Um menino em idade de bar mitsvá, preparando seu discurso, perguntou à mãe sobre seus antepassados. A mãe falou sobre sua origem ilustre, remontando até o tempo de Avraham, Yitschac e Yaacov.

“E de onde eles vieram?”

“De Adam e Eva.”

“E eles?”

“D'us os criou.”

O menino anotou aquilo e então foi até o pai. “De onde você vem?” pergunta o garoto.

“Ah, viemos dos macacos. Após milhões de anos de evolução, evoluímos até nos tornar seres humanos.”

O menino, confuso, volta correndo até a mãe. “Mãe, você disse que viemos de Adam, Eva e D'us. Papai diz que viemos dos macacos…”

“Não há contradição aqui, filho,” disse ela. “Eu estava falando sobre o meu lado da família. Ele estava falando sobre o lado dele.”

O Casal da Piada

A porção dessa semana da Torá, Toledot, registra um episódio no qual Yitschac, viajando com sua mulher pela terra dos filisteus, diz aos moradores que eles são irmão e irmã. Ele está temeroso de que se souberem que ele era marido dela, o matassem e pegassem sua linda esposa. O truque funciona até que o rei dos filisteus, Abimelech, decide espreitar no alojamento deles.

“Abimelech olhou pela janela,” diz a Torá, “e veja só! Yitschac estava gracejando com sua esposa Rivca.”

Abimelech mandou chamar Yitschac e disse: “Ela é sua esposa! Como pôde dizer ‘Ela é minha irmã’?”

Ora, presume-se que não é incomum fazer gracejos com a própria irmã. Portanto, como o fato de Yitschac estar fazendo piadas com Rivca demonstra que eles eram marido e mulher, e não irmãos?

Obviamente então, o termo “gracejando” ou “fazendo piada” empregado aqui na Torá é um eufemismo para relações íntimas, uma atividade que não se espera ocorrer entre irmãos, somente entre cônjuges.

Isso merece nossa investigação. Por que, apesar dos muitos outros termos mais claros geralmente empregados para descrever a intimidade, aqui a Torá escolhe definir o relacionamento entre Yitschac e Rivca em termos de risada e brincadeira?

A verdade é que esse termo estranho capta o “ingrediente secreto” que alimentava o relacionamento entre Yitschac e Rivca, que poderia facilmente ter se desgastado. Qual componente deu a este casamento – e pode dar a cada um dos nossos casamentos – seu vigor? O riso.

Risada e Bois

Em 1809, no Shabat anterior ao casamento de um neto, o grande mestre, Rabi Shneur Zalman de Liadi (1745-1812), fundador da Escola de Chassidismo Chabad, apresentou as respostas às questões acima. Temos a seguir trechos do discurso, expressos em minhas próprias palavras.

O nome Yitschac em seu original hebraico significa “risada”. Na verdade, Yitschac recebeu este nome porque seu nascimento trouxe risos e alegria à sua mãe, Sarah, que há muito tempo era estéril.

Rivca, no hebraico original, é o nome usado para descrever uma “equipe de bois para arar”. Quando animais são atados e juntados para fazer um trabalho produtivo, esta junção de animais é chamada uma “rivkah”.

Como os nomes Rivca e Yitschac se encontram? Qual é a conexão entre risada e animais ajuntados?

Você Sabe Como Rir?

Qual é o motivo da risada? O que mais faz as pessoas rirem? O que nos provoca uma boa risada?

A resposta é: a realidade desafiando a si mesma; a fusão de paradoxos. O que faz a melhor piada? Um final imprevisível. A narrativa da piada está indo em uma direção, e então de repente o final pega você de surpresa, e você explode em risos. Este é também o recurso usado por todo comediante em seus roteiros de comédia.

O que define o senso de humor? A capacidade de olhar para eventos convencionais de maneiras não-convencionais.

O imprevisível, o não-familiar, o anormal – estes fenômenos tocam a corda do riso em nossa psique. Quando você observa uma criança se comportando como adulto, você ri. Quando vê um adulto se comportando como criança, também ri. Espera-se que crianças se comportem como crianças e adultos como adultos; quando eles trocam os papéis, surge o riso.

Quando você escuta uma pessoa falando, nem sequer esboça um sorriso. Quando ouve um papagaio se comunicando verbalmente – uma função que não está reservada às aves – você se maravilha incrédulo. De modo contrário, quando você observa um pássaro sobre um fio alto, não se incomoda de olhar novamente; porém, quando vê um ser humano caminhando sobre uma corda bamba, você arregala os olhos, maravilhado.

Imagine se o sol se erguesse apenas a cada 70 anos? Ficaríamos em êxtase com essa tremenda visão. Ora, como o sol nasce toda manhã, preferimos dormir durante o nascer do sol.

A Maior das Piadas

Qual é a maior “piada” de todas? Qual é o fenômeno mais surpreendente e inesperado do mundo?
A transcendência humana.

