Pela Graça de D'us
6 de Shevat 5731 (1º de fevereiro 1971)
Brooklyn, NY

Srta ------
Londres, Inglaterra

Saudação e Bênção:

Recebi sua carta com algum atraso, Nela você escreve sobre a incerteza que sente sobre o comprometimento com Yiddishkeit, visto que você pensa que a vida segundo a Torá e mitsvot é restritiva, e limita o indivíduo na criatividade pessoal, especialmente na área de pensamento e opções para si mesmo, etc., portanto é difícil reconciliar tal compromisso com a ideia da liberdade pessoal.

Francamente, essa atitude é de certa forma surpreendente, vindo de uma pessoa que pensa. Suponho que a dificuldade aqui se deve ao entendimento superficial do significo de “aceitação do jugo da Torá e mitsvot,” porque a palavra “jugo” sugere restrição.

Na verdade, porém, há muitas coisas na vida diária que uma pessoa aceita e segue sem questionar, mesmo que seja um intelectual muito dotado, com uma mente inquisitiva. Como você frequenta uma faculdade, e sem dúvida estudou ciência, etc., certamente sabe que ninguém sai estudando tudo em física e tecnologia desde o começo, verificando tudo através de pesquisa e experimentos pessoais. Por exemplo, uma pessoa embarca num avião sem antes ter pesquisado aerodinâmica, etc., para verificar se é seguro voar nele, e que aquilo a levará ao destino aproximadamente na hora programada.

Ou pegue um outro exemplo na área da saúde física. Há coisas bem estabelecidas que são úteis ou prejudiciais à saúde de alguém. Uma pessoa não sai por aí tentando verificar a utilidade ou o perigo de um remédio em particular por meio de experimento pessoal. Mesmo que a pessoa tenha uma forte inclinação para fazer pesquisa, certamente escolherá áreas que ainda não foram testadas. Essa atitude geralmente aceita é compreensível e lógica. Pois como os especialistas pesquisaram amplamente essas áreas e determinaram o que é bom e o que é prejudicial para a saúde física, ou estabeleceram métodos para maiores avanços tecnológicos – seria uma perda de tempo tentar passar por todos os experimentos desde o início. Por outro lado, não há certeza de que ele não pode cometer algum erro, e chegar a conclusões erradas, com efeitos desastrosos, como a experiência tem demonstrado em alguns casos.

O que foi dito acima sobre a saúde física também se aplica à saúde espiritual, e como a Neshamá pode atingir perfeição e plenitude. Ainda mais porque a saúde espiritual geralmente está relacionada com a saúde física, especialmente naquilo que diz respeito ao judeu.

Ora, o Criador do homem, que é também o Criador e Mestre de todo o mundo, certamente tem as melhores qualificações que se poderia esperar de uma autoridade, saber o que é bom para o homem e para o mundo em que ele vive. Em Sua bondade, D'us já nos proveu com resultados completos e definitivos, tendo nos avisado que se uma pessoa conduz sua vida diária numa certa maneira, então terá uma Neshamá saudável num corpo são, e será bom para ele e no mundo vindouro. Ele também deixou certas áreas nas quais uma pessoa pode fazer seus próprios experimentos em outras questões que não interferem com as regras estabelecidas por Ele.

Em outras palavras, é certo que se um ser humano viver tempo suficiente se tiver as necessárias capacidades para fazer todos os tipos de experimentos, sem distração e interferência e sem erro, sem dúvida chegará às mesmas conclusões que já encontramos na Torá que D'us nos deu, ou seja, a necessidade de guardar o Shabat, comer casher, etc.

Mas, como foi mencionado, D'us em Sua infinita bondade – e é da natureza de D'us fazer o bem – desejou nos poupar de todos os problemas, bem como da possibilidade de erro, e já nos deu os resultados de antemão, para o benefício tanto da pessoa que tem a inclinação e a capacidade de pesquisar, como para aqueles que não as têm.

