Caro Rabino Jacobson
Gostaria de informá-lo que compareci a um Seder de Pêssach pela primeira vez em minha vida no ano passado, como resultado de sua palestra no National Arts Club, A Alma do Seder: 15 passos para a Liberdade Pessoal.
Um amigo insistiu para que eu fosse à palestra e francamente, fui resmungando, completamente cético sobre qualquer apresentação religiosa. Mas para seu crédito eu tive, contra a minha inclinação, uma experiência iluminadora e inspiradora, que me motivou a comparecer a um Seder.
Eu nunca tinha imaginado que o Seder tinha uma estrutura tão rica, profunda e espiritual. Portanto agora, ao nos aproximarmos de Pêssach, eu gostaria de desafiar você e outros a ajudar a mim e a outros a ter o melhor da experiência do Seder. Que estado de espírito se deve ter no Seder? Como ligamos os rituais tradicionais – comer matsá, maror e beber os quatro copos de vinho – com sua contrapartida espiritual?
Agradeço por abrir o mundo interior da tradição judaica para mim e tantos outros.
[assinatura]
Resposta:
Nenhum corpo pode funcionar sem uma alma. O corpo do Seder de Pêssach é bem conhecido e documentado. Nós juntamos uma travessa de Seder, passamos por quinze etapas, comemos matsá e maror (ervas amargas), tomamos quatro copos de vinho, recitamos a Hagadá, fazemos e respondemos perguntas. Mas qual é a alma de todas essas atividades?
O objetivo de todo o Seder de Pêssach e do feriado é atingir uma coisa: Transcendência.
“Mitzrayim” (Egito, em hebraico) significa fronteiras, restrições e limitações. O Êxodo de Mitzrayim é liberdade da escravidão aos nossos temores, inibições e vícios. Como podemos usar os rituais do Seder como ferramentas para atingir transcendência pessoal; sentir liberdade emocional e espiritual? Para isso é preciso preparação e pensamento – criar o clima para toda a experiência do Seder.
A Hagadá inteira é estruturada na forma de pergunta e resposta: as crianças começam fazendo as quatro perguntas, e os adultos respondem contando a elas a história em todos os seus detalhes. Na verdade, a palavra Hagadá” significa “relatar”, contar a história.
Perguntas e respostas são uma das mais poderosas ferramentas que temos para explorar e testar, para descobrir a verdadeira natureza das coisas. Muitas vezes a pergunta certa é até mais importante que a resposta.
“A pergunta inteligente” – aprendemos – “é metade da resposta”.
Portanto fazer as perguntas certas é fundamental para acessar a poderosa experiência do Seder e ter realmente uma experiência única nesta noite, que é “diferente de todas as outras noites do ano”. Como baldes que nos permitem extrair combustível precioso profundamente embebido no solo, boas perguntas nos ajudam a mergulhar em nossa psique e nossas tradições, e extrair experiências que transformam a vida.
Nesse espírito, aqui eis uma sugestão de algumas perguntas para fazer a si mesmo antes e durante o Seder para ajudar você a acessar os ricos recursos da noite do Seder.
As quatro perguntas feitas no Seder captam os ingredientes básicos que distinguem a noite de Pêssach de todas as outras noites do ano. Essas quatro perguntas têm um corpo e uma alma.
O corpo das perguntas:
“Por que essa noite é diferente de todas as outras?”
- "Em todas as noites não precisamos molhar (dip) nem uma vez, nessa noite fazemos isso duas vezes.”
- "Em todas as noites comemos chametz (fermento) ou matsá, nessa noite comemos apenas matsá.”
- “Em todas as noites comemos qualquer tipo de vegetais, nessa noite maror (ervas amargas).”
- “Em todas as noites comemos sentados eretos ou reclinados, nessa noite todos nos reclinamos.”
(Essa ordem das perguntas é baseada na ordem do Arizal e com a qual cresci. Há outras ordens igualmente legítimas).
Esses quatro elementos – Mergulhar/Molhar, Matsá, Maror, Reclinar – representam quatro perguntas fundamentais da alma que cada um de nós deve fazer a si mesmo.
Mergulhar é a sublimação de nossas vidas materiais (simbolizado pelo vegetal, o “fruto da terra” para fins espirituais. Como a imersão num micve (um banho ritual), quando submergimos nossos corpos num estado de ser mais elevado.
Matsá é o “alimento” da humildade.
Maror é empatia.
Reclinar é simbólico de conforto e liberdade. Em vez da severidade de sentar ereto, relaxamos.
A alma das quatro perguntas nos compele a fazer as quatro perguntas seguintes:
- Vejo o materialismo como um fim em si mesmo, ou “mergulhado” – como um meio para metas espirituais?
