Uma pergunta comumente feita é se há conflitos entre Torá e ciência. Na verdade, não há conflitos entre ciência e Torá a menos que a ciência sob discussão seja a verdadeira ciência, em oposição à popularizada pseudo-ciência que é comumente impingida sobre um público sem suspeitas e sem discriminação.

Na verdade, conclusões derivando de autêntico e pleno inquérito científico invariavelmente concordam com a Torá. O fato de que muitas das conclusões científicas são incompletas e provisórias pode levar alguém a acreditar que a Torá diz coisas que a ciência não confirma. Quando consideramos esses supostos conflitos mais cuidadosamente, no entanto, vemos que devido a dados inadequados ou insuficientes, a “conclusão” científica não é realmente uma conclusão – mas sim apenas uma hipótese.

Devemos ter em mente que a ciência está constantemente evoluindo e se desenvolvendo, ao passo que a Torá é completa. É natural, portanto, que muitos fenômenos discutidos na Torá não possam ser lidados cientificamente até que a adequada disciplina cientifica seja suficientemente avançada para permitir as observações necessárias. Por outro lado, quando observações suficientes permitem uma conclusão logicamente válida, isso invariavelmente concorda com o que a Torá possa dizer sobre o mesmo assunto. Isso não é realmente notável. Como há somente uma realidade, meios diferentes válidos de examinar a realidade deveriam produzir conclusões similares e complementares.

Existência da Alma

Um bom exemplo disso é a existência da alma. Somos inequivocamente informados pela Torá de que vida e consciência são providas por uma entidade espiritual que se oculta e é operador da sofisticada máquina computadorizada que chamamos de corpo. A Torá está repleta com informação sobre a natureza das almas. Interessante, a existência de uma entidade consciente não-material responsável por operar o corpo material também tem sido demonstrada cientificamente. As observações sobre as quais essa conclusão está baseada são numerosas, e algumas bastante complicadas.

Talvez as observações mais simples e mais significativas fossem aquelas de Wilder Penfield1, o fundador do Instituto Neurológico de Montreal e um dos mais notáveis neurocientistas que já viveram. Penfield explorava a função do cérebro estimulando eletricamente diferentes regiões do córtex cerebral em pacientes conscientes passando por cirurgia (com anestesia local) para medir problemas focalizados. Penfield descrevia a ativação do córtex motor, uma área do cérebro responsável por transmitir todos os movimentos conscientes aos níveis adequados do troco cerebral e medula espinhal.

Quando ele aplicava uma corrente elétrica fraca na região “mão” desse córtex o paciente começava a mover a mão (no lado oposto do corpo) para trás e para a frente. Quando Penfield perguntava ao paciente por que ele estava movendo a mão, o paciente respondia que ele (o paciente) não estava fazendo o movimento, mas sim Penfield estava fazendo com seu eletrodo. Quando Penfield estimulava a área motor ativando a laringe, o paciente pronunciava uma sílaba. Quando era indagado sobre isso, o paciente respondia que ele próprio não tinha tido nada a ver com o som e que Penfield tinha causado aquilo.

Computador de Carne

A única conclusão válida de tais observações é que a vontade de mover e o movimento em si não são um só e o mesmo. A vontade consciente de se mover emana de algo que está fora do cérebro e é capaz de observar objetivamente a operação daquilo que nada mais é que um computador feito de carne.

Há um “Eu” (como em “Eu não fiz o movimento”) que, quando tem acesso ao computador (cérebro) pode programar movimentos. Se outra pessoa tem acesso ao computador, porém, o “Eu” é plenamente cônscio de que a máquina está sendo controlada por outra pessoa. O “Eu” e o cérebro são, portanto, não a mesma coisa. O “Eu” pode ser uma entidade consciente não-cerebral, i.e., uma alma.

Em outros experimentos, Penfield conseguiu evocar experiências de memória notáveis estimulando o lóbulo temporal doente em pacientes sofrendo de tremores no lóbulo temporal. Os pacientes ficaram surpresos por poderem experimentar novamente eventos que tinham ocorrido há muito tempo. No entanto, eles estavam igualmente cônscios do fato de que estavam atualmente passando por cirurgia no Instituo Neurológico de Montreal. Obviamente, o “Eu” que estava engajado nessas experiências era somente outro e fora do cérebro que era estimulado a “reviver” essas experiências do passado. A consciência dos pacientes e a experiência de memória não eram a mesma, mas sim o “Eu” estava visualizando a atividade do cérebro. Penfield relatou que não há local no córtex cerebral onde estimulação elétrica irá fazer um paciente acreditar, decidir ou mandar. Essas não são funções do cérebro, mas do “Eu” ou alma.

Estudos sobre como o cérebro analisa entrada sensorial leva às mesmas conclusões.2 As reações elétricas das células do nervo nas áreas visuais do cérebro a vários estímulos visuais foram estudados extensivamente. Células gânglio na retina reagem a padrões visuais altamente específicos. Células no córtex visual que recebem conexões da retina (por meio do corpo lateral geniculado) reagem a complexos dos padrões que ativam a retina.

