É uma tradição de longa data nas comunidades judaicas em todo o mundo contratar cantores para os serviços das Grandes Festas, muitas vezes acompanhados por coros para engajar, inspirar e entreter as multidões que frequentam a sinagoga. Se a apresentação musical é associada a um rabino que sabe como contar uma boa piada ou trazer lágrimas aos olhos, então o sucesso é ainda maior.
Uma comovente parábola do Baal Shem Tov sobre este fenômeno do “cantor” e “rabino” pode nos fazer refletir.
Certa vez, muito tempo atrás, o leão ficou furioso com todos os outros animais da selva. Como o leão é o “rei da vida animal”, o mais poderoso, sua ira assustou bastante os outros animais.
“O que devemos fazer?” murmuraram os animais numa reunião convocada às pressas. “Se o leão deixar escapar sua fúria, estamos todos mortos.”
“Nada de preocupações,” foram as palavras da raposa, conhecida como o mais esperto dos bichos. “Nos reservatórios do meu cérebro estão estocadas 300 histórias. Quando eu as apresentar ao leão, seu humor será transformado.”
Os animais alegremente iniciaram uma marcha rumo à casa do leão, onde a raposa o acalmaria, restaurando o amigável relacionamento entre o leão e seus súditos.
Durante a jornada, a raposa de repente voltou-se para um dos animais e disse: “Sabe, eu esqueci 100 das minhas histórias divertidas.”
Boatos sobre o lapso de memória da raposa se espalharam imediatamente. Muitos animais ficaram preocupados, mas logo chegou a voz pacificadora do Sr. Urso.
“Não se preocupem,” disse ele. “Duzentas historietas de uma raposa inteligente são mais que suficientes para fazer aquele leão arrogante rolar de rir e se deliciar.”
Pouco tempo depois, a Sra. Raposa voltou-se para outro colega. “Esqueci mais 100 das minhas anedotas,” lamentou-se ela.
O temor dos animais aumentou, mas logo chegou a voz calmante do cervo. “Não se preocupem,” proclamou ele. “Uma centena de histórias da raposa darão conta de captar a imaginação do nosso rei.”
Momentos depois, centenas de milhares de animais estavam na toca do leão. Este se levantou em toda sua glória e lançou um olhar feroz para os súditos, o que lhes provocou tremores.
Com expectativa, todos os animais olharam para sua esperta representante, a raposa, para que esta se aproximasse do leão e cumprisse a grande missão de fazer as pazes.
Naquele exato momento, a raposa voltou-se aos animais e confessou: “Desculpem, mas esqueci minhas últimas 100 histórias. Não tenho mais nada para contar ao rei.”
Os animais entraram em pânico. “Você nos enganou por completo. O que faremos agora?”
“Meu trabalho,” respondeu calmamente a raposa, “foi persuadir vocês a viajar até a morada do leão. Cumpri a minha missão. Vocês estão aqui. Agora, cabe a cada um de vocês usar a própria voz e reabilitar seu relacionamento pessoal com o rei.”
Essa história, concluiu o Baal Shem Tov, ilustra um problema comum n a religião institucionalizada. Vamos à sinagoga em Yom Kipur, ou em qualquer outra época do ano, e confiamos nas “raposas” – os cantores e os rabinos – para serem nossos representantes perante o Rei dos Reis.
Porém, mais cedo ou mais tarde, cada um de nós deve descobrir sua voz única, sua paixão e espírito interiores, e falar com D’us usando aquela voz única.
A função dos cantores e rabinos é persuadir e inspirar as pessoas a deixarem os limites do próprio ego e embarcarem numa jornada na direção de algo muito mais profundo e verdadeiro. Porém cada um de nós deve entrar sozinho no espaço de D’us.
Portanto, neste Yom Kipur, não confie nas raposas. Fale diretamente com D’us. Com suas próprias palavras, com sua própria alma.
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