Novos ataques em Jerusalém. Irã nuclear. Oriente Médio em fogo. A Europa se transformando num continente muçulmano. O futuro da América: desconhecido. China subindo. O fim do capitalismo? Um embate de civilizações (Islã e o Ocidente) crescendo. Uma dissonância entre tecnologia acelerada e comunicações em um lado, e relacionamentos pessoais e intimidade diminuindo no outro. Este é o clima de nossos tempos.

Como o mundo irá mudar à medida que a nova mídia substitui a velha mídia? À medida que a tecnologia se infiltra em todos os aspectos da nossa vida? A Inteligência Artificial vai suplantar nossas mentes? Como isso vai impactar nossos sonhos e imaginação? Uma máquina vai substituir uma mãe? E o que faremos com todo o tempo extra?

Podemos todos ter um intervalo entre esses debates. Mas não apenas um intervalo.

Que tal subir a montanha para ver o horizonte através da visão dos pássaros? Como seria incrível poder transcender os eventos no chão e ganhar uma perspectiva de vida 10.000 metros mais alta?

Um benefício adicional de ver o quadro geral é que isso transforma você em um líder, e não um seguidor. Num modelador, em vez de uma vítima das circunstâncias. Proativo, em vez de reativo. No lugar do novo mundo nos moldando, nós podemos moldá-lo.

Este é um dos grandes benefícios em “viver com os tempos” – estudar e entender a porção semanal da Torá que lemos durante esse tempo. Se você quer ser informado sobre eventos no nível do chão, abra um jornal ou outra mídia. E… agonize. Mas se você deseja descobrir o significado mais profundo desses eventos, e ter à frente um plano de pensamento, leia a parashá.

Vamos ler juntos

Assista a um lindo pôr do sol. Ouça uma sinfonia comovente. Aspire uma delicada fragrância. Prove um vinho delicioso. Toque o rostinho macio de uma criança. São nossos cinco sentidos em uso – aceitando e sentindo a estética do nosso universo.

Mas o que mais passa através das nossas portas sensoriais? Como somos estimulados pela multidão de visões, sons, cheiros, sabores e toques inundando nossas interações diárias? E que impacto isso causa sobre nós? Somos produtos, talvez até vitimas, das forças seduzindo nossos sentidos? Alguém sabe os efeitos a longo prazo que o estímulo visual tem sobre a nossa psique? Quanto está nos desensibilizando para “ver”, “ouvir” e sentir os aspectos mais sublimes da nossa vida – o invisível e etéreo?

Quando observamos o mundo à nossa volta, as pessoas, eventos e experiências de nossa vida, o que deveríamos estar procurando? Quando estamos diante da pessoa que amamos – como asseguramos que estamos olhando para as coisas importantes, e não para detalhes superficiais? E como chegamos a tal perspectiva quando somos levados pelo fluxo interminável de informações que atacam nossos sentidos, enfraquecendo e distorcendo nossas prioridades?

A porção dessa semana da Torá contém uma resposta fascinante a essas perguntas. O capítulo começa com as palavras “E D'us apareceu a Avraham”. O que Avraham viu? O que significa “ver” o Divino?

Quando olhamos para qualquer objeto, o que vemos? Primeiro vemos os aspectos físicos do objeto – sua forma, cor, tamanho e posição. Podemos também notar suas funções e os benefícios. Com maior foco, podemos discernir elementos sutis e outros aspectos que podem não ter sido ostensivamente perceptíveis. Com um estudo mais detalhado desenvolvemos um “olhar mais profundo” ao objeto e aprendemos sua composição única de elementos e moléculas, e sua formação biológica e química. Além disso descobrimos sua estrutura atômica, que por sua vez é formada de partículas sub-atômicas. Até que ponto podemos ir?

Baseados nos nossos recursos mortais podemos ir apenas até aí. Mas com ajuda de um local inesperado podemos chegar a perceber – a ver – a essência do objeto, e até além disso.

Quando o Rebe Kotzker era criança certa vez lhe perguntaram: “Onde está D'us?” Ele respondeu: “Onde quer que você O deixe entrar?”

Ver o Divino é ver a Essência de toda realidade, e reconhecer que essa Essência está além de toda realidade. “Ele é o espaço do universo, mas o universo não é Seu espaço.” Em algumas maneiras parece ver a floresta pelas árvores; as raízes pelos sintomas; as causas pelos efeitos.

Avraham fez duas coisas criticas para chegar ao ponto em que foi capaz de ver o Divino, até o ponto em que “D'us apareceu a ele.” Primeiro, deixou suas zonas de conforto e embarcou numa jornada pela vida inteira para longe de suas inclinações subjetivas rumo à transcendência.

Em segundo lugar, Avraham dedicou sua vida – e transmitiu seu legado aos seus filhos e às gerações vindouras – para focar não nos meios, mas no fim: olhar além das distrações sedutoras da vida superficial e ver o que está por dentro: buscar a essência das coisas em vez de reagir aos seus sintomas. Buscar o propósito da existência e transformar aquele propósito na força impulsora de nossas decisões, em vez de permitir que nossas necessidades e preocupações existenciais determinem o rumo de nossas vidas. Apesar das convenções do tempo, não se conformando com as pressões ao redor, não atraído pelas visões e sons do universo, Avraham procurou além e dentro delas uma presença mais elevada. Essa percepção mais elevada então se traduz em ação – levar uma vida de virtude, correção e justiça.

