Nove de Av (Tisha B’Av) marca o dia em que o Primeiro e o Segundo Templos Sagrados em Jerusalém foram destruídos. Como parte do nosso luto pela destruição do Templo e o exílio de Israel, nos abstemos de muitas atividades como comer, beber, tomar banho, relações conjugais, usar sapatos de couro e sentar numa cadeira de altura normal.
Porém, algumas práticas de luto – sentar-se em bancos baixos e não colocar talit ou tefilin – são realmente suspensas à tarde. Por quê?
A Cronologia da Destruição
O Talmud1 descreve assim a destruição:
“No sétimo dia de Av, os pagãos entraram no Templo Sagrado. Comeram e beberam e o profanaram no sétimo e oitavo dias, e no nono dia, ao anoitecer, puseram fogo no Templo, e este continuou a queimar durante o décimo dia até o pôr do sol.”
O Talmud então segue explicando que o motivo do jejum não foi estabelecido para o décimo dia, quando a maior parte da destruição realmente ocorreu, é que o início é o mais doloroso.2 Isso parece gerar a pergunta:
Por que algumas práticas de luto seriam suspensas à tarde, o mesmo tempo em que o Templo Sagrado realmente foi incendiado?
Nem Todas as Práticas são Iguais
Durante os serviços da tarde de Tisha B’Av, adicionamos a prece especial Nachem, na qual pedimos a D'us que nos console. Por que Nachem é postergado?
Alguns apontam para a tradição de que não é adequado consolar um enlutado até que seu ente querido tenha sido sepultado. No mesmo sentido, não pedimos conforto a D'us pela destruição do Templo até a hora do dia em que foi realmente (parcialmente} queimado.3 Isso, no entanto, somente aborda a questão da prece Nachem, mas não os outros aspectos de luto que são diminuídos nesse Período da tarde.
É um Feriado!?
Podemos entender isso examinando algo ainda mais paradoxal sobre o 9 de Av.
Na maioria dos dias do ano, recitamos Tachanun (preces de confissão e súplica). As exceções são o Shabat, ocasiões especialmente festivas e feriados, nos quais omitimos Tachanun. Porém em 9 de Av, o dia mais triste do calendário judaico, omitimos Tachanun!
A explicação dada é que o Livro das Lamentações4 refere-se ao dia da destruição do Templo como um moed, um “tempo designado: ou “feriado”. Mas isso mesmo faz surgir a pergunta: Por que é um feriado?!
O Feliz Tutor
Isso pode ser compreendido examinando outro versículo ainda desconcertante sobre a destruição do Templo.
Lemos em Lamentações: “O Eterno mandou Sua fúria, Ele derramou Sua forte ira, e Ele ateou um fogo em Zion, que consumiu seus alicerces.”5
Ao explicar esse versículo, o Midrash destaca o seguinte versículo no Tehilim, o Livro dos Salmos: “Uma canção de Asaf. Ó D'us! Nações entraram em Tua herança, elas profanaram Teu Templo Sagrado, transformaram Jerusalém em amontoados.”6
O Midrash7 se pergunta por que um versículo que fala da destruição do Templo e Jerusalém é descrito como uma canção. Como pode alguém cantar sobre algo tão doloroso?
Para explicar isso, eles contam uma parábola de um rei que mandou construir uma canópia nupcial para seu filho. Durante esse tempo, o filho saiu e viveu numa maneira inadequada para um príncipe. Num ataque de fúria, o pai rasgou as cortinas e esmagou os apoios da canópia nupcial.
Ao ver isso, o tutor do jovem pegou alguma madeira da estrutura destruída e fez uma flauta, com a qual tocou as músicas mais alegres.
As pessoas ao observar a atitude do tutor lhe perguntaram:
“O rei derrubou a canópia de seu filho e você está sentado tocando música?!”
“Estou tocando música,” respondeu o sábio tutor, “porque ele derrubou a canópia de seu filho e não jogou sua fúria contra o rapaz.”
Então, voltando ao intrigante versículo no Tehilim, diz o Midrash: As pessoas perguntaram a Asaf: “O E terno, bendito seja, destruiu o Templo e você está sentado tocando música?”
E ele lhes respondeu:
“Estou tocando música porque o Eterno, bendito seja, derramou Sua ira sobre as madeiras e as pedras e não derramou Sua ira sobre Israel.”
Assim conclui o Midrash nos fornecendo uma nova visão com a qual lemos no versículo em Lamentações: “Ele acendeu um fogo em Zion que consumiu seus alicerces.”
A Bênção Oculta na Destruição
Junto com a destruição física do Templo e de Jerusalém, milhares de judeus foram mortos.8 Os sábios nos dizem que quando o Templo ficou engolfado em chamas, os judeus viram que D'us tinha desviado Sua ira deles, e em vez disso derramou Sua raiva sobre a “madeira e pedras” de Sua Sagrada casa. Esta é a alegria expressa no Salmo de Asaf.9
Agora que entendemos que a destruição do Templo significou que a nação judaica foi poupada da morte, podemos entender por que
- o aniversário da sua destruição é considerado um feriado e
- por que a hora do dia em que o fogo começou é de certa forma menos triste que o restante do dia.
Mas há também um outro motivo.
O Nascimento do Redentor
Os sábios nos dizem que à tarde, na hora de Minchá, na hora em que o Templo Sagrado estava em chamas nasceu Mashiach, o futuro redentor de nossa Galut, exílio.10
Rabi Yitzchak Luria, o Arizal, explica que como Mashiach, que às vezes é chamado “Menachem” (Consolador), nasceu naquele tempo, recitamos a prece de Nachem: “Consolação,” também nesse horário.11
O tema subjacente é que exatamente nos tempos mais escuros, quando o Templo Sagrado é incendiado, que a chama da luz e da esperança para o povo judeu é acesa. Assim, embora o 9 de Av possa ser o dia mais triste do calendário judaico, também é o dia em que nasce a nossa maior esperança.
Então, a menos que fiquemos abalados em angústia e luto sobre o passado, é exatamente na hora mais escura do dia que levantamos e mudamos nosso foco para o futuro com a prece ardente e a esperança de que D'us finalmente vai nos consolar com a vinda de Mashiach e a reconstrução do Templo Sagrado, assim finalmente cumprindo Sua promessa12 de que esses dias serão transformados em dias de alegria e felicidade. Que seja brevemente em nossos dias!
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