No Século 18, o Baal Shem Tov (lit., “Mestre do Bom Nome:”) fundou o movimento chassídico, que era caracterizado por uma abordagem mística, alegre ao Judaísmo que era revolucionário numa época na qual muitos judeus se sentiam desprezados e inferiores.

Um seguidor deste movimento é chamado um “chassid”, que é mais ou menos traduzido como “aquele piedoso”: ou “aquele que vai além da letra da lei.”

No entanto, o próprio termo prediz o movimento chassídico e pode até ser encontrado no Tanach.1

Na era talmúdica, muitos sábios eram mencionados como chassidim, “piedosos”. Mais tarde, no século 12 na Renânia [um dos 16 estados da Alemanha, situado no sudoeste do país], ou Askenazi na terminologia, havia uma proeminente escola de ascéticos que eram mencionados como chassidim, ou chasidie Ashkenaz. Assim vemos que um dos rabinos mais importantes do século 12 – séculos antes do movimento chassídico – autor da clássica obra Sefer Chassidim, é comumente mencionado como Rabi Yehuda Hachassid (1150-1217).2

Então por que os seguidores do Baal Shem Tov eram chamados de chassidim? Chamar a si mesmo ou movimento de chassidim iria parecer que você era um pouco pretensioso e presunçoso, no mínimo. Então, como os chassidim vieram a ser chamados por este nome?

Na Casa do Difamador

Essa mesma pergunta foi feita a Rabi Shneur Zalman de Liadi, o primeiro Rebe de Lubavitch, conhecido como o Alter Rebe, durante um incidente um tanto desafortunado.

No ano 1798, Rabi Shneur Zalman foi falsamente denunciado pelos seus caluniadores e acusado de traição. Quando finalmente ele foi exonerado e libertado da prisão ao anoitecer de 19 de Kislev, as autoridades lhe perguntaram para onde deveriam levá-lo. Ele respondeu que deveriam levá-lo à casa de Reb Mordechai Liepler, um de seus seguidores. No mesmo prédio também morava um dos lideres mitnagdim (oponentes dos chassidimo), pelo nome de R. Nota Notkin, e infelizmente, Rabi Shneur Zalman por engano foi levado à casa dele.

Durante três horas, até os chassidim perceberem o que tinha acontecido, ele repreendeu, reclamou e argumentou contra os chassidim, a tal ponto que Rabi Shneur Zalman mais tarde declarou que sofreu mais durante aquelas três horas do que durante o tempo todo em que esteve preso. Uma das suas reclamações era essa mesma pergunta: como os chassidim poderiam usar um título tão elevado como “chassid” para eles mesmos?!

Rabi Shneur Zalman respondeu que na verdade foram os primeiros oponentes dos chassidim que chamaram o novo movimento por aquele nome e referiam-se a eles mesmos como “os mitnagdim” (“aqueles que se opõem ou são contrários”). Na verdade, teria logicamente feito mais sentido para os detratores referir-se a si mesmos como chassidim e chamar o novo movimento de “mitnagdim,” pois este novo movimento estava aparentemente (pelo menos segundo a oposição) indo contra a principal corrente. Obviamente, o fato de os seguidores do novo movimento merecessem ser chamados de chassidim pelos seus próprios detratores foi um ato da Divina Providência.

A razão pela qual eles mereceram este nome foi que um dos pontos centrais dos ensinamentos chassídicos é que a pessoa deveria estar pronta para se colocar ao lado, no intuito de promover o melhoramento dos outros. Isso é baseado num ensinamento do Talmud sobre cortadores de unha, o que pode causar injúria espiritual:

“O justo enterra suas unhas, o chassid piedoso as queima, e os perversos descuidadamente as jogam fora.”3

A explicação para isso é que os pedaços de unhas cortadas devem ser cuidadosamente descartados, para evitar que uma mulher grávida tropece neles e possa ter um aborto. A Cabalá explica que as forças da impureza estão muito mais conectadas com a parte das unhas que estão fora dos nossos dedos e são cortadas

Então aquele que é piedoso, o chassid, é alguém que vai além da letra da lei e não apenas enterra as unhas; ele as queima, assegurando que não há chance de serem desenterradas e causarem injúria. Ele faz isso apesar do fato de que queimar as unhas, algo que já fez parte dele, pode ser espiritualmente prejudicial a si mesmo. Porém, para garantir que ele não é, mesmo que inadvertidamente, a causa do ferimento de alguém, o chassid está pronto a queimar suas unhas.4

O Rebe explica que, num nível pessoal, as “unhas” representam a parte do nosso corpo que pode ser usada para arranhar ou causar dor a alguém. Assim, a importância de cortar as unhas nos ensina que antes de interagirmos com outros, e especificamente antes de denegrir alguém, precisamos “primeiro aparar nossas unhas.” Devemos assegurar que qualquer crítica é feita não para satisfazer nosso anseio por criticar ou diminuir, mas apenas em benefício da pessoa em mente.

Assim, ser chamado de chassid serve como um lembrete de que ele, ou ela, deveria estar estar sempre pronto para se colocar de prontidão na linha de aprimoramento dos outros.