Dores do Parto - Por Yoel Spotts
Ao escrever um romance, o escritor certamente será cuidadoso para arranjar a trama de maneira lógica e ordenada, fazendo as transições de um tópico a outro de maneira suave. Da mesma forma, poder-se-ia esperar que a Torá, sendo a fonte da vida para o povo judeu e tendo muito mais importância que um romance, seguisse a mesma linha. Entretanto, a seção introdutória da porção desta semana da Torá parece divergir desta consistência requerida.
A Parashá Tazria começa com uma discussão das leis sobre o status de uma mulher que acaba de dar à luz, e os vários procedimentos que devem ocorrer com ela e a criança. A Torá então imediatamente prossegue com uma descrição detalhada dos diferentes tipos de manchas e descolorações que podem tornar um indivíduo um metsorá. Estes dois assuntos – a mulher que acaba de dar à luz e uma pessoa que está sofrendo de tsaraat – poderiam parecer totalmente desconectados. Por que então estão colocados tão próximo um do outro?
Para responder esta pergunta, seria lógico examinar primeiro os detalhes destas duas leis. Em Vayicrá 12:7, lemos que uma mulher que teve um filho deve trazer uma oferenda: "O Cohen oferecê-la-á perante D'us e expiará por ela, e ela ficará purificada da fonte de seu sangue; esta é a lei para aquela que dá à luz um menino ou uma menina." Esta lei provoca uma pergunta óbvia: Qual foi o pecado desta mulher que necessita de expiação?
Os rabinos do Talmud fornecem uma resposta interessante a este problema: enquanto está sob a tensão e dor do parto, pode ser que esta mulher tenha jurado jamais retornar a seu marido, a fonte e causa de seu sofrimento atual. Portanto, quando a mulher se recobra totalmente, volta para seu marido e assim negligencia seu juramento anterior, na verdade está quebrando este voto. Embora a Torá reconheça que este juramento foi feito sob grande angústia e dor, mesmo assim a mulher não pode ser totalmente absolvida de realizar qualquer tipo de penitência. Afinal, fez um juramento e isso não pode ser desprezado. Portanto, a Torá possibilita à mulher a oportunidade de obter completo perdão ao trazer uma oferenda.
Se mudarmos nossa atenção agora ao segundo ponto em questão, a aflição da tsaraat, descobrimos que a Torá inicia sua discussão da pessoa atacada por esta doença sem nenhum tipo de introdução; o leitor é lançado imediatamente numa discussão abrangente das várias formas e manifestações da tsaraat. A Torá não menciona a causa do tsaraat em lugar algum, dessa forma deixando a pessoa imaginar qual pecado poderia precipitar esta doença no corpo ou na propriedade de alguém. Rashi oferece uma resposta baseada sobre o Talmud, de que a causa primária do tsaraat é o grave crime de lashon hará. A fim de avaliar a gravidade de suas ações, aquele que fala lashon hará é afligido com tsaraat. Não apenas a pessoa afetada deve lidar com lesões cobrindo seu corpo, como também é forçada a separar-se da comunidade em geral, e suportar um longo processo de cura, assinalado por repetidas visitas do Cohen, para determinar o status e o desenvolvimento da doença.
Espera-se que toda esta angústia e tormento ajudarão a reconhecer seu mau procedimento e leve-a ao arrependimento. Neste ponto, podemos facilmente entender a justaposição destes assuntos aparentemente tão desconexos. A Torá aqui deseja nos ensinar o poder da palavra. Enquanto a sociedade ocidental professa crenças como "as pedras podem quebrar meus ossos, mas as palavras não podem ferir-me", o Judaísmo atribui muito mais importância e significado à palavra falada.
Toda palavra pronunciada deve ser cuidadosamente medida. Mesmo um juramento feito em meio as dores do parto deve ser contabilizado. Até um comentário aparentemente inofensivo sobre um judeu deve ser tratado. As palavras têm um significado. Não podemos permitir que nossa boca aja livremente, sem qualquer preocupação quanto ao resultado. Assim como a Torá nos foi outorgada no Monte Sinai, não por um rolo que caiu do céu, mas através da palavra sagrada de D'us, assim também devemos nos purificar e santificar nossas palavras.
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