Prisioneiro de Guerra - Por Yoel Spotts

À primeira vista, a seção registrada no início da porção desta semana da Torá a respeito de eshet y'fat to'ar parece inteiramente fora de caráter com a mensagem geral da Torá. Durante todos os cinco livros de Moshê lemos sobre as leis enfatizando a restrição e auto-disciplina, responsabilidade e controle. Mesmo assim, na porção desta semana da Torá descobrimos o caso de eshet y'fat to'ar, quando um soldado, em tempo de guerra, tem permissão de abandonar aqueles ideais elevados e render-se a seus desejos.

Que mensagem a Torá está tentando transmitir, quando aparentemente permite que soldados judeus apoderem-se de mulheres cativas à vontade, sem dar importância alguma ao auto-controle?
Entretanto, antes que façamos um julgamento apressado, devemos primeiro examinar mais cuidadosamente os versículos que relacionam a atitude prescrita, pois o consentimento da Torá a esse encontro com uma mulher prisioneira não representa nem metade da história.

Em Devarim 21:12, aprendemos que logo após seu encontro inicial, a mulher deve raspar sua cabeça e deixar crescer as unhas, certamente uma visão nada atraente. O versículo 13 explica ainda que ela deve chorar incessantemente por seus pais mortos, durante trinta dias, tudo isso à vista de seu captor. Apenas após este mês de luto eles poderão iniciar um relacionamento normal como marido e mulher. Certamente após esta exibição, quase qualquer homem se tornaria rapidamente desinteressado pela mulher que, apenas pouco tempo atrás, tanto estimulara seu interesse.

Na verdade a Torá, esperando tal reação, prescreve a ação correta que fará com que o homem não mais deseje esta mulher como esposa. Obviamente, a aparente sanção da Torá a tal comportamento não é bem precisa; claramente, existe aqui uma mensagem mais profunda. Consideremos por um momento a provação do soldado em tempo de guerra. Afastado da esposa e da família por meses intermináveis, está sujeito às duras condições do brutal confronto. Se isso não fosse suficiente, deve ainda suportar as tentações da mulher não-judia que passou a desfilar em frente aos soldados da forma mais sedutora possível, a fim de distrair sua atenção da batalha. (De fato, por este motivo a Torá exige que a mulher "raptada" troque suas roupas de guerra antes de entrar na casa do soldado.) O soldado judeu nesta situação poderá ver-se incapaz de controlar suas emoções, e conseqüentemente ficar seduzido pelas armadilhas desta mulher.

O que deve acontecer com este soldado – ser condenado à danação eterna pelo seu crime? O Judaísmo diz que não. D'us criou o homem como um ser físico num mundo físico, com desejos físicos. É claro que a missão do homem nesta terra é superar sua má inclinação, que o leva a agir segundo estes desejos. Entretanto, não se pode esperar que a pessoa domine suas emoções do dia para a noite. É uma batalha para a vida toda. Dessa maneira, a Torá aceita que a pessoa possa ver-se incapaz de resistir aos apelos do pecado. Apesar disso, não deve permitir-se permanecer neste estado de depravação. Embora tenha falhado desta vez, deve tomar as precauções para ter sucesso na próxima. Dessa maneira, o soldado deve raspar a cabeça da mulher, permitir que suas unhas cresçam, abster-se de ter relações com ela, fazer tudo para tornar a mulher desprezível. Afortunadamente, quando trinta dias se passarem, seu desejo pela mulher também terá passado.

Embora muitos de nós jamais tenhamos nos defrontado com estas mesmas circunstâncias que o soldado judeu descrito na porção desta semana da Torá, mesmo assim temos que suportar nossa própria cota de tentações. Não se espera que a pessoa consiga derrotar seus desejos todas as vezes. O Rei Salomão declarou isso há muito tempo, quando disse: "Não existe homem que seja tão correto na terra que sempre faça o bem e jamais peque" (Cohêlet 7:20).

Todos em alguma ocasião sucumbem por seus desejos. A verdadeira questão é: O que acontece depois? A pessoa se renderá às suas fraquezas, resignando-se à noção de que o homem não tem esperança em sua guerra contra a má inclinação e que tudo está perdido? Ou se reerguerá com nova determinação, acreditando que embora possa ter perdido a batalha, ainda pode vencer a guerra?

Aprenderá realmente com seus erros, e tomará as devidas precauções para assegurar futuras vitórias?

A maneira pela qual alguém responde estas perguntas determina se ele se permitirá ser refém de suas emoções, ou se será capaz de libertar-se das amarras da má inclinação. Com o mandamento de eshet y'fat to'ar, a Torá nos forneceu uma receita para tratar eficazmente a síndrome de pós-pecado.

Agora cabe a nós tomar corretamente o remédio.