Por Rabino Chaim Steinmetz
Em Chicago, a 16 de maio de 1998, Christopher Sercye, de 15 anos, foi baleado duas vezes no peito enquanto jogava basquete. Seus amigos o levaram até uma rampa a dez metros de distância do pronto-socorro. Os amigos e dois policiais pediram aos funcionários do pronto-socorro para irem até lá e levarem Sercye para dentro. Eles se recusaram, mencionando a política do hospital que os impedia de deixarem o edifício. Enquanto o precioso tempo passava, a polícia saiu para arrastar o rapaz para dentro. Sercye foi dado como morto uma hora depois.
O que é espantoso é que os funcionários do pronto-socorro não violaram nenhuma lei! Na maior parte dos Estados Unidos, não há obrigação de ajudar alguém que esteja em perigo. (Chicago agora cogita de adotar uma lei do "Bom Samaritano", exigindo que os circunstantes forneçam ajuda a vítimas de crimes ou acidentes.)
Na Lei Judaica, há uma obrigação bíblica de salvar vidas. O versículo "Não fique inerte perante o sangue do próximo" (Vayicrá 19:15) é entendido pelo Talmud como sendo uma obrigação de salvar pessoas em perigo (San'hedrin 73a). Entretanto, é necessário definir os parâmetros desta obrigação. O transeunte precisa arriscar-se para salvar a vítima? Deverá gastar dinheiro para salvar a vida da vítima?
O Talmud (Bava Metsia 62a) discute o caso de duas pessoas que estão viajando pelo deserto e apenas uma tem água suficiente para sobreviver. Ben Petura é da opinião que é melhor dividir a água e ambos morrerem, do que um assistir à morte do outro. Rabi Akiva é da opinião que "sua vida tem precedência", que o dono da água deve primeiro salvar a própria vida, mesmo se a outra pessoa morrer. A opinião de Rabi Akiva tornou-se o consenso haláchico. Embora esteja claro que a pessoa não deve sacrificar sua vida para salvar a vida de outro, há alguma discordância sobre se há uma obrigação de salvar vidas quando isso põe em perigo o circunstante. O Hagahot Maimoni (Rotseach 1:14) é da opinião que é obrigatório para o transeunte colocar-se sob risco incerto a fim de salvar a vítima do perigo certo. Outros argumentam que é proibido fazê-lo, e que o princípio de que "sua vida vem primeiro" aplica-se também ao risco incerto (Radvaz em Pitchei Teshuvá Y.D. 157:15). Baseado nesta opinião, algumas autoridades proíbem um doador de doar um rim a um paciente que está morrendo se isso colocar o doador em algum risco (Tsits Eliezer 13:101; Minchat Yitschac 6:103). Rabino Moshe Feinstein tem um ponto de vista intermediário. Não é obrigatório colocar-se em uma situação de perigo duvidoso para salvar a vida de outra pessoa; entretanto, você pode escolher passar por este risco a fim de salvar uma vida. Portanto, ele decreta que é permitido doar rins, mesmo se houver algum perigo ao doador. (Y.D. 2:174)
E quanto ao gasto de dinheiro? O Talmud (San'hedrin 73a) exige que o passante gaste dinheiro a fim de salvar vidas. Se a vítima tiver dinheiro, deve pagar aqueles que a salvaram (Rosh, San'hedrin 8:1). Entretanto, o circunstante tem a obrigação de gastar dinheiro mesmo se a vítima não puder pagar. O Chafets Chaim decreta que o transeunte é obrigado a despender todo seu dinheiro (Ahavat Chessed 2:20). Uma razão que ele fornece é que quando Rabi Akiva declara "sua vida vem em primeiro lugar", isso implica que somente sua vida vem primeiro; seu dinheiro não. Rabi Yossef Shalom Elyashev discorda, e diz que o circunstante não tem que gastar mais que a quinta parte de suas posses para salvar uma vida (Citado em Nishmat Avraham V, C.M. 426:1). Ele interpreta a declaração de Rabi Akiva de forma diferente, e argumenta que as fontes judaicas consideram a perda de riqueza como "morte parcial". Portanto, o doador não deve ser obrigado a empobrecer para salvar a vida de outros.
Christopher Sercye morreu enquanto outros assistiam, porque não havia uma lei obrigando-os a ajudá-lo. Ao contrário da lei americana, a Halachá exige que aqueles presentes empreguem tempo, dinheiro e esforços para salvar alguém que está em perigo, e não permite que ignorem alguém que está a 10 metros de distância.