Codificação Complexa

Assim, cada estágio sucessivo no sistema visual sintetiza e integra os padrões aos quais o estágio anterior reage. Toda informação visual é, portanto, em última análise codificada em complexas sequências de reações elétricas no nível mais alto do córtex visual. Aqui está o ponto principal. O cérebro somente é capaz de codificar informação visual. Deve haver um “Eu” distinto e separado do cérebro físico que interpreta o código. Quando olhamos para um objeto, percebemos o objeto. Não percebemos sequências de mudanças elétricas. Não “vemos” nem somos sequer conscientes dos potenciais de ação, correntes de sódio, e outros componentes do Código Morse do cérebro. Há, portanto, uma entidade não-cérebro que traduz padrões de mudanças elétricas em percepção consciente.

O argumento de que talvez outra área do cérebro (ex., associação do córtex) esteja fazendo a tradução é insustentável pois essas outras áreas têm as mesmas propriedades físicas e biológicas que córtex visual, e portanto são capazes somente de codificar informação em sequências de atividade elétrica.

Dinâmica de Interação

Estudos mais recentes têm descrito a interação entre o cérebro físico (o computador) e seu operador não físico, não cerebral. Algumas dessas descobertas atuais são discutidas por Sir John Eccles3, numa excelente revisão do assunto. Um experimento discutido neste livro é de Kornhuber e seus associados4. Esses investigadores examinaram atividade elétrica cortical em seres humanos antes, durante e depois de um movimento feito por vontade consciente. As dificuldades técnicas em fazer esses registros e o método engenhoso para superá-las são descritas no artigo. É suficiente dizer que um ser humano foi posto para escalar eletrodos e ordenado a flexionar seu dedo direito à vontade. Cerca de 800 milissegundos antes da flexão dos músculos do dedo, uma vasta área da superfície cerebral em ambos os hemisférios exibiram um potencial negativo lentamente crescente.

Essa foi uma descoberta surpreendente. A área cortical transmitindo movimento consciente para o nível adequado de cordão espinhal é uma região específica altamente restrita do córtex motor. Como somente o dedo direito estava envolvido, podia-se esperar ver atividade elétrica somente no córtex motor esquerdo. Essa negatividade bilateral generalizada sobre amplas áreas de córtex cognitivo tanto tempo antes do movimento real foi interpretada como uma expressão da vontade de mover o dedo.

Isso confirma a observação comportamental de Penfield de que a vontade de mover-se e o movimento em si não são idênticos. Eccles considera essa negatividade antes generalizada como representando o “Eu” não-físico dizendo ao cérebro físico o que deseja para realizar, ou seja, flexão do polegar direito. Essa conclusão é baseada no fato de que a negatividade generalizada está sem causa eletro-fisiológica observada antes e, portanto, sua iniciação deve em última análise refletir a influência de algo que não seja o cérebro. Cerca de 50 milissegundos antes do movimento, o encefalograma mostra uma notável focalização e concentração na atividade da área altamente restrita “dedo” do córtex motor à esquerda.

O que dirige e foca a atividade elétrica inicialmente generalizada à região precisa do córtex para iniciar o movimento desejado? Mais uma vez, Eccles invoca o “Eu”, pois isso não pode ser explicado com base em eventos elétricos anteriores (que são largamente disseminados e não-seletivos). Assim, Kornhuber e associados observaram o “Eu” não físico programando sua vontade para dentro do computador cortical.

Percepção Sensorial

Não somente a “vontade” foi examinada eletrofisiologicamente, mas também a percepção sensorial. Num artigo recente, Roland Puccetti e Robert Dykes revisaram aquilo que é conhecido sobre o córtex sensorial primário5. Os autores concluíram que embora seja claro e óbvio a todos que ver, ouvir e sentir são experiências radicalmente diferentes, não há base neuro anatômica ou neuro fisiológica para explicar as diferenças. O córtex que recebe conexões auditoriais é idêntico em sua histologia, bioquímica e comportamento eletrofisiológico ao córtex que recebe o sistema visual ou ao córtex que recebe o sentido do tato.

Puccetti e Dykes concluem, portanto, que as diferenças em nossa percepção consciente dessas modalidades (ex., quando um carro explode, ouvimos isso em vez de ver ou sentir) não são responsáveis por diferenças correspondentes nas regiões apropriadas do cérebro. A atividade das áreas sensoriais do cérebro devem ser interpretadas como ver, sentir ou ouvir por algo que não é o cérebro em si mesmo, mas sim distante dele. Seu artigo é particularmente esclarecedor pois inclui uma variedade de criticas de sua interpretação e sua reprovação da critica.

Cópia da Torá

Embora Torá e ciência ambas indiquem que a essência da vida humana consciente é uma alma não-material, não-cerebral, a qualidade da informação fornecida por cada uma dessas fontes difere consideravelmente. A ciência pode apenas confirmar que as almas existem mas não pode dar informação sobre a sua natureza. Além disso, a ciência não pode explicar como uma entidade não-material pode interagir com um cérebro físico. A ciência, devido às suas inerentes limitações, somente pode lidar com o exterior da realidade.

A Torá, por outro lado, é o projeto para a realidade, pois como nos diz o Midrash (Bereshit Rabá), “D'us olhou na Torá e criou o mundo”. Portanto, a Torá transmite informações concernentes à essência da realidade. Para adquirir conhecimento da natureza essencial da alma, é preciso voltar-se para a Torá.