Exatamente quando completou 94 anos, minha mãe começou, pela primeira vez na vida, a estudar Torá. Eu tinha abordado essa ideia pouco tempo antes, e não estava certo qual seria a resposta. Para minha surpresa, minha mãe respondeu que ficaria feliz em fazê-lo.

Havia dificuldades. Sugeri que ela e eu estudássemos juntos – diariamente. Esse arranjo nos deu uma premissa, um empurrão na verdade, conversando sobre questões de saúde mas também sobre atividades diárias, seus netos (meus filhos), notícias em Jerusalém (onde moro} e na Califórnia (onde ela residiu durante os últimos 75 anos de sua vida).

Portanto foi assim que começou. Eu ligava todo dia e passávamos talvez vinte minutos falando sobre a porção semanal da Torá. Primeiro eu resumia e então ela fazia suas observações. Às vezes eu parava no meio de meu resumo e perguntava se ela estava ali. Ela respondia: “Oh, sim – mal posso esperar para ver o que vai acontecer em seguida.”

Eu tinha recebido a ideia de um amigo cuja mãe idosa não tinha, como a minha, nunca feito qualquer estudo de Torá. Porém quando ele a visitou para uma estadia mais prolongada, ela concordou com o convite do filho para estudar.

A princípio eu estava cético se minha mãe iria reagir tão calorosamente. Apesar do fato, durante anos seguidos, ela permanecia totalmente lúcida, e apesar de ser uma leitora ávida (que participara não de um, mas de dois clubes do livro), a perspectiva de levar minha mãe ao círculo da Torá parecia um salto. Então deixei a questão de lado durante anos. Mas quando minha mãe chegou aos 94 anos, a ideia surgiu de novo, e dessa vez, resolvi agir.

Durante dois anos {dos 94 aos 96 anos) tivemos o privilégio de nosso estudo diário (obviamente enfeitado com o assunto da nossa vida diária). Passamos duas vezes através de todo o ciclo das porções da Torá – o drama, os rituais, as festas, as perdas.

Na verdade, nosso estudo final ocorreu sobre a quinta seção da Parashá Chukat, que descreve o falecimento de Aharon HaCohen, Aaron o Sumo Sacerdote. Os sábios nos dizem que ele mereceu a morte mais sublime e gentil: a de ser levado embora por um beijo Divino deste mundo para o próximo.

No calendário judaico, a data era dia 8 do mês de Tamuz. Para mim, em Jerusalém, era manhã da terça-feira; para ela, em Los Angeles, era tarde da noite da quarta-feira. Mais tarde naquele dia, recebi um telefonema da vizinha de minha mãe, uma amiga da família durante mais de cinquenta anos, dizendo que minha mãe tinha falecido durante a noite, enquanto dormia. Aparentemente, um beijo Divino a tinha levado para o outro mundo, assim como tinha levado Aharon HaCohen.

Como minha mãe, apesar de uma idade avançada, estava desejando começar algo completamente novo, fresco, e não familiar a ela, o beijo da Torá foi partilhado por nós durante dois anos. E, em sua própria maneira, partilhado por nós para sempre.