A expressão “jugo” em relação a aceitar a Torá e mitsvot na vida diária é para ser entendida no sentido de que a natureza humana faz necessário agir com imperativos. Pois a natureza humana, e o Yetzer Hará, são de tal forma que um indivíduo poderia facilmente ceder à tentação. A tentação é doce no início, mas amarga no final. Porém a natureza humana é tal que um indivíduo pode desconsiderar as amargas consequências por causa das gratificações iniciais. Vemos, por exemplo, que crianças, e às vezes adultos, podem ser advertidos que exageros em determinados alimentos podem ser prejudiciais, e deixá-los doentes mais tarde, de modo que durante algum tempo talvez não possam comer coisa alguma, porém mesmo assim eles rejeitam tudo para satisfazer uma paixão ou o apetite imediato. De maneira semelhante, D'us nos deu o “jugo” da Torá e mitsvot, dizendo-nos que se a pessoa entende ou não, ou qualquer que seja a tentação, deve-se cumprir os mandamentos de D'us sem questionar.

Há mais um detalhe, e este é o aspecto mais essencial do conceito de “jugo” da Torá e mitsvot. É que embora, como mencionado antes, a Torá e as mitsvot tenham sido dadas em benefício do homem, tanto nesta quanto na Vida Eterna, há uma qualidade infinitamente maior com a qual D'us dotou a Torá e mitsvot, ou seja, a qualidade de unir o homem com D'us, o ser criado com o Criador, que de outra forma nada teriam em comum. Pois, ao dar ao homem um conjunto de mitsvot para cumprir na vida diária, D'us tornou possível ao homem apegar-se ao seu Criador, e transcender as limitações de um ser limitado, vivendo num mundo limitado.

A Torá e as mitsvot constituem a ponte que cobre o abismo separando o Criador da criatura, permitindo que o ser humano se eleve e se apegue à Divindade. Obviamente esta qualidade pode ser atingida se a pessoa observa Torá e mitsvot não por causa da recompensa que vem para o corpo, ou para a alma, ou ambas, mas puramente porque são a Vontade e Ordem do Eterno, bendito seja. Por este motivo também, o texto da Berachá que um judeu faz antes de cumprir uma mitsvá não menciona a utilidade da mitsvá, mas sim o fato de que “Ele nos santificou com Seus mandamentos e nos ordenou.”

Muito mais pode ser dito em conexão com um tema tão profundo, mas creio que as linhas acima, embora limitadas em quantidade, têm conteúdo suficiente para esclarecer os verdadeiros aspectos do assunto. Além disso, se você quiser discutir estes temas com mais profundidade, certamente tem amigos entre Anash em Londres que ficarão felizes em esclarecê-lo.

Finalmente, eu gostaria de dizer que o fato de você ter algumas dúvidas e incertezas não deveria desencorajá-la. Na verdade, a Torá deseja que uma pessoa utilize todas as suas habilidades, incluindo sua mente e inteligência, a serviço de D'us, desde que a abordagem seja correta, ou seja, aceitando a Torá e as mitsvot primeiro. É natural e até desejável que a pessoa entenda tudo que está ao seu alcance mental. No seu caso isto é da maior importância, porque você tem oportunidade de influenciar e beneficiar outras pessoas que têm a mesma inclinação de mente que você.

À luz do acima exposto, você também entenderá minha resposta na questão do Shiduch, que em minha opinião é como foi dito antes, ou seja, que é um Shiduch adequado, e pode ser numa hora feliz e auspiciosa, para um Binyan Adei Ad, no alicerce da Torá e mitsvot com total compromisso com a Torá e mitsvot no espírito da Beracha “Que nos santificou com Seus mandamentos e nos ordenou.” Isso irá, na verdade, ser também o canal para boa saúde, tanto para a Neshamá quanto para o corpo, e todos os benefícios desejáveis – embora de que valem todas as recompensas em comparação a atingir: “Israel e o Eterno, bendito seja, através da Torá, são todos um só.”

Com bênção,