Adaptado de Likutei Sichot, vol. 10
Lágrimas de uma Criança
Quando o Rabino Shalom Dov Ber, o quinto Lubavitcher Rebe, era uma criança pequena, ele foi levado ao seu avô, o Tzemach Tzedek para receber uma bênção em seu aniversário. Quando entrou na sala de seu avô, ele começou a chorar.
Depois de acalmá-lo, seu avô perguntou-lhe o motivo de suas lágrimas. O menino respondeu: “Na escola, nós aprendemos que o próprio D’us revelou a Si mesmo a Avraham. Por que Ele não revela a Si mesmo para mim?”.
O Tzemach Tzedek respondeu: “Quando um judeu1 de 99 anos de idade reconhece que ele precisa circuncidar a si próprio, ele merece que D’us revele a Si mesmo para ele”2.
Redefinindo as Referências
O Zohar3 destaca a circuncisão de Avraham como um evento decisivo na natureza das revelações que ele recebia. Ao descrever as revelações feitas a Avraham antes da circuncisão, a Torá declara4: “E D’us apareceu a ele em uma visão”, usando o termo aramaico machezeh (מחזה) para a palavra “visão”. Em contraste, a Parashá Vayera começa: “E D’us apareceu a ele”5, usando o termo hebraico (וירא) que significa revelação direta.
Hebraico é Lashon HaKodesh, “a língua sagrada”, o idioma que D’us emprega para expressar a Si mesmo. Outros idiomas, ao contrário, são invenções humanas. Ao usar o termo aramaico, a Torá indica que as revelações vivenciadas por Avraham antes da circuncisão eram revestidas com os ornamentos de nosso mundo material. Ele podia imaginar D’us somente em termos humanos; ele não podia apreciá-Lo como Ele realmente é.
Uma grande lacuna separa o homem mortal da infinitude de D’us. Por definição, qualquer concepção humana pode apenas ser uma visão restrita. O ato da circuncisão transformou Avraham, permitindo que ele percebesse D’us como Ele é. Portanto, a revelação de Vayera foi direta, sem véus ou restrições. D’us manifestou a Si mesmo para Avraham de forma aberta, transpondo a lacuna que separava todo ser criado de seu Criador.
Esforço do Homem, Resposta de D’us
Isto explica a distinção entre a Parashá Lech Lecha e a Parashá Vayera. A Parashá Lech Lecha descreve a luta de Avraham para exceder os limites da existência mortal e desenvolver uma ligação completa com D’us6. O ápice desta busca espiritual foi sua circuncisão, que estabeleceu tal ligação em sua própria carne7.
Avraham deixou sua herança aos seus descendentes, pois “as ações dos antepassados servem como um sinal a seus filhos”8. Ao cumprir a Torá e suas mitsvot, todo judeu tem o potencial de transcender sua natureza individual e entrar em uma conexão ilimitada com D’us.
Doença e Cura
A revelação da Parashá Vayerá está associada a cura. Avraham estava sofrendo com a dor da circuncisão. D’us veio para “visitar o doente”9 e, com esta visita, curou-o.
Para explicar este fenômeno: A palavra hebraica חולה, que significa “afligido pela doença”, é numericamente equivalente a 4910. Nossos Sábios11 falam dos “50 portões do entendimento” que concedem ao homem o conhecimento de D’us. Dentro do alcance do conhecimento humano, é possível “entrar”somente em 49 destes portões. O 50º está, por definição, acima do nosso alcance.
Alguém que tenha alcançado o 49º nível aprecia sua incapacidade12 e quer se elevar acima dela. O fato de que sua própria condição humana o previne de assim fazê-lo o faz ficar doente em seu coração. O Rei Salomão aludiu a esta doença em sua alegoria13: “Suporte-me com troncos robustos; deixe-me descansar entre as macieiras, pois eu estou apaixonado”.
Tal doença é curada através da revelação perfeita de Vayerá. Somente a manifestação direta de D’us cumpre este desejo e refaz a natureza da pessoa, permitindo-a perceber sua essência e função Divinas inatas além de suas limitações mortais14.
Com o Coração de uma Criança
O desejo por uma conexão direta com D’us é um elemento fundamental da constituição de toda pessoa. Quando o Rebe Rashab veio ao seu avô pedir uma bênção em seu aniversário, ele meramente expressou este desejo.
A moral desta história é universal. Dentro de cada um de nós existe uma dimensão simples, pueril, que deseja se ligar a D’us. Sem deixarmos de funcionar como indivíduos maduros, cada um de nós pode compartilhar um relacionamento abrangente com D’us15.
O exposto acima é particularmente relevante na época atual, momentos breves antes da vinda de Mashiach. Pois a essência da Era da Redenção será a revelação direta de D’us; “Teu Mestre não mais ocultará a Ele mesmo, e teus olhos perceberão teu Mestre”16. Enquanto estamos no limiar desta era, a sede interior pode ser sentida mais fortemente.
Além disso, existe o potencial de vivenciarmos uma antecipação da Redenção na época atual. Nós podemos desenvolver uma consciência de D’us e reconhecê-Lo como uma força verdadeira impregnando cada aspecto de nossas vidas.
Medida por Medida
A Torá nos diz que D’us apareceu a Avraham enquanto ele estava “sentado na entrada de sua tenda, no calor do dia”17.
Por que ele estava sentado lá? Para procurar por hóspedes18. Avraham se dedicava a ações de bondade, alimentando peregrinos famintos em um esforço de aumentar suas consciências por D’us19. Porque ele próprio se esforçava para trazer outros para mais perto de D’us, D’us mostrou a ele uma suprema expressão de proximidade.
“Os dias estão chegando..., [quando as pessoas terão] fome, mas não por pão; sede, mas não por água, mas para ouvir a palavra de D’us”20. Somente às vezes, como na história do Rebe Rashab, é esta sede expressada conscientemente. Na maioria dos casos, uma pessoa não terá consciência de sua própria sede. Mesmo assim, quando imitamos o exemplo de Avraham e estendemos a nós mesmos aos outros, descobriremos uma propensão ávida para responder que reflete suas necessidades interiores.
E, como no exemplo de Avraham, estes esforços beneficiarão não somente os receptores, mas também os doadores, precipitando uma conexão mais profunda com a Divindade. Esta conexão continuará a florescer até atingir a perfeição na Era da Redenção. Que isto possa acontecer já!
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