O Báal Teshuvá - Do diário de Rabi Yossef Yitschac de Lubavitch1

Petersburgo, Terça-feira, 11 de Shevat (30 de janeiro, 1912); Hotel Estari, Apto. 527, 11:30.Acabei de chegar pelo expresso Paris-Petersburgo. Este trem viaja pelas costas francesa e italiana, fazendo o seguinte itinerário: paris, Marselha, Nice, Monte Carlo, Menton, Ventimiglia, Gênova, Frankfurt, Berlim, Konigsberg, Kovna, Petersburgo. Passei cerca de duas horas na cidade, e informei todos os meus associados que eu tinha chegado. No entanto, estou exausto da viagem, e também quero registar tudo que ocorreu em minha viagem. Portanto, disse a eles que somente os encontraria hoje às 9 horas da noite.

Viajei pelo trem expresso num compartimento privado. Na verdade, todas as cabines neste trem são individuais. O trem deixou Paris às 11:30 da noite de sábado. Chegando à minha cabina, de nº 3, descobri que estava mobiliada com mesa, cadeira e cama, além de um lavatório compartilhado com o quarto vizinho. Havia também uma lâmpada forte, o que me levou a acreditar que seria possível escrever. Mas quando o trem começou a se mover, vi que a velocidade tornava impossível escrever mais que alguns rabiscos, e mesmo esses com alguma dificuldade.

A viagem ao longo da costa foi linda; os sentimentos evocados por este cenário glorioso realmente merecem ser registrados por inteiro. Infelizmente, o tempo não permite isso, e descreverei apenas minhas impressões sobre um encontro casual com um chassid da família M., qie por vários motivos tinha passado por uma progressiva descida espiritual (que possamos ser poupados desse destino). Porém a Divina Providência arrumou as coisas para que ele não continuasse perdido, e pudesse se reabilitar…

Às seis horas, entrei no carro-restaurante para tomar uma xícara de chá enquanto lia diversas cartas urgentes que me foram passadas por meu pai em Menton, À uma das mesas estava um judeu idoso apreciando seu jantar, que incluía carne e vinho (não-casher). Assim que entrei no restaurante, o homem colocou o chapéu e me abordou, estendendo a mão numa saudação de Shalom Aleichem! “Você é o filho do Rebe Maharash2, ou talvez seu filho?” perguntou ele.
Meu primeiro impulso foi não responder a ele, pois eu estava muito aborrecido com esta pessoa que não comia comida casher. Mas como sua expressão facial era muito simpática, logo mudei de idéia. “Sim” – respondi – “sou o neto do Rebe Maharash de Lubavitch.”

Ao ouvir minha resposta, seu rosto ficou rubro e seus olhos se encheram de lágrimas. Sem dizer mais nada, ele voltou à sua mesa, chamou o garçom e pagou a conta, partindo sem terminar a refeição.

Às onze da noite, o trem chegou a Frankfurt, onde ficou durante algum tempo. Desci do trem para tomar ar fresco, e percebi que aquele homem tinha feito o mesmo, e estava caminhando em minha direção. Ele aproximou-se e disse que gostaria de me contar uma história interessante, Porém, ele foi rapidamente dominado pela emoção, e lágrimas rolaram de seus olhos, deixando-o incapaz de falar. Enquanto isso, chegou a hora da partida do trem, Embarquei em meu vagão, e ele entrou no seu.

Cedinho na manhã seguinte chegamos a Berlim. Quando desci do trem para tomar ar, o homem abordou-me outra vez e desejou-me “Bom dia”, reclamando que fora incapaz de dormir a noite inteira.

Quando o trem deixou Berlim, levantei-me para rezar; não houvera oportunidade de fazê-lo mais cedo, pois ainda era antes da alvorada. Antes que eu terminasse minhas preces, o cabineiro entrou no compartimento, informando que um dos passageiros desejava visitar-me. Disse a ele que pedisse desculpas pela demora, e que informasse ao homem que eu o receberia dali a meia hora.
Na hora aprazada o homem entrou e desculpou-se por me perturbar. “Estou tão dominado pela emoção que não consigo falar” – disse ele. Começou a chorar abertamente, e isso provocou grande impressão em mim. O homem aparentava ter mais de cinqüenta anos, e vestia-se de maneira elegante. Não usava barba, apenas um bigode curvo, num estilo enfeitado.

De repente, sem uma palavra, cobriu o rosto com as mãos e explodiu em lágrimas amargas.

Fiquei confuso com esta cena, não sabendo se tentava confortá-lo ou se o deixava chorar. Enquanto eu o observava, seu corpo inteiro tremia, Pensei que talvez ele tivesse ficado louco, ou que alguma outra desgraça lhe acontecera. Incapaz de suportar aquilo por mais tempo, comecei a consolá-lo. Passados alguns instante, ele começou a falar em voz trêmula: “Faça-me um favor espiritual, empreste-me seu tefilin.”

