Suponho que cada um de nós tenha seus próprios candidatos para livros que nos mudaram e nos ensinaram a ver o mundo de maneira um pouco diferente.

Minha escolha seria a Hagadá, o livro que os judeus em todo o mundo estarão lendo em Pêssach, a história do Livro de Shemot que relata como nossos ancestrais, há 33 séculos, foram libertados da escravidão e começaram aquilo que Nelson Mandela chamou de "a longa caminhada para a liberdade". Obviamente, não apenas o lemos, nós o revivemos, comendo o pão ázimo da aflição e as ervas amargas da opressão, e tudo isso tem início com perguntas feitas por uma criança.

E embora pensemos nela como uma história judaica, foi adotada por outros como sua. Quando os americanos conseguiram conquistar sua liberdade dos ingleses, Thomas Jefferson comparou-a ao Êxodo. Quando os afro-americanos marcharam pela liberdade, cantaram as palavras de Moshê: "Deixe meu povo ir." É uma das grandes narrativas de esperança e realmente ajudou a mudar o mundo.
Por quê?

Porque foi a primeira vez que a religião entrou na situação humana como uma voz revolucionária. As religiões do mundo antigo, como seus substitutos seculares de hoje, eram justificativas do status quo. Explicavam por que os ricos e poderosos tinham de ser ricos e poderosos. O Êxodo disse o contrário. O poder supremo entra na história para resgatar os indefesos. O D'us de toda a humanidade nos pede para garantirmos liberdade e dignidade para todos os seres humanos. Acima de tudo Ele nos ordena a amar o estrangeiro, porque nossos ancestrais certa vez foram estrangeiros numa terra que não era a deles.

O que me assombra neste Pêssach é como a humanidade está se saindo mal no Século XXI. A religião ainda hoje está sendo usada como uma desculpa para a violência e derramamento de sangue. Mesquitas, sinagogas, templos hindus e santuários budistas ainda são atacados. As pessoas ainda odeiam em nome do D'us do amor, matam em nome do D'us da vida, e praticam a crueldade em nome do D'us da compaixão. Pergunto-me se o próprio D'us não chora ao ver as maldades cometidas em Seu Nome.

Pêssach tem início com estas palavras: "Este é o pão da aflição que nossos ancestrais comeram no Egito. Venham todos que estão famintos e comam."

A liberdade começa quando partilhamos nosso pão com outros. Uma história simples, porém ainda com o poder de mudar o mundo.