Saciando a Sede
Uma característica da condição humana é um desejo por crescimento1. Esta é uma qualidade positiva, uma expressão da natureza da alma do homem. Pois a alma do homem é “uma parte real de D’us”2. Como tal, nenhum substituto para o genuíno significado parecerá verdadeiro. Além disso, mesmo quando uma pessoa alcança um entendimento de autêntica verdade, ela tentará expandir constantemente sua consciência. Pois D’us é ilimitado e o potencial Divino dentro de nós reflete esta imensidão, nunca se contentando com qualquer situação, mas se empenhando, em vez disso, em proceder de força em força”3.
Apesar desse desejo pelo crescimento ser universal, sua expressão varia de indivíduo a indivíduo. Apesar de todos nós querermos continuar a avançar, muitos não sabem como fazê-lo e esta falta de conhecimento previne o crescimento pessoal desde o início.
Como um indivíduo encontra o caminho infindável do crescimento? Respostas a esta questão podem ser derivadas de nossa leitura da Torá que começa com a frase, geralmente traduzida como “Se tu seguires Meus estatutos” e aqui “seguir”, também significa “progredir” e é usado em várias fontes como uma alusão ao crescimento pessoal4. “Meus estatutos”, se refere a uma categoria particular de mitsvot, referida como chukim, decretos, nem sempre compreensíveis pela mente humana. O que está implícito é que o crescimento pessoal depende da interiorização das lições de chukim.
Talhado em Nossos Corações
O contraste da diferença entre escrever e talhar nos permite apreciar o significado interior de chukim e a influência que elas têm sobre nós5. Primeiramente, diferente de escrever, talhar envolve um trabalho árduo. Escrever também é considerado uma das 39 categorias de trabalho6, mas a quantidade de esforço necessária para escrever não pode ser comparada àquela necessária para talhar 7.
Neste contexto, Rashi interpreta: “Se tu trabalhares no estudo da Torá”, isto é, se você fizer mais do que simplesmente estudar e arduamente se dedicar à Torá. Quando uma pessoa se dedica dessa maneira, as palavras da Torá se tornarão “talhadas” em seu coração. Mesmo se seu coração for rígido como pedra, a pressão suave e inexorável aplicada pela “água” da Torá penetrará nele8.
Esta é a primeira chave para o crescimento pessoal. Não existe algo como espiritualidade sem sacrifício. Um campo não produzirá colheitas a menos que alguém lavre e semeie a terra. Para fazer o potencial Divino que cada um de nós possui crescer e florescer, um investimento no trabalho árduo deve ser feito.
Sem Uma Divisão
Existe uma outra diferença entre escrever e talhar. A superfície sobre a qual escrevemos e a tinta que usamos permanecem duas entidades separadas. Quando, ao contrário, as letras são talhadas na pedra, a escrita e a pedra formam uma entidade única; elas são inseparáveis9.
Isto aponta para a importância da interiorização da Torá, tornando seus ensinamentos parte de nosso próprio ser. Existe uma vantagem em compelirmos a nós mesmos à prática da Torá, mesmo quando fazer isto for contra a nossa própria natureza10. Mas, o mais profundo comprometimento ao serviço de D’us envolve refazer nossa natureza para refletir Sua vontade11.
Essa é a segunda lição das chukim, a de que a pessoa e a Torá não devem ser entidades separadas12, mas um único todo13.
Essa abordagem leva ao verdadeiro crescimento, pois progredimos além das imagens limitadas de nossa própria percepção e entramos nos horizontes ilimitados aos quais a Torá nos introduz.
Acima dos Limites do Intelecto
O acima escrito leva a uma terceira interpretação de chukim: que o termo se refere às dimensões da Torá que ultrapassam nossa compreensão. Trabalhar no estudo da Torá nos traz à conscientização de que todas as suas facetas, mesmo aquelas que parecem estar ao alcance do intelecto mortal, são, de fato, ilimitadas. Pois a Torá é a sabedoria de D’us e “assim como é impossível para uma criatura compreender seu Criador, também é impossível compreender Seus atributos”14. “Ele é o Conhecedor... e Ele é o próprio Conhecimento. Tudo é Um”15.
Além disso, tal comprometimento de estudo faz mais do que produzir uma consciência da dimensão infinita da sabedoria da Torá; como mencionado acima, isto faz com que esta dimensão seja internalizada. No processo, a nossa forma de pensar muda, e a infinita dimensão da Torá se torna única com nosso próprio ser.
Fundindo Tendências Conflitantes
A Parashá Bechukotai é geralmente lida em conjunto com a Parashá Behar. Superficialmente, as duas leituras representam abordagens opostas, pois Behar comunica a mensagem de força e coragem pessoais, enquanto Bechukotai se concentra no tema da autotranscendência. Apesar disso, enquanto uma pessoa se esforça para aplicar as lições de cada leitura em sua vida, ela percebe que elas são complementares.
Quando a força de Behar tem a obrigação da autotranscendência de Bechukotai, nós descobrimos reservas mais profundas e poderosas de força do que as que normalmente possuímos16.
Inversamente, a auto-transcendência de Bechukotai só é possível quando uma pessoa possui a força interior do propósito necessário para fazer os esforços necessários.
Conhecer a Bondade de D’us
A maior parte desta leitura da Torá se concentra nas recompensas concedidas pela observância da Torá e as punições impostas pela falta desta. Poderíamos perguntar: Quando uma pessoa tiver internalizado a auto-transcendência de Bechukotai, para que interessam as recompensas? Como diria o Alter Rebe 17: “Eu não quero Teu Mundo Vindouro. Eu não quero Teu Gan Eden [Jardim do Éden]. Tudo que eu quero é a Ti somente”.
Na verdade, entretanto, somente alguém que genuinamente “quer a Ti somente” pode apreciar a medida completa da recompensa que D’us associou com a Torá e suas mitsvot. Enquanto uma pessoa estiver preocupada com suas próprias vontades e desejos individuais, ela interpretará a recompensa recebida pela observância sob aquela luz. Quando, ao contrário, a pessoa tiver transcendido sua vontade pessoal, em vez destas insignificantes preocupações materiais, ela apreciará a bondade e a gentileza transmitidas por D’us18.
Isto criará um padrão autorreforçador, pois o propósito das recompensas concedidas pela Torá é permitir que um indivíduo avance em seu estudo e observância19.
Enquanto este padrão se espalha pela humanidade, nós mereceremos a medida completa de bênçãos mencionadas na leitura da Torá com o retorno de nosso povo à nossa terra, liderado pelo Mashiach. Então, “Tua época de debulho durará até a colheita da uva... Tu comerás teu pão com satisfação... Eu te concederei paz na terra e ninguém te fará ter medo”20.
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