Mal pude acreditar naquilo que ouvia: ele estava me pedindo para emprestar-lhe meu tefilin! Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ele exclamou: “Ach, mein G’t! Nem sei quantos anos faz que não coloco tefilin” – e chorava sem parar.

Abri minha mala, tirei meus tefilin Rashi, e os entreguei a ele, dizendo que poderia rezar em minha cabina. Saí, deixando que abrisse seu coração a D’us sem ser perturbado. Ele continuou rezando por um longo tempo. Quando terminou, entrei no compartimento e ele devolveu os tefilin com profusos agradecimentos, pedindo emprestado meu sidur. Presumi que ele quisesse recitar alguns capítulos de Tehilim, e usar o sidur para as preces vespertinas.

Ele então voltou para seu próprio vagão, sem dizer-me seu nome. Era evidente que o homem tinha passado por alguma reviravolta interior, mas eu continuava sem saber quem era esta pessoa ou o que lhe acontecera.

Às três horas da tarde, o cabineiro me procurou novamente, relatando que o mesmo passageiro que me visitara naquela manhã queria ver-me novamente. Consenti, e ele entrou na minha cabina. Seu rosto estava pálido, com uma expressão muito triste. Numa voz fraca, como se estivesse doente, começou a falar.

A história de Y. M.

Meu nome é Y.M, sou filho do Reb Leib M., nascido na cidade de S., e fui um dos chassidim de seu avô. Durante minha infância e adolescência, estudei na cheder, e aprendi com os melhores melamdim, que eram chassidim e homens de bem. Os chassidim se reuniam na casa de meu pai em todas as ocasiões festivas, e eu era, obviamente, o primeiro a comparecer.

Por fim, no entanto, meu pai mudou-se de S. para Petersburgo. É verdade que mesmo ali o seu estilo de vida estava baseado nos princípios da Torá e Chassidismo, e mesmo lá os chassidim se reuniam regularmente em sua casa. No entanto, fui influenciado pelos filhos de nossos vizinhos, e comecei a seguir os seus caminhos.

Um dia, quase no fim do verão, enquanto eu estava na nossa casa de veraneio num subúrbio de Petersburgo, Papai disse-me que quando ele viajasse a Lubavitch para o próximo Rosh Hashaná, ele me levaria consigo. Eu contava cerca de quinze anos, e já tinha copiado o estilo de vida de meus jovens vizinhos, que não tinham restrições à satisfação de seus apetites. Obviamente, não gostei dos planos de Papai para levar-me a Lubavitch.

Quando chegou o dia, meu pai foi para Lubavitch com dois outros chassidim, levando-me com ele. Cerca de dez outras pessoas, membros de famílias conhecidas, juntaram-se a nós. Outros cinco ou seis, cujas despesas eram pagas pelos abastados irmãos K., também viajaram a Lubavitch.
Contemplar o rosto de seu avô, o Rebe, causou uma impressão indescritível em mim. Quando entre no aposento junto com meu pai para a yechidut, ele deu-me uma bênção explícita para sucesso em tudo que eu fizesse. Porém ele me advertiu para lembrar-me que era um judeu, pois a companhia que eu tinha então era um tanto arriscada.

As impressões de minha viagem a Lubavitch afetaram-me por muito tempo depois de nossa volta a Petersburgo, e deixei de associar-me aos filhos de nossos vizinhos não-judeus. Para grande surpresa deles, abstive-me até de freqüentar suas festas e jogos durante os feriados deles, como tinha feito nos anos anteriores. Esta situação continuou até o verão seguinte, quando fomos novamente para nossa residência de férias.

Quando estávamos em nossa casa de veraneio, eu já era um estudante do Ensino Médio, e pouco a pouco comecei a associar-me com meus jovens contemporâneos. Alguns deles eram instruídos e tinham qualidades refinadas, ao passo que outros buscavam uma vida de prazeres. Porém todos eles me influenciaram no sentido de me afastar do estilo de vida seguido em nossa casa.

Em certa ocasião cheguei em casa tarde, e deixei de rezar as preces Minchá e Maariv. De outra vez, como tinha pressa para juntar-me a meus amigos na piscina, deixei de rezar a prece Shacharit. Numa terceira ocasião, fiz uma refeição com eles. Assim, no decorrer dos meses de verão, abandonei o estilo religioso de vida ao qual tinha sido acostumado na casa de meus pais.
Quando voltamos da residência de verão para nossa casa na cidade, Papai começou a preparar-se para sua viagem anual de Rosh Hashaná a Lubavitch, mas eu permaneci em casa. Lembro-me como se fosse hoje: quando fui à sinagoga durante Rosh Hashaná e Yom Kipur, aquilo tudo parecia estrangeiro para mim.

Durante a estação de férias dos não-judeus, passei todo meu tempo com eles, raramente indo para casa. Certa vez, quando fui para casa, foi para ver minha mãe e pedir-lhe algumas centenas de rublos. Por duas vezes, visitei o escritório de meu pai para pedir ao caixa da forma algum dinheiro de que precisava.

