O Judaísmo está repleto de exemplos do poder da visão. Na lei judaica, há uma regra geral de que aquele que testemunha um ato não pode ser um juiz sobre isso. Por exemplo, se você testemunhou um homem arrancar bruscamente uma carteira da mão de alguém e correr, você não pode mais tarde ser um juiz entre esses dois indivíduos no tribunal. Agora que você viu o que parecia ser um assalto, não pode objetivamente ouvir qualquer testemunho sobre o acontecido. Você apenas pode servir como uma testemunha identificando o homem que agarrou a carteira. Isso é porque quando vemos alguma coisa, somos convencidos da sua realidade – a tal ponto, que até o depoimento de várias testemunhas de que o homem estava na verdade recuperando uma carteira que tinha sido roubada dele momentos antes não irá mudar o fato de que seus olhos viram um assalto.

O poder da visão também está refletido nas metáforas para amor usadas na Torá. Quando um relacionamento especialmente próximo, amoroso entre D'us e o povo judeu é mencionado, é descrito como os olhos de D'us sendo dirigidos para nós, para a Terra de Israel e aqueles que vivem ali. A metáfora também é usada para descrever o mais profundo e mais intenso amor entre duas pessoas – expresso ao olhar nos olhos do outro.

O poder da visão também é refletido em dois “eventos” que coincidem um com o outro neste Shabat especial.

Este Shabat é conhecido como Shabat Chazon. Um motivo é que a haftará dessa semana (a seleção dos profetas lida após a porção da Torá) relata uma visão (chazon ,em hebraico) vista poelo profeta Yeshaya’hu. É uma visão da destruição que vai ocorrer em Jerusalém, e é uma das três haftarot de repreensão. Porém, outro motivo vem da visão que é mostrada a cada um de nós neste Shabat – a visão do renascimento que é destinada a seguir a destruição profetizada pelo profeta.

Este é também o Shabat que precede o dia 9 de Menachem Av (Tisha BeAv), quando jejuamos em lembrança da destruição dos dois Templos Sagrados de Jerusalém. Porém este Shabat, quando lemos a porção da Torá, a todo judeu é concedida uma visão do Terceiro Templo, que será construído, se D'us quiser, muito em breve) em Jerusalém.

O propósito da visão é muito mais profundo que meramente nos confortar com a promessa da futura redenção. Na verdade, este é o foco dos sete Shabatots após Tisha B’Av. O ponto da visão que vemos em Shabat Chazon é inspirar uma mudança tão fundamental que iremos transformar aquela visão do terceiro Templo em verdadeira realidade física.

A ideia da visualização como um catalisador para tornar a visão uma realidade não é estranha a nós.

Quando você visualiza uma nova realidade, a interioriza numa maneira que apenas pensar ou falar sobre ela não vai funcionar. Ela torna-se algo que você sabe, com que pode se relacionar e entender. Um bom contador de histórias entende isso, e usará palavras para pintar um quadro que o leitor pode ver, e em alguns casos não pode resistir a vê-lo por si mesmo. É a capacidade de criar visualização que faz da história algo que permanece como uma parte de nós.

Neste Shabat, D'us “tira vantagem” por assim dizer, desse próprio aspecto da natureza humana: que aquilo que vemos, mesmo se apenas com o olho da nossa mente, continua conosco e nos afeta intensamente. Ele nos mostra uma visão do futuro que Ele está esperando para nos dar, e a própria visão se torna a ferramenta com a qual tornamos este mundo preparado para realizar isso.

Os conceitos por trás disso são duplos. Por um lado, a visão do futuro é para acender dentro de nós um desejo e anseio para ver que o futuro se torne nossa realidade presente. Por outro lado, porque é algo que nossa alma vê, o fato de que realmente existe é imediatamente interiorizado e se torna parte de nós. Portanto estamos simultaneamente ansiando por algo distante de nós, e mesmo assim inspirados, e em paz, com algo cuja presença podemos sentir interiormente, algo com que podemos nos relacionar completamente.

O resultado é que uma pessoa é capaz de mudar; é totalmente incapaz de permanecer estagnada. Cada um de nós é forçado a seguir em frente melhorando nosso comportamento, e é simplesmente segunda natureza fazê-lo. Além disso, as mudanças inspiradas por este Shabat se tornam permanentes.

O Rebe enfatizava que todo e qualquer indivíduo pode acessar este poder para mudança numa maneira tangível, meditando neste Shabat sobre o que nossa alma verá, uma visão de uma Casa que irá fundir os mundos superior e inferior, realidade física e espiritual, em união permanente. A dinâmica particular desse Shabat – que recebemos uma inspiração Divina na forma dessa visão do Templo, e o esforço da nossa parte para visualizar em nossas mentes e meditar sobre aquilo que nossa alma está vendo – espelha os próprios três Templos.

O Primeiro Templo estava repleto com uma luz Divina mais poderosa que o segundo. Os milagres associados a ele são de uma natureza muito superior. Porém ao mesmo tempo, nossos sábios nos dizem que quando foi construído, D'us sentiu uma certa ira sobre nós. Não estávamos cuidando das coisas da maneira que deveríamos cuidar, e não estávamos realmente preparados para o Templo e suas revelações. Por fim foi destruído.

O Primeiro Templo foi construído por ordem e ajuda Divina, o segundo Templo foi construído às ordens de um ser humano. O nível de revelação associado com isso, e os milagres que se seguiram, foram muito menos intensos. Porém, exatamente porque foi construído por esforços e iniciativa humanos, teve um impacto maior sobre este mundo. Era maior que o primeiro Templo, usando mais deste mundo em termos de espaço, e demorou mais tempo, ocupando este mundo por um tempo maior.

O Terceiro Templo, como o Shabat no qual visualizamos a sua imagem, combina as forças do primeiro e do segundo Templos, a revelação Divina – uma inspiração vinda do alto – junto com esforço humano, uma inspiração de baixo, para criar um lar permanente para D’us na terra. Assim é a lição e a inspiração deste Shabat. Recebemos uma visão divinamente revelada, que devemos combinar com esforços humanos, para alterar permanentemente o mundo em que vivemos – e, ainda mais desafiante, a nós mesmos.