Toda mitsvá na Torá pode ser colocada em uma de duas categorias. A saber, mitsvot bein adam la Makom - mandamentos entre o homem e D’us (i.e., comer casher, guardar o Shabat e recitar as bênçãos), os quais não têm efeito direto sobre outras pessoas; e mitsvot bein adam l'chaveiro – mandamentos que envolvem interação com outras pessoas. Muitas vezes tornamo-nos muito envolvidos com o primeiro tipo, e perdemos de vista o segundo. Em várias partes desta porção semanal, porém, vemos a sensibilidade que é necessária para aquelas mitsvot que envolvendo o homem e seu próximo.

A Torá nos diz que se uma pessoa deseja tirar ovos ou filhotes de um ninho, primeiro deve enxotar a ave mãe (Devarim 22:6). O Ramban explica que uma das razões para este mandamento é para que não ajamos com um coração mau e impiedoso, causando à ave o desconforto de testemunhar alguém tirando seus filhos.

A Torá também nos ordena não arar com um boi e um burro juntos (ibid. 22:10). O Da'as Zekeinim explica que uma das razões da proibição pode ser o fato de que o boi fica ruminando, ao passo que um burro não o faz. Imagine o sofrimento do burro se, trabalhando lado a lado com o boi, virar a cabeça e vir o boi mastigando. "Onde ele conseguiu comida," poderia o burro pensar, sofrendo pelo fato de o boi ter comida e ele não.

Em ambos os casos, a Torá nos ensina uma incrível lição de sensibilidade, que devemos ter para não provocar desconforto e sofrimento nos outros. Se a Torá pode ser tão exigente sobre quão sensíveis devemos ser a estes animais, quanto mais tratando-se de sermos sensíveis com outras pessoas.

Rabi Paysach Krohn enfatiza esta idéia e relata a seguinte história, que exemplifica como devemos ir longe para impedir o sofrimento de outra pessoa. Houve certa vez um homem que sempre carregava consigo um pacote com moedas de cinquenta centavos. Após sua morte, alguém revelou a razão para isso. No local onde o homem ia para rezar, pessoas pobres sempre o cercavam, pedindo contribuições. Este homem percebeu que se tirasse um real e pedisse troco, o pobre sentiria um entusiasmo momentâneo, à possibilidade de ganhar um real inteiro. Então, teria que pedir troco, e o pobre ficaria desapontado. A fim de evitar o desconforto passageiro da pessoa necessitada, este homem sempre tinha um suprimento de moedas de cinquenta centavos, para que tivesse o troco certo quando fosse necessário.

Esta história serve como exemplo de como devemos ser sensíveis aos sentimentos dos outros, sempre nos esforçando para impedi-los de passar por qualquer sofrimento desnecessário. Quando alguém precisa de uma mão amiga, não importa se o problema é grande ou pequeno, é nosso dever oferecê-la. Pois se a Torá pode preocupar-se com o mal-estar temporário de um burro, certamente espera-se de nós que dediquemos algum tempo a evitar o sofrimento de uma pessoa necessitada. E se devemos ser tão cuidadosos para impedir que alguém sofra, mesmo que seja o desapontamento momentâneo de um pobre que percebe que irá receber apenas parte daquilo que imaginava, muito mais não devemos ser a fonte daquele desconforto, humilhando ou depreciando ridicularizando os outros.

Com isso em mente, que sejamos capazes de cumprir todas as mitsvot – tanto aquelas entre o homem e D’us quanto aquelas entre as pessoas – com a devida sensibilidade e respeito uns pelos outros.