Quando terminou a estação dos feriados e voltei para casa, Papai repreendeu-me e disse que estava pronto a dar-me todo o dinheiro que eu precisasse. Porém ele exigia que eu cortasse a amizade com meus jovens companheiros, os estudantes delinqüentes. Repliquei que já estava crescido, e viveria como fosse de meu agrado, pois meus pais não tinham direito de interferir com minha vida privada.

Para demonstrar minha independência, saí da casa de meus pais, e encontrei um apartamento para mim. Assim, passaram os próximos seis anos. Terminei o Colegial, casei-me e levei a vida totalmente secular que tinha escolhido para mim, quase esquecendo por completo meu estilo de vida anterior na casa dos meus pais.

A Influência do Maharash

Naquela época, foi fundada uma associação chamada “Os Jovens Progressistas”. O objetivo desta sociedade era patrocinar a causa dos oprimidos, prover seu bem-estar e fornecer-lhes apoio material e moral. A maior parte dos esforços da associação estava devotada à situação econômica dos nossos irmãos judeus.

Um dia, em dezembro de 1881, encontrei um conhecido e ele me disse que o Rebe estava visitando Petersburgo, e tinha ido falar com vários oficiais do governo para discutir a situação econômica do povo judeu. Como membro dos Jovens Progressistas, fiquei curioso para descobrir o que seu avô tinha conseguido em prol da comunidade. Tendo isso em mente, fui ao Hotel Serapinsky na Rua Zablakonsky, onde seu avô estava hospedado. Quando cheguei ao hotel, encontrei vários chassidim, a quem eu não via por muitos anos, desde que deixara a casa de meu pai. Eles ficaram contentes ao ver-me; pela primeira vez, percebi como é caloroso o afeto que os chassidim têm uns pelos outros, mesmo por aqueles que se afastaram.

Lembrei-me então do conflito que tinha ocorrido na casa de Papai nos primeiros dias depois que saí para viver em meu apartamento na Rua Pushkinsky com alguns de meus jovens amigos. Perante meus olhos, vi novamente como se estivesse acontecendo naquele exato momento dois dos amigos de meu pai, que tinham me visitado para tentar levar-me de volta à casa de meus pais. Fui conquistado pela sua demonstração de carinho por Papai e comigo, pois eles tinham derramado lágrimas de simpatia pelo desgosto de meu pai.

Eu não tinha dúvidas de que no decorrer dos anos eles tinham falado a meu respeito de tempos em tempos, e tinham perguntado sobre meu estilo de vida. Estou certo de que saber como eu vivia deve ter lhes causado sofrimento. Apesar disso, quando me viram na entrada do hotel, saudaram-me de braços abertos e calorosos cumprimentos, como se eu fosse um deles.

Os chassidim possuem uma qualidade única: amor pelo seu semelhante, sem considerações de posição ou nível. Não faz diferença para eles se alguém é pobre ou rico, jovem ou idoso. Esta qualidade os coloca no mais elevado nível ético. Mais de uma vez, nós jovens não religiosos conversamos entre nós sobre esta qualidade do amor pelo próximo, e como deveríamos seguir o exemplo dos chassidim a esse respeito.

O encontro no Hotel Serapinsky afetou-me bastante, e deixou-me com um cálido sentimento impossível de descrever com palavras. Enquanto eu ficava ali sonhando acordado com os dias passados, fui despertado pelo súbito som de vozes gritando: Baruch A-donai hamvorach leolam vaed. A princípio eu não sabia o que era aquilo, mas logo percebi que eles tinham começado a rezar a prece noturna, Maariv.

Seu avô, o Rebe, saiu de seu aposento e recitou o Kadish, porque aquele dia era o yahrtzeit do Alter Rebe3, autor do Tanya.

Demorou três dias para eu me acalmar das emoções despertadas por aquele encontro com meus velhos conhecidos dos dias de minha juventude. Fiquei ainda mais perturbado pelo Kadish que ouvi seu avô recitar, pois aquilo me lembrou do tempo que eu passara em Lubavitch.

Em 4 de janeiro de 1882, nós, membros dos Jovens Progressistas, descobrimos que o Ministro dos Assuntos Internos tinha insinuado aos governadores de Kiev, Cherigov e outros territórios para que instigassem pogroms contra os judeus. Sabíamos que s eu avô tinha vindo a Petersburgo para tratar de assuntos comunitários. O motivo principal da sua viagem eram os pogroms que tinham começado nas regiões do sul, e a onda de anti-semitismo que na ocasião varria o país. Sabíamos também da grande influência deles nos círculos governamentais, e que ele tinha exigido explicitamente que os cidadãos judeus do país fossem protegidos. Portanto, decidimos enviar diversos membros nossos para trocarem informações com seu avô.

No entanto, sabíamos também que seu avô era reservado, e que não era muito chegado à juventude secular (para ser mais preciso, ele a desprezava). Portanto, era bem provável que ele se recusasse a nos ouvir, ou exigisse que revelássemos as fontes de nossa informação, e que lhe apresentássemos provas convincentes sobre o fato. Como eu era um membro importante do Partido, e chefe da Divisão de Assuntos Judaicos, fui escolhido para visitar seu avô na companhia de outro membro, e a revelar-lhe aquilo que sabíamos.

