Em sua explicação sobre nossos costumes e tradições, o Rabi Yaacov Levi, conhecido como Maharil, codificador de leis, retrata a origem do costume de Tashlich até épocas muito remotas. É realizado pouco antes do pôr-do-sol na tarde do primeiro dia de Rosh Hashaná, indo às margens de um rio, lago, ou algo semelhante, onde certas preces são recitadas, seguidas pelo simbólico agitar dos cantos de nossas roupas.
Os três últimos versos do profeta Michá, que recitamos em Tashlich, contém a explicação para este costume. Dizemos: "Quem é um D'us como Vós, perdoando a iniqüidade e perdoando a transgressão aos herdeiros de Seu legado. Ele não reteve Sua ira para sempre, porque Ele se regozija na bondade. Ele mais uma vez terá misericórdia de nós. Ele suprimirá nossas iniqüidades; sim, Vós jogareis nossos pecados às profundezas do mar."
O Maharil nos fornece uma explicação mais completa de Tashlich. O Midrash nos diz que quando Avraham (Abraão) e Yitschac (Isaac) foram ao Monte Moriyá para a Akedá (amarração de Yitschac), precisaram cruzar um rio, uma das formas que Satan (o Acusador) usou para impedi-los de cumprirem as ordens de D'us. A correnteza ameaçava levá-los, mas Avraham rezou: "Salve-nos, D'us, pois a água atingiu nossas próprias vidas," e foram salvos da correnteza.
Assim, diz Maharil, nenhum obstáculo deveria impedir-nos de obedecer às ordens de D'us. Aquele que pode mostrar o amor abnegado de Avraham sua prontidão para morrer pela palavra Divina, pode estar certo de que "seus pecados serão jogados ao mar".
Nós e os peixes
A prece de Tashlich, recitada às margens de um rio, lago ou mar, onde quer que haja peixes, tem um outro significado, despertando-nos pensamentos de arrependimento. Pois isto nos lembra da insegurança da vida do peixe, e o perigo do peixe ser atraído pela isca, ou de ser apanhado na rede do pescador. Nossa vida, também, está repleta de ciladas e tentações.
Somos lembrados da clássica parábola de Rabi Akiva, que desafiou o decreto proibindo o estudo de Torá que o imperador romano Adriano tentou impor aos judeus.
Ao lhe perguntarem por que arriscava sua vida estudando e espalhando os ensinamentos da Torá, Rabi Akiva replicou com a seguinte parábola:
"Uma raposa faminta chegou até a margem de um regato. Viu os peixes nadando incessantemente. A astuta raposa disse aos peixes: 'Vejo que estão vivendo num terror mortal de que caiam na rede do pescador. Saiam aqui para a margem seca, e escaparão da rede do pescador, e então viveremos felizes para sempre, como meus antepassados viveram com os seus.'
"Mas os peixes zombaram da esperta raposa, e responderam: 'Se na água, que representa nossa própria vida, estamos em perigo, certamente deixar a água significaria morte certa para nós!'
"A Torá é nossa própria vida, e não podemos viver sem ela, assim como os peixes não podem viver sem a água. Podemos salvar-nos abandonando nosso modo de vida, os caminhos da Torá?"
Tais são as reflexões que Tashlich desperta no coração.
Finalmente, o peixe nos serve de lembrete adicional do "olho sempre vigilante" da Providência, pois os peixes não têm pálpebras; seus olhos estão sempre abertos. Assim, nada pode ser oculto de D'us. Pelo mesmo padrão, a pessoa extrai coragem e esperança da fé em D'us, pois o Guardião de Israel jamais dorme ou cochila.
Tempo precioso
Na Idade Média o costume de Tashlich era usado muitas vezes para acusar os judeus de fazer um feitiço sobre a água, ou mesmo envenená-la, e os Rabis eram, naquela época, obrigados a proibir a observância de Tashlich pelas suas comunidades, de forma a não ameaçar-lhes a vida.
Rabi Abahu disse: "Os Anjos Auxiliares perguntaram ao Todo Poderoso: 'Mestre do Universo, por que os judeus não recitam a canção de Halel perante Vós em Rosh Hashaná e Yom Kipur?'
"Respondeu-lhes D'us: Quando um rei senta-se no Trono do Julgamento, com o Livro da Vida e da Morte aberto à Sua frente, é correto que os judeus cantem a Mim nesta época?"
Não há horário para se dormir em Rosh Hashaná: o tempo é precioso demais. Nem bem acabamos a refeição, e voltamos para a sinagoga. No primeiro dia de Rosh Hashaná, Minchá (a prece vespertina) é recitada cedo devido ao Tashlich, e além disso, queremos recitar o maior número de Salmos. Alguns conseguem dizer todo o livro de Tehilim (Salmos) diversas vezes durante os dois dias de Rosh Hashaná. Depois de Minchá, as pessoas saem para Tashlich, ao local mais próximo onde haja água natural e peixes (lago, rio ou oceano).
Ali, à beira da água, fazemos as orações de Tashlich e sacudimos os fios do tsitsit. Isto é simbólico das palavras do profeta Michá: "E atirarás para a profundeza do mar todos os seus pecados..."
Naturalmente, sacudir os cantos da roupa não nos livra de nossos pecados. Mas certamente nos recorda de que devemos fazer uma boa limpeza no coração e livrá-lo de todo o mal.
E de fato, temos a sensação depois do Tashlich de termos nos livrado de um pesado fardo. É uma sensação reconfortante, que nos ajuda na realização das nossas boas decisões para o ano que entra.
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