É uma tradição antiga que após a destruição do Primeiro Templo Sagrado alguns dos exilados migraram para a Espanha e ali estabeleceram uma comunidade judaica.
Após a destruição do Segundo Templo e a dispersão de muitos judeus pelos países da Europa, a comunidade espanhola foi muito aumentada pelos novos exilados. Muitas coletividades foram fundadas, floresceram e se tornaram grandes em Torá, em sabedoria, em riqueza e prestígio, a ponto da Espanha se tornar o principal centro de judaísmo na Diáspora.
Durou por um período de cerca de 1.400 anos e chegou a seu fim em 5252 (1492), quando a família real espanhola deu à comunidade judaica a escolha entre a conversão, a morte ou o exílio.
O Começo da Calamidade
Embora a comunidade espanhola fosse a mais afortunada das comunidades judaicas no exílio durante um extenso período e os dias da sua boa fortuna chegassem a ser denominados "A Idade de Ouro" do judaísmo espanhol, não obstante, a maior parte da história judaica espanhola foi marcada por perseguições e sofrimento. Assim é o destino de Israel no exílio: seus dias de sofrimento são menos recordados por eles. Seus dias de bem-estar, mesmo que sejam poucos, deixam forte impressão.
Durante o primeiro período de sua estadia na Espanha, os judeus viveram em paz e com prosperidade. Depois que os governantes da Espanha abraçaram a fé cristã, a ira do clero se voltou contra os judeus. No início, os judeus permaneceram fiéis a sua própria fé, e a recusa em abraçar a fé dominante era vista como afronta intolerável. O espírito de ódio que se levantou contra eles não conhecia limites.
Conversão Forçada e Aniquilamento
Em 5151(1391), 101 anos antes da Expulsão, uma onda de conversões forçadas e pogroms varreu centenas de comunidades na Espanha. As medonhas calamidades quebraram seu espírito, pois nunca estiveram acostumados à vida de aflição e supressão, como estavam seus irmãos da França e da Alemanha. O número de conversos cresceu e entre eles havia também uma quantidade de homens de grande preeminência, líderes comunitários, a quem faltaram forças suficientes para santificar o nome de D'us. Sentiam-se incapazes de desistir da riqueza e prestígio a que estavam acostumados.
Um grande segmento dos convertidos, que excedeu duzentas mil almas, manteve contatos secretos com seus irmãos judeus e continuou a praticar o judaísmo em segredo.
Os Tombados e os Heróis
Com a exceção dos pogroms de turbas, quando às vítimas era oferecida a alternativa de conversão ou morte, a política oficial do governo dava a alternativa de conversão ou expulsão. Por isso é estranho que tantas dezenas de milhares de judeus tenham aceito a conversão, uma vez que não eram diretamente ameaçados pela espada. Por contraste, no caso de comunidades judaicas em outros países, conversões eram encontradas só muito raramente e a grande massa dos judeus escolheu a morte para santificar do nome de D'us.
O que enfraqueceu o judaísmo espanhol, a ponto de tornar tantos de seus filhos incapazes de resistir à prova? Os sábios daquela geração revelaram a causa da fraqueza. Por um lado, estavam acostumados a uma vida de luxo sem comparação com a de outras comunidades da Diáspora, cuja força de vontade fora forjada pelas duras provas de privação e perseguição. O judaísmo espanhol estava também enfraquecido pela preocupação com a filosofia racionalista. O esposar do racionalismo atenuou a profundidade de sua crença e o tornou mais suscetível de sofrer perseguições por causa de sua fé.
Não obstante, a santidade judaica não cessou mesmo entre aqueles que tropeçaram. Com a passagem do tempo, muitos deles retornaram ao seio de sua fé; no princípio secretamente, e subseqüentemente com a santificação pública do nome de D'us, até a morte.
Os Marranos
Aproximadamente 100 anos antes da Expulsão, a comunidade judaica espanhola estava dividida em dois segmentos principais: aqueles que permaneceram leais ao judaísmo apesar de todas as perseguições, e uns duzentos e cinquenta mil cristãos-novos que abraçaram a fé dominante, pelo menos publicamente, e que pertenciam de modo geral à classe abastada. Mesmo estes viviam uma vida de isolamento e temor.
Isolaram-se de seus irmãos que permaneceram judeus. Tinham igualmente medo de manter contato uns com os outros, com receio de suspeição de conservarem ligações com seu passado. Tampouco foram absorvidos pela população, que continuava a odiá-los e a espioná-los dia e noite, a fim de entregá-los para julgamento pelo deslize de serem relapsos com a sua nova fé.
Esses judeus eram chamados de "marranos" pelos cristãos velhos. A palavra "marrano" significa "porco". Eram vistos como se estivessem engordando do trabalho dos outros e de quem não se podia beneficiar a não ser por sua morte, quando sua carne podia ser ingerida.
Os que permaneceram judeus publicamente eram ameaçados somente de expulsão, ao passo que os marranos encaravam a penalidade de serem queimados vivos pelo pecado de deslealdade. Os marranos eram constantemente espionados. Às vezes as acusações eram procedentes, mas em outras seus inimigos forjavam mentiras, a fim de se apossarem de seus bens.
A Inquisição
Dezoito anos antes da Expulsão, Torquemada, o mais brutal entre os sacerdotes católicos, instalou a Inquisição: um tribunal para impor penalidades sobre os desleais. Ostensivamente, as atividades da Inquisição diziam respeito a todos os cristãos, mas na realidade a "heresia" dos marranos era a principal preocupação da Inquisição.