Quando chegamos ao Hotel Serapinsky, não conseguimos pensar numa desculpa para pedir uma audiência com seu avô. Não era possível revelar o motivo de nossa visita adiantadamente, e tínhamos certeza de que não seríamos admitidos sem declarar nosso objetivo. No entanto, sabíamos que seu avô tinha o hábito de dar uma caminhada diária às 9 e meia todas as manhãs. Portanto, decidimos esperar por ele no saguão; quando ele passasse, nós entregaríamos um bilhete dizendo que tínhamos um assunto importante a discutir com ele, e queríamos marcar uma audiência.

Na manhã seguinte, chegamos ao hotel às 9 horas. Para nosso desapontamento, descobrimos que ele não daria seu passeio naquele dia, pois dois funcionários do Ministério dos Assuntos Internos tinha um encontro com ele às onze. Ficamos contentes ao saber desse encontro, pois seu avô poderia fazer bom uso da nossa informação quando falasse com eles. Mas ainda não havia um plano para obter nossa audiência.

Enquanto ali estávamos um tanto perplexos, a porta abriu-se de súbito e seu avô apareceu, acompanhado pelo rico chassid N. H. Eles começaram a andar de um lado para outro no corredor do hotel, enquanto meus colegas e eu permanecíamos num canto afastado. Poucos momentos depois, seu avô ergueu os olhos, e notou-me. Embora ele não tivesse me visto por oito anos (e não preciso dizer que minha aparência tinha mudado muito naquele tempo todo), ele reconheceu-me de imediato. Perguntou como eu ia, e se eu ainda me lembrava do discurso chassídico que tinha ouvido em Lubavitch.

Fiquei tão surpreso, que fui incapaz de dizer uma palavra. O ver minha confusão, meu companheiro disse: “temos um assunto urgente para discutir com o senhor, Rebe.” Seu avô voltou ao quarto, e instruiu o chassid N. H. a nos convidar para entrar.

Jamais esquecerei aquele olhar penetrante que seu avô pousou sobre nós; este tipo de olhar deixa uma impressão duradoura. A partir daquele dia, meu companheiro e eu nos tornamos ajudantes do seu avô em seus esforços para abrandar os sentimentos anti-semitas que estavam se espalhando entre os funcionários do governo e ministros.

Há muito mais que eu poderia dizer sobre as atividades de seu avô durante o mês que ele passou em Petersburgo; através de sua grande influência, ele conseguiu suprimir vários decretos perversos contra os judeus.

Um dia, quando eu estava visitando seu avô, ele virou-se para mim de repente e perguntou: “Quanto tempo faz que você deixou de colocar tefilin? Não tente negar! Não preciso que alguém me informe sobre isso. Posso dizer tudo que você tem feito, e exatamente quando e onde o fez.”
Enquanto eu me sentava perplexo, tentando pensar em alguma resposta, ele começou a recitar, incidente por incidente, tudo que tinha me acontecido, e as etapas pelas quais eu gradualmente abandonara a religião judaica. Fiquei como que atoleimado, a cabeça girando, o coração palpitando, e rios de lágrimas rolaram de meus olhos.

Durante os dias que se seguiram, fiquei muito envergonhado para aparecer perante seu avô, mas por fim recebi um bilhete de N. H. informando que seu avô tinha perguntado por mim diversas vezes. Fui então visitá-lo, e ela incumbiu-me de desempenhar diversas tarefas junto ao serviço público.

A conversa anterior com seu avô teve tamanho efeito sobre mim que na manhã seguinte consegui um par de tefilin (eu deixara os meus na casa de Papai quando me mudei de lá). Mantendo isso em segredo da minha família, comecei a colocar tefilin e a rezar, e evitei comer algo além de pão e chá.

Na primeira semana inventei várias desculpas, dizendo estar doente e incapaz de comer. Mas finalmente me vi forçado a revelar à minha mulher a minha decisão de não comer mais carne não-casher. Com grande dificuldade, consegui ater-me a uma dieta casher, e a adotar alguns outros aspectos do modo judaico de viver.

Um convite do Rebe

O seu avô deixou Petersburgo e voltou para casa, para Lubavitch. Depois daquilo comecei a levar uma vida mais religiosa, mas não visitei meu pai, e ele não sabia das mudanças no meu estilo de vida. Em meados de abril mudei-me para nossa casa de veraneio nos arredores de Petersburgo, com minha mulher e meu filho mais velho.

Alguns dias depois, meu pai foi visitar-me; esta visita surpreendeu-me, pois eu não sabia por que ele tinha ido. Para minha grande surpresa, Papai entregou-me uma carta que lhe fora escrita pelo seu avô. A carta continha um convite para o casamento de um dos seus filhos; nas margens, ele tinha incluído algumas linhas para mim, indicando que eu também estava convidado para o casamento. “Você precisava se dar ao trabalho de vir pessoalmente?” – disse eu a Papai. “Poderia ter mandado um de seus funcionários entregá-la.”

