebrando o advento de revelações sem precedentes de sabedoria espiritual, conhecida como Chassidut, dotando-nos com a capacidade de transformar nossa vida contemporânea.