Torquemada conquistou o coração da rainha Isabel que se desviou de todas as outras preocupações e ficou apaixonadamente absorvida em avançar o trabalho da Inquisição, erradicar a "heresia" e procurar a expulsão dos judeus que permaneceram leais em público a sua fé. Esperava, desta forma, obter o perdão de todos seus pecados.
Mais de trinta mil marranos foram condenados à morte e queimados vivos pela Inquisição. Outras dezenas de milhares foram submetidos à tortura física mais horrível que a morte. A maioria santificou o nome de D'us ao morrer, após ter antes falhado em resistir à pressão para a conversão pública. As repetidas confissões dos torturados, que haviam permanecido leais à Torá e ao judaísmo, enfureceram os inquisidores e seus agentes, e fizeram com que perseguissem os marranos ainda mais ferrenhamente.
Essas repetidas confissões também deram aos inquisidores maiores argumentos em seus esforços para convencer o rei Fernando a emitir um decreto de expulsão contra todos os judeus remanescentes. Pois, "enquanto os judeus continuassem a viver na Espanha, influenciariam seus irmãos a aderir à fé de seus pais".
O Edito de Expulsão
Na introdução a seu comentário ao Livro dos Reis, Don Yitschac Abarbanel, descendente da Casa Real de David e líder da comunidade judaica, descreve o edito de expulsão proclamado pelo rei Fernando no primeiro dia de Adar 5252 (fevereiro de 1492):
"Em 1492, o rei da Espanha capturou o reino de Granada junto com sua cidade-capital. Um sentimento de poder e arrogância fê-lo pensar: 'Como posso ser aceitável perante o Altíssimo que me armou com força para a guerra? Como posso agradecer a meu Criador que me entregou esta cidade, se não trazendo sob Suas asas os povo que caminha nas trevas, o rebanho disperso de Israel?'
Abarbanel continua: "Quando eu estava presente no palácio real, gritei até ficar rouco - falei com o rei três vezes - supliquei diante dele, dizendo: 'Salve ó rei! Por que farás isso aos teus servos? Multiplica penalidade de dinheiro contra nós a vontade, e cada um dos judeus dará tudo o que tem em prol de seu país.' Procurei meus amigos que vinham à presença do rei, para implorar por meu povo. Príncipes se reuniram e insistiram fervorosamente com o rei para revogar o escrito de ira, para desistir de seu plano de destruir os judeus. Mas ele selou os ouvidos como se fosse surdo e recusou terminantemente reconsiderar. A rainha estava a seu lado direito, para incitá-lo ainda mais... para agir com determinação definitiva. Lutamos, mas nenhuma prorrogação nos foi dada. Não descansei, não desisti, mas fui incapaz de desviar a condenação.
"O povo ouviu as más notícias e se entristeceu. Onde quer que chegasse a palavra do rei e sua ordem, houve grande luto entre os judeus. Havia terrível medo e angústia como nunca foram conhecidos desde o exílio de Yehudá para solo estrangeiro. Resolvemos: 'Sejamos fortes em nome de nossa fé, da Torá, de nosso D'us, na presença dos que blasfemam e dos que nos odeiam. Se nos deixarem viver, viveremos, e se nos assassinarem, morramos, mas não profanemos nosso pacto e não permitamos a nosso coração recuar. Iremos em nome de D'us.'
"Eles foram sem força - 300.000 a pé - os jovens e os idosos, pequeninos e mulheres, num dia - de todas as províncias do rei, para onde os levasse o vento."
Don Yitschac Abarbanel também escreve em seu comentário sobre Yirmiyáhu: "Quando o rei da Espanha decretou a expulsão dos judeus, a data foi marcada para o fim de três meses a partir do dia em que foi proclamado. Esse dia foi 9 de Av. Mas o rei não conhecia o caráter desse dia quando emitiu o decreto. Foi como se tivesse sido guiado de Cima para fixar esse prazo."
Após a Proclamação do Edito
Muitos judeus foram assassinados e roubados pelos vizinhos ainda antes de chegar a hora da partida, pois o sangue judeu era indefeso. Muitos fugiram da Espanha e se dispersaram pelas estradas indo para além das fronteiras da Espanha mesmo antes do prazo marcado. Mas toda sorte de calamidades os assolou na estrada, como se a mão de D'us Se tivesse erguido contra eles, a fim de destrui-los.
Música, Canto e Louvores
Os exilados saíram para a estrada no decorrer do período das Três Semanas, entre 17 de Tamuz e 9 de Av. Grupos de vários tamanhos precederam a grande partida no dia 9 de Av.
Embora esses dias sejam de luto e pranto pela destruição dos Santuários e da Terra de Israel, e a música proibida, os sábios daquela geração deram permissão para os exilados marcharem ao som de músicos, a fim de fortalecer o espírito do povo e infundir nele esperança e fé em D'us. Davam graças a D'us por terem resistido à prova, não se submetendo à conversão e por conseguirem atingir o mérito de santificar o nome de D'us com sua partida da Espanha.
Era também a intenção dos Rabis, ao permitir o toque de instrumentos, ensinar o povo que nunca derramamos lágrimas pela partida ao exílio; choramos somente pela partida de Jerusalém.
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