“Quando o santo Rebe escreve uma carta para alguém, nós chassidim não a confiamos a funcionários; uma missão como essa deve ser cumprida prontamente e com precisão” – replicou Papai. “Não imagino por quê, ou em recompensa de quais boas ações você teve o privilégio de receber cumprimentos do Rebe, e um convite para comparecer à sua alegre celebração. Mas como o Rebe realmente lhe escreveu, quem ousaria questionar o rei? Recebi a carta hoje, e vim imediatamente cumprir minha missão. Tendo feito isso, agora me despeço!” concluiu ele, preparando-se para voltar para casa.

Foi preciso muito esforço de minha parte e de minha mulher para convencê-lo a permanecer durante algumas horas, para que pudéssemos tomar um chá e dar uma caminhada pelo bosque. Papai contou-me sobre o casamento do filho do Rebe, e por minha vez relatei a ele os pontos altos de minhas conversas com o Rebe naquela ocasião em que ele visitara Petersburgo. Descrevi a maneira zelosa e obstinada com que ele ousara se dirigir aos funcionários do governo, exigindo justiça e igualdade em termos inequívocos.

Já estávamos conversando por três horas quando de repente ouvi alguém falar Shalom Aleichem! E vi o chassid Z. R. caminhando ao nosso encontro. Ele cumprimentou Papai calorosamente, e também saudou-me com um grande sorriso. Recitou então a bênção de Shehechiyanu4. Papai e eu o olhamos surpresos, pois não sabíamos por que ele tinha recitado a bênção.

“Por que estão me olhando desse jeito?” perguntou Z. R. “Quando o vi, meu querido Leible, passeando com seu filho Y. e tendo sabido pelo açougueiro Avraham que durante os últimos seis meses Y. tem somente comprado carne dele, fiquei feliz por vê-lo, e portanto recitei a bênção Shehechiyanu.”

Nós três continuamos caminhando em silêncio por algum tempo, até que Z. R. disse que muitos chassidim estavam planejando viajar até Lubavitch para a festa do casamento. Finalmente, voltamos à minha casa, onde minha mulher tinha preparado o jantar. Papai queria voltar à cidade, mas o chassid insistiu que ele comesse alguma coisa conosco. Ele também nos fez companhia para o jantar; comemos com muita alegria, e desde então, a paz foi restaurada entre meu pai e eu…

Meu Último Encontro Com o Maharash

Em 6 de agosto de 1882, o comitê central dos Jovens Progressistas encontrou-se para discutir o baixo status econômico dos judeus nas cidades meridionais. Ficou decidido que um emissário especial seria enviado a seu avô para informá-lo da situação e pedir sua ajuda; esta missão me foi designada.

O rosto de seu avô parecia pálido quando ele me cumprimentou. “Acabei de vir do Ohel5”, disse ele. “meu pai, o Rebe Tsemach Tsedec, diz que a situação não é tão grave, mas que mesmo assim devemos tomar alguma providência.”

Ele passou mais de uma hora comigo, delineando um programa de trabalho para eu cumprir – as pessoas que eu deveria encontrar, e o que discutir com cada uma. Ele solicitou que eu fizesse breves anotações, mas quando viu que eu estava escrevendo em russo, disse: “Esta não é uma boa idéia! Hoje em dia, os jovens precisam ser mais cuidadosos, pois há muitos olhos acompanhando cada passo que você dá.”

Quando terminou de falar, ele escreveu duas cartas em russo: uma endereçada ao Professor B., e a outra para Lord Z. Ele pediu-me para corrigir a gramática para que o conteúdo não fosse mal interpretado, e então entregou-me as cartas.

Ele ficou em silêncio por alguns instantes, em seguida disse-me: “Quando Moshê ascendeu ao Alto para receber o segundo conjunto de Tábuas, o Eterno disse a ele: (Shemot 34:1): ‘Entalhe por si mesmo…’ Rashi interpreta isso como ‘O resíduo pertencerá a você.’6 Como todos sabem, os resíduos que sobram após a lapidação de pedras preciosas também são valiosos, e a pessoa pode se tornar rica com eles. Com isso, o Eterno nos ensinou uma lição na vida: se alguém está ocupado fazendo boas ações, deve ser recompensado por isso. Agora você está ocupado com o serviço comunitário, e também merece uma recompensa.”

Então ele começou a explicar-me o que isso significa em termos espirituais. “Quando afirmei que tinha acabado de chegar do Ohel, e que meu pai diz que a situação não é tão grave, percebi que você riu consigo mesmo. Ora, isso não foi porque você não acredita em assuntos espirituais; é porque está tão imerso no mundo material que perdeu toda a percepção dos temas espirituais.”
Seu avô continuou falando comigo por bastante tempo, e contou-me muitas histórias. Ao concluir, ele disse: “Tenha sempre em mente que a recompensa supera a punição. Quanto a Ishmael, que era uma pessoa incivilizada, o Midrash Rabah7 diz: ‘Se você atirar um galho no ar, ele voltará a seu lugar de origem.’ Isso se aplica muito mais a um chassid que é descendente de chassidim! Ele com certeza deve retornar a suas origens.