- Eu tenho humildade?
- Tenho empatia e compaixão?
- Estou à vontade comigo mesmo?
Obviamente, cada uma dessas perguntas é apenas um cabeçalho para uma série de questões mais abrangentes que avaliam nossas psiques, e nos ajuda a reconhecer o que nos mantém escravizados e o que precisamos para sentir transcendência.
1 – Molhar – Avaliação do equilíbrio entre as dimensões materiais e espirituais da sua vida.
- Valorizo a importância de “molhar”?
- Quais são minhas metas espirituais?
- Uso meu trabalho ou outras atividades físicas como uma pedra fundamental para objetivos mais altos?
- Como mantenho esse “mergulhar” o ano inteiro? Por exemplo: Doar diariamente para caridade.
- Por que é difícil para mim elevar minhas necessidades corporais e gratificação instantânea?
2 – Matsá – Avaliação de seu ego VS. sua humildade e modéstia.
- Eu entendo a importância da humildade?
- Valorizo aquele que é o elemento mais importante em me libertar de qualquer medo e resistência emocional?
- Existem algumas áreas em minha vida onde me sinto mais humilde? Por quê? E quais áreas precisam de trabalho especial para domar o meu ego?
- Qual é a raiz da minha arrogância? É devida às minhas forças ou às minhas fraquezas?
- A minha arrogância é como uma cortina de fumaça para a minha insegurança?
3 – Maror – Avaliação de seu nível de empatia e compaixão
- O quanto sou empático com os outros e comigo mesmo?
- Minha compaixão vem com “cordões”, i.e., meu próprio ganho pessoal?
- Quando foi a última vez que partilhei lágrimas pelo sofrimento de outro?
- Eu entendo que a empatia se iguala à sensibilidade – a própria essência de estar vivo? Que quando não tenho compaixão por estranhos, isso também impacta a bondade que mostro para mim mesmo e aos entes próximos?
4 – Reclinar – Avaliação de sua autoestima.
- Por que não estou sempre à vontade na minha própria pele?
- Há tempos e situações quando atinjo uma calma profunda? Quando estou seguro comigo mesmo?
- Caso seja sim, entendo o que traz aquele nível de tranquilidade? E posso acessá-lo quando quiser?
- Meus amigos estão aumentando minha tensão ou minha paz de espírito? Eu me coloco em situações que alimentam minha insegurança?
- Posso nessa noite me encostar e reclinar, sabendo que coloco minha confiança em D'us?
As perguntas continuam. Essas são apenas uma amostra de perguntas – um catalisador – que cada um de nós usa para aumentar nossa experiência do Seder. Permita-se perguntar a nós mesmos quão poucas ou muitas questões que ajudam você a personificar o Seder de Pêssach.
Lembre-se, mesmo se você não pode responder a todas essas perguntas ou respondê-las satisfatoriamente, o simples fato de se permitir entrar na arena da sua alma e suas emoções já é o primeiro passo da liberdade. Lembre-se também que toda experiência é apenas tão poderosa quanto sua preparação para ela. Por este motivo começamos as preparações formais para Pêssach (e todas as festas) trinta dias antes. Começamos a estudar suas leis, e acima de tudo – a nos preparar espiritualmente para a experiência especial que nos espera.
Portanto, pode ser inteligente se preparar para o Seder com o seguinte exercício:
Antes de Pêssach começar pegue um pedaço de papel e anote:
- Três inibições (chametz; mitzrayim) que você gostaria de se livrar. Assegure que são três impedimentos ou temores, não pessoas ou situações fora de si mesmo (como um parente intolerável ou um chefe infernal).
- Quatro aspirações e sonhos que gostaria de realizar. Quatro áreas (como os quatro copos de vinho) nos quais gostaria de celebrar a liberdade. Não focar muito nos meios (como ganhar muito dinheiro), mas nos fins.
- Três áreas nas quais você é egoísta, e três (como as três matsot) nas quais tem uma dose especial de humildade.
À medida que desfruta o Seder, bebendo os copos de vinho e comendo matsot e maror, pense sobre essas listas.
Que sejamos todos abençoados com um Pêssach significativo e transcendente – que nos permita “passar sobre” nossos temores e limites (percebidos ou reais) e sentir a verdadeira, doce e duradoura liberdade.
Devemos sempre saber que o supremo segredo para a verdadeira emancipação está na nossa sublimação, humildade, empatia e auto-respeito – todos possíveis quando reconhecemos que não somos criaturas auto construídas, mas parte de uma realidade mais elevada, como é declarado eloquentemente no primeiro – a fundação – dos Dez Mandamentos: “Eu sou o teu D'us que te libertou da escravidão do Egito.”
Um Pêssach feliz para você e a todos os seus!
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