Para defender um país você precisa de um exército, mas para defender uma identidade você precisa de escolas.
A história em si tem uma história. Aquilo que os eventos parecem significar na época não é como são vistos sob a plena perspectiva da distância. Veja Chanucá, a festa que em breve celebraremos. Abra o Primeiro e o Segundo Livro dos Macabeus e lerá uma história de coragem militar. Desde os dias de Alexandre o Grande, Israel estava sob o governo dos gregos, primeiro sob os Ptolomeus baseados no Egito, depois, um século mais tarde, sob os Selêucidas, que governavam a partir da Síria.
Um líder selêucida, Antiochus IV, decidiu forçar o ritmo da helenização dos judeus, banindo publicamente as práticas do Judaísmo. No lugar delas ele instalou uma estátua de Zeus no local do Templo e ordenou que sacrificassem suínos ali. Para os judeus isso era a “abominação da desolação”.
Yoshua ben Gamla entendia que a verdadeira batalha que os judeus enfrentavam não era a militar. Era cultural e espiritual.
Liderado pelo idoso sacerdote Matityahu e seus filhos, um grupo de judeus conhecidos como Macabeus ergueu-se em revolta. Eles conseguiram uma vitória, reconquistaram Jerusalém, purificaram o Templo e reacenderam seu candelabro, a Menorá. Ela é o símbolo mais visível da festa até hoje. Nós a acendemos em nossos lares durante oito noites, acrescentando uma vela extra a cada noite. Eis como a história era na época: uma história de exércitos, batalhas e heroísmo físico. Mas o Livro dos Macabeus jamais fez parte da Torá. Não é como os judeus vieram a relembrar o passado. O motivo é que a vitória teve um prazo relativamente curto. Os judeus venceram seu confronto com os gregos, mas o perderam contra os romanos. Um século depois Pompeu invadiu Israel, que então passou para o domínio romano, Quando isso também se tornou opressivo, os judeus se ergueram em revolta duas vezes, no primeiro e no segundo séculos. Ambos foram desastres nacionais. Após o primeiro, o Templo foi destruído. Depois do segundo, Jerusalém ficou abandonada. Em conjunto, estas foram as piores catástrofes judaicas até o Holocausto.
Porém o Talmud relata uma história fascinante. No primeiro século, pouco antes da destruição do Templo, um rabino chamado Yoshua ben Gamla organizou a criação de uma rede nacional de escolas, proporcionando a educação das crianças em todo o país. Foi o primeiro sistema de educação universal na história. O Talmud diz que se não fosse por ele “a Torá teria sido esquecida em Israel.” Não teria havido judaísmo, identidade, nem judeus.
Uma nova identidade judaica começou a emergir, baseada não em exércitos, mas em textos, professores e casas de estudo.
Yoshua ben Gamla entendia que a verdadeira batalha que os judeus enfrentavam não era a militar. Era cultural e espiritual. Eles se preocupavam suficientemente com sua fé para transmiti-la aos filhos? Eles acreditavam que apesar das grandes realizações dos gregos na arte, arquitetura, literatura e filosofia, os judeus ainda tinham uma grande contribuição a fazer para o mundo que ostensivamente era deles?
Uma nova identidade judaica começou a emergir, baseada não em exércitos, mas em textos, professores e casas de estudo. Os judeus se tornaram um povo cujas cidadelas eram escolas, cujos heróis eram professores e cuja paixão era a educação e a vida da mente. E sobreviveram. Isto foi o mais notável.
A transformação do significado no decorrer do tempo é ecoada no próprio nome Chanucá. Significa “dedicação”, que os macabeus fizeram ao Templo depois de ser purificado. Porém a mesma palavra, na forma Chinuch, também significa “educação”, a dedicação ou consagração dos jovens como guardiães de uma identidade sagrada. As luzes de Chanucá vêm para simbolizar a santidade do lar judaico.
Os judeus se tornaram um povo cujas cidadelas eram escolas, os heróis eram professores e cuja paixão era a educação... E sobreviveram. Isto foi o mais notável.
O Ocidente atual está lutando algumas difíceis batalhas militares. Mas também há, assim como havia para os judeus há 22 séculos, uma batalha espiritual e cultural a ser lutada: não para impor nossos valores sobre os outros, mas para ensiná-los aos nossos filhos.
Ainda temos um senso claro de quem somos como nação? Nós cmpartilhamos valores? Ainda acreditamos na santidade da família? Nossas vidas têm profundidade espiritual e beleza moral? Vemos a nós mesmos como guardiães de uma tradição que transmitimos com orgulho aos nossos filhos?
O futuro do Ocidente pode depender das nossas respostas àquelas perguntas. Para defender um país você precisa de um exército. Mas para defender uma identidade você precisa de escolas.
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