“Durante quanto tempo uma pessoa pode se afastar? Cinqüenta, ou talvez cinqüenta e cinco anos. Sangue quente e luxúria também tem limite. Lembre-se quem você é, e não se esqueça de onde veio. Que D’us cuide de você e lhe conceda boa sorte. Diga a seu pai que pretendo vê-lo em breve.”

Uma Busca na Estação Denenburg

Quando deixei sua presença, ali permaneci por uma hora e meia até que o trem para Vitebsk e Petersburg partisse da Estação Rudnia. Nesse intervalo, eu teria de viajar num coche de Lubavitch à Estação Rudnia. Cheguei à estação dez minutos mais cedo, o corpo doído pelo balanço da carruagem.

O bilheteiro recusou-se a me vender uma passagem para a viagem completa até Petersburgo. Ele alegou que não havia tempo suficiente para calcular a distância dali até Petersburgo e a tarifa exata para este percurso, além do tempo necessário para emitir o bilhete. Ele não estava habituado a calcular somas tão grandes, e quis vender-me uma passagem somente até Vitebsk. Com certeza o agente em Vitebsk sabia calcular somas maiores, e me venderia um bilhete até Petersburg.

“Daqui em Rudnia” – disse o agente – “ninguém viaja até Petersburgo, exceto o Lubavitcher Rebe. Em casos como esse, eles me notificam com vários dias de antecedência, e preparo a passagem. Quando ele chega, simplesmente preencho a data e carimbo a passagem.”

Chegando a Denenburg, desci do trem e entre no bar da estação para tomar uma xícara de chá. Descobri que a polícia estava inspecionando os documentos dos viajantes, e até revistava a bagagem e os bolsos de alguns deles. Montanhas de papéis estavam empilhadas sobre uma mesa, e diversos funcionários estavam lendo tudo aquilo.

Lembrei-me das palavras de seu avô sobre tomar as precauções necessárias, e comecei a pensar em maneiras de evitar a inspeção, ou pelo menos encontrar um cantinho insuspeito onde eu pudesse rasgar as duas cartas de seu avô, e minhas anotações sobre as atividades das quais ele tinha me incumbido. Porém um momento depois convenci-me de que deveria me comportar como um chassid veterano; fiquei confiante de que ele não me revistaria. Chamei o garçom e pedi-lhe para me trazer um copo de conhaque para colocar no meu chá.

Ainda faltavam duas horas para a partida do trem rumo a Petersburgo. Durante todo aquele tempo eles continuaram revistando os pertences e documentos dos viajantes, incluindo aqueles que estavam sentados às mesas. Os únicos que eles não abordaram foram os numerosos oficiais que usavam uniforme. Embora o policial passasse diversas vezes à minha frente, ele jamais me abordaram. Fiquei convencido de que aquilo deveria ser um milagre.

Quando tomei meu assento no trem, descobri que várias pessoas tinham sido presas; algumas enviadas à prisão Denenburg, ao passo que outras tinham sido meramente detidas para investigação. Ninguém sabia os motivos disso tudo, e nada descobri até chegar em Petersburgo, onde meus amigos já temiam que eu também tivesse sido preso.

Numa reunião secreta, relatei a meus colegas tudo que tinha sido sugerido pelo seu avô, e sua ordem do dia para melhorar a situação econômica de nossos irmãos judeus. Quando falei a eles sobre as duas cartas, e tudo aquilo que ocorrera em Denenburg, ficaram impressionados. As duas cartas ao Prof. B. e a Lord Z. abriram as portas dos altos funcionários do governo para mim. Em três semanas eu tinha completado todo o trabalho com sucesso total e inesperado. Tudo funcionou exatamente como seu avô tinha previsto.

“Durante quanto tempo uma pessoa pode ficar afastada?”
Quando vi meu pai depois de Rosh Hashaná, ele informou que tinha viajado a Lubavitch pouco depois do Shabat, mas o Rebe tinha estado doente quando ele chegou. Meu pai tinha conversado com ele brevemente por diversas vezes, mas a doença piorava dia a dia. Papai planejava retornar no dia seguinte a Yom Kipur para visitá-lo.

As tristes notícias sobre o falecimento de seu avô chegaram a Petersburgo na terça-feira8, dia 4 de setembro, e provocou uma tempestade em todos os segmentos do Judaísmo. Até os judeus não chassídicos e não religiosos lamentaram a perda deste grande homem. Nós, membros dos Jovens Progressistas, fizemos uma reunião onde também lamentamos o falecimento do grande príncipe dos judeus.

Permaneci sob o impacto da grande influência espiritual de seu avô por mais um ano. O comitê central do Partido Progressista foi desmantelado, e um Partido Revolucionário foi fundado em seu lugar. Eu não estava tão envolvido neste partido como estivera no outro. Porém meus sentimentos estavam com eles, e fiz contribuições financeiras conforme minhas posses, e dei um pouco de ajuda pessoal. Pouco a pouco, abandonei novamente o estilo religioso de vida, até que fui completamente assimilado e passei a comportar-me exatamente como um gentio.