Uma pessoa é naturalmente animalesca e auto-centrada. Toda ação, pensamento, palavra e desejo do homem é motivado pela busca da auto-preservação e auto-gratificação. O egoísmo, a mania de grandeza e o egoísmo são inerentes à nossa natureza. Ora, quando ser humano animalesco diz “não” à própria natureza em prol de uma verdade mais elevada. a pessoa criou a maior comédia de todos os tempos!

Quando um anjo é espiritual e sagrado, isso é algo natural e previsível; uma história do tipo cachorro-morde-um-homem. Porém quando um ser humano – dominado pelo materialismo infindável e estresse psicológico e arrastado pelas exigências incessantes de um animal interior – subjuga sua natureza, transcende suas inclinações e proclama: “D'us é um,” esta é uma verdadeira história de homem-morde-cachorro, uma surpresa total que dá ao Criador e à história o mais profundo dos deleites.

O Propósito da Criação

Por que um D'us perfeito criou um mundo imperfeito? Por que um D'us perfeito criou um mundo, afinal? A resposta é apresentada por Rabi Shneur Zalman de Liadi: D'us queria rir.

A perfeição e a santidade de D'us são previsíveis, estáticas, fixas e naturais. É a santidade, a nobreza e o idealismo que emergem de um coração humano que faz D'us e nós “costurados” no decorrer do espetáculo que chamamos de história. O propósito da criação não era pessoas sagradas fazendo coisas sagradas. Era, em vez disso, pessoas não sagradas fazendo coisas sagradas. Fomos criados a fim de gerar o milagre da transformação: pegar nossa natureza material egoísta e sublimá-la.

Se você está se sentindo como um animal egoísta, não fique deprimido pelo fato de não ser sagrado. Nesse mesmo instante, se você subjugar sua fera e realizar um ato sagrado, dará a D'us Sua maior risada.

É por isso que a primeira criança a nascer judia foi chamada de Yitschac, que significa “ele vai rir”. Pois esta é a essência do Judaísmo: a crença de que o ser humano pode e precisa ser sagrado. E esta é a maior piada que já se contou.

É por isso também que o nome Yitschac significa “Ele vai rir”, no futuro. Assim como numa boa piada nós rimos no final, quando ouvimos a última frase, o mesmo ocorre com a vida humana. Somente ao final da história, quando Mashiach vier, é que poderemos “entender” e realmente começar a rir.

Sintetizando Dois Mundos

Yitschac e Rivca vieram de duas origens diametralmente opostas: ele nasceu e foi criada por pais sagrados, provavelmente as pessoas mais altruístas daquela geração. O próprio Yitschac concordou em ser uma oferenda a D'us. Ele foi criado sobre o altar e, de certa forma, nunca deixou aquele altar. Ele não conhecia corrupção, engano e nem mesmo o egoísmo. Nada além da santidade o envolveu durante toda a sua vida.

Porém a verdadeira alegria na vida de Yitschac veio com Rivca – uma jovem criada num ambiente moralmente depravado, numa família notória por sua baixeza e desonestidade, numa sociedade de promiscuidade pagã. Se você acredita em “natureza” ou “criação”, Rivca deveria ter permanecida grosseira e animalesca.

Porém a pequena Rivca tinha um tremendo senso de humor! Ela entendeu que o chamado do homem era para desafiar a natureza e transformar a realidade. Assim, Rivca acabou se transformando, como o Midrash a define “numa rosa entre espinhos”. A partir de um mero animal auto-centrado, ela se tornou uma “Rivkah”, uma alma ligada a outras em bondade e amor, tentando “arar” um mundo terreno e transformá-lo num pomar Divino.

Rivca representa o animal humano elevando-se do seu atoleiro natural para entrar nas águas vivas da fonte de vida e compartilhar isso com os outros, até com aqueles que ainda estão no nível de um animal (um camelo), que foi como o servo de Avraham soube que ela era a esposa adequada para Yitschac.

A Cola

“Yitschac estava gracejando com Rivca, sua mulher.” Este era o segredo do seu casamento. Yitschac e Rivca, como relata a Torá, tiveram muitas discussões; algumas dessas discussões tiveram implicações históricas dramáticas. Porém jamais essas diferenças de opinião conseguiram separá-los. Yitschac e Rivca jamais perderam a lealdade e a confiança mútuas. Por quê? Porque jamais esqueceram que o propósito da vida – e do casamento – era rir! Transformar o impossível em realidade. Unir duas pessoas que por natureza são propensas a ficar separadas.

O mesmo deve ser aplicado também ao nosso casamento. Quando você está passando por discórdia com seu cônjuge, e previsivelmente estão a ponto de brigar, você deve perceber que o propósito do casamento é o riso, fazer o imprevisível acontecer. Naturalmente, não deveremos entrar numa briga; mas vamos nos surpreender, vamos achar uma maneira de transcender nossa natureza, e fazer nosso relacionamento funcionar.

E quando você observar deficiências em seu cônjuge que exigem muito esforço, em vez de ficar frustrado ou ressentido, você deveria entender que é exatamente este padrão – uma rosa emergindo de muitos espinhos – que garante ao casamento uma tremenda risada e deleite. O riso nasce somente da transformação.