Parashá Nassô
Bamidbar 4:21 - 7:89
No Jardim da Torá

Por Que Rav Yossef Celebrou?

Ao descrever a nova dimensão do serviço Divino produzida pela entrega da Torá, o Talmud1 declara que Rav Yossef comemorou de forma especial por que: “Se não fosse por aquele dia que provocou [uma mudança radical]… quantos Yossefs existiriam no mercado?”

Rashi explica: “Se não fosse por aquele dia em que eu estudei Torá e me tornei elevado... saiba que existem várias pessoas na rua chamadas de Yossef. Quê diferença existiria entre eu e eles?”

Rav Yossef estava falando em termos alegóricos. O “mercado” serve como uma analogia para nosso mundo material, enfatizando três aspectos de nossa existência.

  1. No mercado, existem vários mundos separados; cada lojista tem sua própria loja ou local de trabalho;
  2. É um local de intensa atividade, cada indivíduo se esforçando avidamente para lucrar;
  3. Estes lucros são obtidos através de transações comerciais.

Na comparação: nosso mundo é caracterizado pela pluralidade. Cada elemento da existência é uma entidade separada, sem uma conexão clara com os outros2. Entretanto, é neste mundo - em contraste com o Mundo Vindouro 3 - que a alma pode avançar verdadeiramente e lucrar. Portanto, nossas atividades mundanas estão carregadas de entusiasmo e energia4.

As “trocas comerciais que geram lucros” envolvem levar entidades de um domínio a outro, fazendo as entidades materiais, que parecem estar separadas, se unirem ao entrar no controle de D’us, revelando seu núcleo espiritual interior.

Uma Mudança Duradoura

Rav Yossef fala dos “Yossefs no mercado”. O nome Yossef está associado com fazer um aumento5. Rav Yossef estava dizendo que, mesmo antes outorga da Torá, havia “muitos Yossefs no mercado”, isto é, havia líderes espirituais capazes de gerar o lucro que resulta de se colocar o material em contato com o espiritual. Mesmo assim, a entrega da Torá fez uma diferença.

Primeiramente, ela estabeleceu unidade. Antes da entrega da Torá, havia “vários Yossefs”, isto é, os esforços dos diferentes líderes espirituais, apesar de importantes, foram variados; cada um tinha seu impulso próprio. A entrega da Torá, entretanto, gera uma luz maior, uma que provoca uma síntese entre diferentes abordagens. Ela permite um nível de unicidade que é múltiplo e universal.

Além disto, como refletido na palavras de Rashi citadas anteriormente, a Torá gerou o potencial para as entidades mundanas se tornarem “elevadas”. Antes da entrega da Torá, apesar dos líderes espirituais serem capazes de revelar a Divindade dentro do mundo, estas revelações não afetaram a substância material do mundo.

Por exemplo, quando Yaacov colocou as estacas de álamo, amêndoa e de castanha em frente ao rebanho de Lavan6, suas ações evocaram as mesmas energias espirituais que são trazidas para o mundo através da prática da mitsvá do tefillin7. Depois que aquele serviço espiritual foi completado, entretanto, as estacas continuaram sendo peças comuns de madeira; o serviço de Yaacov não deixou nenhum efeito duradouro8. Por outro lado, quando um judeu coloca os tefillin, estes se tornam sagrados; a mitsvá transmite espiritualidade à sua substância física9 e os eleva acima do plano mundano.

Não Uma Mera História

Apesar da mudança radical descrita por Rav Yossef estar associada à entrega da Torá no Sinai, a intenção não é meramente recontar um evento histórico, pois o passado de nossa nação não está separado de seu presente. Neste sentido, no versículo “estes dias são recontados e realizados”10, o Arizal explica11 que quando uma festividade é recontada da maneira apropriada, “ela é realizada” novamente, isto é, as influências espirituais que a distinguiram são sentidas mais uma vez12.

Assim, em cada ano, a celebração da entrega da Torá em Shavuot nos leva a uma conexão mais profunda com D’us e a um plano mais elevado de unicidade. Isto é refletido no nome da leitura da Torá, Parashá Nassô13. Nassô significa “levantar”. Mais particularmente, o significado literal do versículo14 com o qual a Parashá começa é “Levante as cabeças...”15. A cabeça, o local do intelecto, é a parte mais desenvolvida de nosso corpo. E, ainda assim, a entrega da Torá nos torna capazes de “levantar” nossas cabeças a um nível radicalmente maior.

Quando alguém estuda a Torá, isto não é meramente uma questão de homem contemplando D’us com olhos mortais. Em vez disto, o homem está assimilando a sabedoria de D’us para dentro de seus processos de pensamento. E o conhecimento do Divino que alguém ganha desta forma permanece com ele, mudando e elevando sua maneira de pensar16.

Estendendo a Conexão

Entretanto, uma questão pode ser levantada. A ordem para “levantar as cabeças” foi dada como parte da tarefa de contar os Leviim. Os objetos do comando que inicia nossa leitura da Torá são “os descendentes de Guershon”, os Leviim designados para carregarem as cortinas que cobriam o Santuário. Os descendentes de Kehos eram os responsáveis pela arca que continha as Tábuas dos Dez Mandamentos e pela Menorá, que são ambas associadas com a Torá, e a ordem de contá-los foi mencionada na leitura da Torá anterior, Parashá Bamidbar17. Se a intenção da Parashá Nassô é enfatizar o efeito elevador do estudo da Torá, por que a ordem está associada com os descendentes de Guershon?

A resposta é que o estudo da Torá não deve permanecer uma atividade espiritual isolada. Em vez disto, ele deve elevar o nosso serviço da reza (a atividade espiritual associada com os descendentes de Guershon) e cada aspecto de nossa conduta. Ademais, quando alguém tiver elevado seu nível espiritual desta maneira, ele tem a capacidade de elevar o mundo a sua volta, trazendo-o a um nível mais profundo de conexão com D’us.

Isto está refletido na conclusão da leitura da Torá que descreve os estágios finais da inauguração do Santuário. Pois o objetivo do Santuário era difundir santidade pelo mundo, trazendo suas dimensões materiais para mais perto de D’us através das oferendas de sacrifício18.

A aplicação destas lições na nossa própria dedicação ao estudo da Torá e no uso deste estudo para elevar e refinar nossa conduta e nosso ambiente apressarão a vinda da época quando a humanidade e o mundo em geral atingirão seu máximo: “O mundo será preenchido com o conhecimento de D’us como as águas cobrem o leito do oceano”19.