Dia 27 de dezembro é meu aniversário; sempre celebro a data com meus amigos e conhecidos, promovendo uma grande festa num dos restaurantes sofisticados de Petersburgo. Porém durante os últimos cinco anos desde que minha mulher faleceu, meu círculo de amigos e minha fortuna cresceram. Decidi, portanto, começar a fazer a festa em um dos hotéis de descanso no exterior, e convidar todos meus amigos para viajarem comigo em busca de diversão.

Este ano escolhi Monte Carlo, depois Nice por alguns dias, e finalmente Paris. Meus amigos concordaram, e visitamos estes lugares. Terminado os festejos, meus amigos voltaram para casa, e eu permaneci em Paris mais alguns dias.

Anteontem, deixei Paris neste trem para voltar a Petersburgo. Ontem, quando estava no carro-restaurante, levantei os olhos e vi seu rosto; isso me lembrou da face de seu avô, exatamente como ele parecia na última vez em que o vi, Lembrei-me das palavras dele: “Se você jogar um galho no ar, ele voltará ao seu lugar de origem.”

Naquele mesmo ano, cheguei aos 55 anos de idade. A noite toda as palavras de seu avô ecoaram na minha mente: “Durante quanto tempo uma pessoa pode ficar afastada? Cinqüenta, ou talvez cinqüenta e cinco anos. Sangue quente e luxúria também tem limites. Lembre-se de quem é, e não se esqueça de onde cresceu.” Fui incapaz de pregar o olho. Hoje jejuei; nem um bocado de comida entrou em minha boca. Lamentei o estilo de vida que tinha levado até hoje.

Y. M. começou a soluçar profusamente, e foi com grande dificuldade que consegui acalmá-lo. Como ele estivera jejuando, e a hora de Maariv já tinha chegado, insisti com ele para que comesse alguma coisa. Mas ele se recusou, e continuou com a história.

O relato de Y. M. durou três horas (com alguns pequenos recessos). Antes de partirmos, ele disse: “Sem dúvida você desejará emprestar-me seu tefilin amanhã também. Quando chegar em casa, arrumarei para mim um par de tefilin no mesmo dia, e mudarei meu modo de ser. Serei um judeu fiel e farei como seu avô me ordenou. Sempre me lembrarei que sou judeu, e estarei consciente de minhas origens.”

Enquanto ele dizia essas palavras, percebi que estava dominado pela emoção.

Separamo-nos como amigos, e sua história continuou a me afetar durante muito tempo depois. Por quase trinta anos, de 5642 a 5672 (1882-1912), a chama Divina das palavras de meu avô tinham ficado ocultas no coração daquele homem, enquanto ele se banqueteava na imundície do prazer e da luxúria. Mas finalmente, Aquele que faz tudo acontecer provocou os eventos que culminaram daquela maneira. Através de um determinado acontecimento, o fogo Divino das palavras de tsadikim que vivem para sempre fizeram a centelha se transformar numa chama ardente, inspirando-o a retornar para D’us de todo o coração.

Como são maravilhosos os caminhos da Divina Providência! O Eterno, bendito seja, ordenou uma cadeia de eventos para apoiar aqueles que caíram, e emprestar uma mão amiga àqueles que se rebelaram, mostrando-lhes o caminho que devem seguir.

Está escrito:9 “O Eterno é justo, portanto Ele guia o perverso ao caminho correto. Comentando o versículo, o Midrash relata: “Por que Ele é bom? Porque Ele é justo. E por que Ele é justo? Porque Ele é bom.”

Quão numerosos são os Teus atos de bondade, ó Senhor! Ontem, ele comeu de um caldeirão de carne não-casher e se regalou com garrafas de vinho idólatra. Mas hoje ele está jejuando, e retornou a D’us. Enquanto atormenta seu corpo, ele reza para que daqui em diante ele mude o rumo de sua existência e viva como um fiel judeu.

Petersburgo, quarta-feira, 12 de Shevat, 5672 (31 de janeiro, 1912):

Às cinco horas, o sr. Y. M. telefonou-me. Eu não estava no quarto naquela hora. Ele deixou um recado para eu retornar o chamado. Liguei duas vezes para ele, mas não estava em casa.

Moscou, quinta-feira 13 de Shevat 5672 (1º de fevereiro, 1912):

Cerca de 5 horas da tarde, cheguei ao Hotel Bolshoi Sibirski, quarto 74. Onte às 9:30 da noite telefonei para o sr. Y. M. Ele ficou contente, e informou que na véspera tinha adquirido tefilin e talit, bem como um sidur, Chumash e Tehilim, que estava firme nos seus planos de mudar seu sistema de vida. Ele desejava continuar a conversa, mas eu disse que teria de viajar para Moscou no trem das onze, e ainda tinha muito a fazer antes disso.

