Esperança, um ingrediente essencial
Quando minha filha nasceu, senti uma alegria total, uma mistura de bênção e contentamento. Ter uma menina era a resposta às minhas orações, pois eu poderia dar a ela os nomes de minha mãe e de minha sogra, ambas falecidas recentemente. Nós a chamamos de Zlata Esther – Zlata pela minha mãe, e Esther pela minha sogra – e a chamávamos de Zlatie.
Seu primeiro ano de vida foi repleto de felicidade, enquanto eu a ajudava a passar por todas as etapas. Embora Zlatie fosse ligeiramente demorada para engatinhar e andar, o competente pediatra não estava preocupado. “Ela é um bebê perfeitamente saudável. Todas as suas necessidades são atendidas imediatamente, portanto há pouca necessidade para ela explorar em volta. Curta sua filha feliz. Ela é o sonho de qualquer mãe,” ele me assegurou.
Ele estava certo. Zlatie não era exigente, raramente chorava, e nunca pedia para ir ao colo. Ela me seguia com os olhos, mas estava contente de permanecer no berço ou no carrinho.
Quando Zlatie completou dezoito meses, porém eu estava ficando alarmada pela sua complacência. Expressava minha preocupação ao médico durante cada visita mensal, e ele finalmente concordou com relutância em encaminhá-la para um exame neurológico. O exame no Hospital Presbiteriano Columbia se provou inconclusivo, mas um proeminente psiquiatra deu um diagnóstico: autismo.
Em 1964 essa condição ainda era praticamente desconhecida, ainda estava na infância. Fiquei abalada, e insegura sobre como eu iria lidar com aquilo. Uma audiência, yechidut, com o Rebe era o que eu precisava.
Fui acompanhada por Zlatie, que estava adorável com seu longo cabelo castanho e ondulado emoldurando seu rostinho. Estava vestida com seu avental azul e branco bordado, com um grande laço nas costas, e seus brilhantes sapatos de couro.
Zlatie segurou minha mão enquanto entrávamos na sala do Rebe. Ele nos observou e convidou a sentar. Ele observava Zlatie enquanto ela subia na cadeira. Então ele removeu um papel e lápis da gaveta de sua mesa e colocou os itens na frente de Zlatie. Ela imediatamente pegou o lápis, segurou-o corretamente com sua mão pequena e começou a rabiscar o papel.
A face do Rebe estava brilhante. “Isso é maravilhoso,” disse ele em yidish. “Suas reações são perfeitamente normais. Não entendo por que você se sente tão abatida.” Suas palavras eram confortantes.
Ao final da audiência, o Rebe abriu novamente sua gaveta e tirou um brilhante dólar de prata. Zlatie estendeu imediatamente sua mãozinha e pegou o dólar. O Rebe sorriu feliz, e recomendou uma avaliação com um médico famoso.
O Rebe me instilou esperança, um ingrediente essencial para a mãe de uma criança com necessidades especiais. Ele inspirou-me a ajudar Zlaie a desenvolver seu pleno potencial. Ele deu-me força e coragem para perseverar. Ela atingiu muitas metas – nem sempre no tempo recomendado, mas aquilo não era importante. Ela comia sozinha e usava os talheres adequadamente aos três anos. Com quatro anos e meio ela conseguia se vestir sozinha, fechando zíperes, botões e cintos, e dando laços nos sapatos.“Nó duplo,” ela exclamava com orgulho após dominar a tarefa.
O Rebe aconselhou-me a proceder como se Zlatie fosse uma criança normal. Esse seria um importante componente do seu sucesso. Entendi com aquilo que o Rebe dizia que ação era a chave, que uma atitude otimista era essencial, e que preocupação infindável seria prejudicial.
Encontrando Equilíbrio
Pouco tempo depois visitei um psiquiatra, aclamado pelo seu famoso livro sobre crianças excepcionais. Ele olhou-me com condescendência. Com grande autoridade ele declarou: “Esta criança jamais poderá levar uma vida independente. Faça um favor a si mesma e encontre uma residência para ela. Esqueça até mesmo que ela nasceu.”
Seu grosseiro pronunciamento me aterrou. Minha filha, minha criança inocente, nunca pediu para nascer. D'us a tinha dado para mim, e ela era da minha responsabilidade. Com olhos arregalados, olhei para ele, tirei Zlatie da cadeira e saí. Somente mais tarde permiti que as lágrimas rolassem em meu rosto.
Com o coração partido, devastada, fui ao Rebe novamente. Após noites sem dormir, me virando de um lado para outro, entrei em seu escritório. Havia muita coisa que eu pretendia dizer, muitas perguntas a fazer.
O Rebe olhou-me com grande bondade e compaixão. Seus olhos estavam repletos de profunda compreensão. Fui incapaz de controlar minhas lágrimas; elas rolavam livremente enquanto profundos soluços quebravam o silêncio. Fechei meus punhos, criticando-me silenciosamente por desperdiçar um tempo precioso com minha explosão emocional.
Finalmente, com grande dificuldade, recuperei o controle e a audiência começou. Abri meu coração ao Rebe, relatando plenamente a ele sobre a condição de Zlatie. O Rebe ouviu, balançando a cabeça, imerso nas minhas palavras. Então ele perguntou: “Fale-me sobre seus outros filhos. Como estão indo na escola? Eles têm amigos?”
Esse era o Rebe. Ele me lembrava, em sua maneira simples, que D'us tinha me abençoado com outros quatro filhos, e que eu precisava ser mãe para todos eles. Com o coração mais animado deixei a sua sala, armada com uma nova percepção da importância de enxergar o quadro inteiro, para encontrar equilíbrio.
Extraído de Diferenças Dignificantes: Uma Alma Especial
Clique aqui para comentar este artigo