Depois que Avraham demonstrou seu comprometimento, “pagou o preço” e fez sua parte penetrando através das camadas superficiais e olhando lá dentro em busca de uma realidade mais profunda, então “D'us apareceu a ele,” revelando as forças essenciais que moldam toda a existência, muito além daquelas que nosso primeiro patriarca poderia sequer descobrir por si mesmo.

O notável sábio do Século 13, Ramban (Rabi Moshe ben Nachman), também conhecido como Nachmanides, declara um axioma critico – algo que iria mudar a paisagem da educação judaica sendo enfatizada em nossas escolas:

“Conheça esse princípio fundamental: todas as jornadas e eventos que aconteceram com os Patriarcas [Avraham, Yitschac e Yaacov] vieram para nos ensinar sobre o futuro… eles viram o que iria acontecer com os seus descendentes. Por este motivo os documentos da Torá detalham as experiências que transpiraram com os Patriarcas.

Ninguém poderia pensar que esses são detalhes superficiais: eles na verdade pavimentam o caminho e mapeiam todo os futuros eventos que iriam ocorrer com seus filhos no decorrer da história. Não há nada que tenha acontecido a Avraham que não fosse ocorrer mais tarde com seus filhos (Ramban, Lech Lecha, 12:6).

Como aplicamos este princípio à abertura da porção dessa semana da Torá: “E D'us apareceu a ele,” a Avraham?

Na verdade, uma conhecida história sugere que a Divina revelação a ele foi única, somente para ele. Quando o Rebe Rashab era menino, foi até o seu avô, o Tsemach Tsedek, para receber uma bênção em conexão com seu aniversário (20 de Cheshvan).

Quando entrou na sala do avô, começou a chorar. Seu avô perguntou por que ele estava chorando, e ele explicou que na cheder (escola), tinha aprendido que D'us tinha Se revelado a Abraham e ele ficou aborrecido, por que D'us não se revelou a ele? O Tzamach Tzedek respondeu: “Quando um justo judeu aos 99 anos de idade decide se circuncidar, ele merece que D'us Se revele a ele.” O Rebe Rashab ficou satisfeito com essa resposta, e parou de chorar.

E mesmo assim, o Rebe Rashab chorava, e segundo Nachmanides, não há nada que aconteceu a Avraham que não ocorreria mais tarde com seus filhos. A revelação Divina a Avraham de alguma forma pode e irá acontecer com seus filhos. Avraham pavimentou o caminho para nós termos uma experiência similar: Ver as forças interiores que moldam nossas realidades externas.

Mas para ver sua vida nessa maneira especial, você também tem de se comprometer com as mesmas duas coisas com que Avraham se comprometeu.

Uma, você deve viajar para longe das suas armadilhas subjetivas e remover as pressões imediatas que bloqueiam você de ver o que está por dentro. Isso inclui controlar o fluxo de imagens, sons, sabores, toques e odores, que entram no seu ser e atravancam sua vida.

Dois, você precisa concentrar-se nas forças interiores e o objetivo disso tudo, assegurando que o meio que levou você ali não seja confundido com a meta final. Com frequência ficamos tão consumidos com as ferramentas – ganhar o sustento, comprar, preparar – que não nos resta tempo, energia e espaço para o objetivo de todas essas ferramentas. Às vezes podemos até esquecer que há um propósito, como embarcar numa jornada e então esquecer o destino.

Este compromisso com uma meta mais elevada, em oposição aos meios, por sua vez se manifesta numa vida pautada por virtude e altruísmo, e não por gratificação passageira e necessidades imediatas.

Depois que você demonstra seu compromisso com essa abordagem, novas portas vão se abrir lá de dentro. E então – somente então – você começará a ver o extraordinário no ordinário. Todo detalhe de sua vida começa a irromper com enorme energia. Você aprende a saborear cada visão, cada som, cada sabor, cada toque, cada odor.

Você pode olhar para uma flor selvagem e ver uma flor, ou pode ver, como disse Blake, o Céu. Pode escutar uma ave cantar e ouvir uma canção, ou ouvir a música de anjos. Pode gentilmente tocar um dedo, ou pode tocar a eternidade. Uma nova perspectiva emerge em sua vida, ensinando como ligar o invisível ao visível, o sensorial e o supra-sensorial – como usar seus sentidos para atingir além dos seus sentidos e viver novas dimensões. E acima de tudo, sua nova visão permite que você libere nova energia em toda experiência que tiver: numa vida motivada pelo auto-interesse toda situação é amortecida e enfraquecida por “o que há para mim nisso?”

Em flagrante contraste, uma vida motivada em ver o Divino abre seus olhos, ouvidos, paladar, tato e olfato para sentir a si mesmo e aos outros em maneiras sem precedentes. Você aprende a ver novas coisas, e vê velhas coisas de formas novas. Toda situação então torna-se uma oportunidade para gerar poder inovador rumo ao sublime, revelando o propósito Divino que há em tudo, cumprindo o próprio objetivo da existência.