Kissingen (Alemanha), terça-feira 23 de Menachem Av, 5672 (6 de agosto de 1912):

Hoje encontrei o sr. Y. M. pela primeira vez desde o encontro em Petersburgo há 6 meses. Cumprimentam-nos com muita alegria, e combinamos de nos encontrar novamente esta noite ou amanhã cedo.

Kisingen, quinta-feira 25 de Menachem Av, 5672 (8 de agosto, 1912):

Quarta-feira à uma hora o Rebe Stolliner visitou-me, e às quatro visitei Rebe Alexander. Portanto, só hoje pude encontrar o Sr. Y. M. Completei minhas rotinas terapêuticas bem cedo hoje, e das duas da tarde às oito da noite passeamos juntos, enquanto eu ouvia com interesse aquilo que ele tinha para dizer.

A essência de sua história é que quando ele voltou a Petersburgo, foi incapaz de tolerar a companhia dos amigos, e portanto decidiu viajar a Menton por alguns dias. Passou a Festa de Pêssach em Frankfurt, e depois voltou para sua casa em Petersburg por um mês. Os amigos perceberam que deveria ter acontecido alguma reviravolta interior com ele.

Depois, ele se mudou para a casa de veraneio, e então veio aqui para Kissingen, tendo chegado há duas semanas. Daqui ele pretende voltar para casa, e passar Tishrei em Frankfurt ou em Amsterdã.

Moscou, quinta-feira 14 de Tevêt, 5675 (31 de dezembro de 1914):

Hoje, enquanto caminhava pela Rua Nicholski, encontrei o Sr. Y. M. Ele ficou feliz ao ver-me e eu, por minha vez, também fiquei. Ele contou-me tudo sobre si mesmo; seus negócios estavam prosperando, e ele planejava mudar-se para outro país. Ainda não decidira qual país seria,, mas teria de ser um lugar onde pudesse ter uma vida religiosa sem obstáculos.

Rostov sobre o Don, terça-feira 22 de Tamuz, 5678 (2 julho 1918):

Hoje, o Sr. Z. Z. contou-me que tinha acabado de chegar de Petersburgo, onde o gerente do Banco Sibirski o informara que o Sr. Y. M. tinha se estabelecido em Amsterdã. Ele tinha conseguido transferir toda sua fortuna: dinheiro, papéis negociáveis, e certificados em ouro e jóias.

Berlim, quarta-feira 6 de Kislêv, 5688 (30 de novembro, 1927):

Hoje, quando eu estava sentado no saguão do hotel com meu genro Rashag10, um cavalheiro barbudo abordou-me e cumprimentou-me com grande júbilo. Ele ficou surpreso por eu não tê-lo reconhecido, mas mesmo quando olhei mais atentamente, ainda não descobri quem era.
“Não se lembra de quando viajamos juntos de Paris a Petersburgo?” perguntou ele. Naquele instante, toda a cena ocorrida antes voltou à minha mente.

“A única desculpa que posso dar é a mesma que os irmãos de Yossef tiveram por não reconhecê-lo”11, repliquei.“Sim” – disse ele – “mas além da minha barba, todos os outros aspectos de minha vida também estão de acordo com aquilo que o tsadic, seu avô, exigiu de mim.” Ele contou-me tudo que lhe tinha acontecido e como se estabelecera em Amsterdã, onde agora levava um estilo de vida completamente religioso, sem obstáculos.

Nova York, quarta-feira, 17 de MarCheshvan, 5690 (20 novembro, 1929):

Hoje recebi a visita do Sr. C. K. de Amsterdã. Durante nossa conversa, ele informou-me que vários de nossos conhecidos de Petersburgo haviam mudado para lá, e ele falou em termos elogiosos do Sr. Y. M. Descreveu seus atos de caridade e seu apoio financeiro a eruditos de Torá.

Y. M. leva agora uma vida de riqueza e serenidade, numa grande propriedade que adquiriu ali. Também fundou uma sinagoga, onde vários minyonim (quorum de dez) rezam diariamente. Ele próprio comparece aos serviços de prece todas as manhãs, e com freqüência participa de Minchá e Maariv, e fica também para ouvir as lições de Torá estudadas entre Minchá e Maariv e depois de Maariv.

Varsóvia, quinta-feira, 17 de Tevêt (4 de janeiro de 1934):

Hoje fui informado pelo Sr. M. M. que Y. M. de Amsterdã tinha adoecido. Ele vai à sinagoga somente no Shabat, mas sua casa ainda está aberta para os eruditos de Torá visitarem. “Eu jamais teria imaginado que Y. M. pudesse mudar tão radicalmente” – disse M. M. “Lembro-me que em casa ficávamos relutantes até em pronunciar o nome dele por causa de suas atitudes incorretas. Mas agora, pode-se até conferir a ele o título de tsadic.”

Marienbad, quinta-feira 7 de Elul, 5695 (5 de setembro de 1935):

Hoje fui informado que durante o mês passado, Sivan, o Sr. Y. M. faleceu, após uma prolongada enfermidade. Que sua alma seja laçada com o laço da vida eterna.