Porque você deveria enterrar seu ente querido à maneira judaica?
Em circunstâncias normais, os filhos devem respeitar os desejos de seus pais. Os pais dizem vá para a escola, os filhos devem ir à escola. Os pais dizem vá dormir, os filhos devem ir dormir. Os pais dizem coma vegetais, os filhos devem comer os vegetais.
Embora os pais devam ser muito cuidadosos quando e como fazer cumprir sua autoridade (é melhor poucas ordens que são obedecidas do que mais ordens que são ignoradas), e embora muitas crianças maravilhosas tendem a ignorar essa regra com mais frequência do que deveriam (Oi, crianças!), devemos entender por que nossa tradição coloca tanta importância em respeitar os pais. Afinal de contas é um dos Dez Mandamentos, e representa nosso relacionamento com D'us. Alguém que respeita a autoridade de seus pais fará isso mais facilmente com D'us. Alguém que rejeita a autoridade dos pais geralmente terá problemas em aceitar que em última análise, é D'us que governa o mundo.
Há exceções, no entanto, e uma delas inclui ir contra os desejos finais dos pais. Se um pai instrui os filhos que ele ou ela deseja ser cremado, a Lei Judaica – que coloca enorme ênfase em respeitar os desejos dos pais – obriga os filhos a ignorar as ordens e providenciar um enterro judaico tradicional para os pais.
Afinal, para quem são os funerais?
As coisas mudam quando o corpo morre. A alma é libertada. Ela está imediatamente mais próxima de D'us, a verdadeira fonte de conhecimento. É uma pergunta estranha, eu sei, mas uma questão que vai determinar muitas das escolhas feitas por ocasião da morte – e todo nosso entendimento desse ponto crucial de transição espiritual. Se alguém acredita que os funerais são para os vivos, fará tudo o que os vivos quiserem. Enterrar, cremar, deixar o corpo para os abutres, mumificar, colocá-lo num barco rio abaixo, atirá-lo no lixo, colocá-lo debaixo das tábuas do piso, , ou fazer uma das muitas coisas que as sociedades têm feito no decorrer das eras para os corpos dos seus entes queridos. A alma não se importa, e provavelmente não sabe de nada. Está num “lugar melhor,” e aquilo que acontece com “seu” corpo realmente não tem importância.
Mas e se os funerais forem (primeiramente) para os mortos? Considere isso:
Cada um de nós tem uma “parte de D'us,” por assim dizer, dentro de nós. É a neshamá, a alma. É pura, imaculada e totalmente conectada com sua fonte, a fonte de todo o conhecimento – o Próprio D'us. Lá no fundo, quando entramos em contato com nossa alma, acessamos essa fonte de conhecimento. Sentimos o que é verdadeiro, o que é certo e o que é sagrado. Mas não é fácil acessar essa fonte profunda de conhecimento. Nossas almas são mantidas prisioneiras em nossos corpos. O corpo não é um inimigo, é claro, pois permite que ajudemos aos outros e a melhorarmos o mundo. Mas isso limita a alma. Desejos básicos, ego, temores e confusão tornam extremamente difícil para “mim” saber o que realmente está ocorrendo, o que é realmente importante e qual caminho eu deveria seguir.
As coisas mudam quando o corpo morre. A alma é libertada. Fica imediatamente mais perto de D'us, a verdadeira fonte do conhecimento. O “eu” de repente tem acesso muito mais claro a Ele. Mesmo assim, a alma não deixa seu corpo imediatamente. Uma esposa poderia deixar imediatamente seu marido após décadas de união amorosa? A alma permanece por perto, “ascendendo ao alto” lentamente, estágio por estágio.
Imediatamente após a morte, no primeiro estágio de sua subida, a principal preocupação da alma é que “seu” corpo – seu parceiro durante muitas décadas – receba um enterro judaico adequado. A alma grita de dor se seu corpo for tratado desrespeitosamente, e grita num terror inimaginável se seu corpo amado, um vaso sagrado, é colocado ao fogo. Quando o corpo está vivo, o corpo sente dor. Quando o corpo não pode mais sentir dor – i.e., quando morre – a alma sente a dor “física” de seu parceiro num nível altamente espiritual.
É por esse motivo que os filhos não devem considerar o pedido de cremação feito pelos pais. Agora, agora mesmo, os pais sabem muito mais do que sabiam quando estavam vivos. Agora, agora mesmo, as almas dos pais estão literalmente implorando aos filhos por um enterro judaico tradicional. O filho está escutando os desejos dos pais – seus desejos não declarados, não realizados, e verdadeiros.
Equívocos da Cremação
Para algumas situações na vida, certamente é mais adequado buscar o mais barato. Por que não economizar dinheiro, especialmente em tempos difíceis? Mas não para todas as áreas da vida. A questão de o que fazer com o corpo de um ente querido – ou, quando chegar a hora, o próprio corpo – não é teórica. A cremação está se tornando cada vez mais popular e comum no mundo ocidental, e mais de um terço de todos os judeus mortos na América do Norte em 2011 foram cremados. Por que a tendência? Aqui estão alguns exemplos da “sabedoria convencional”… e alguns fatos.1
- A cremação é melhor para o meio ambiente.
Na verdade, não é. A cremação usa um imensa quantidade de combustíveis fosseis, e libera toxinas – incluindo mercúrio – no ar. Esse engano provavelmente é causado por oposição ambiental a embalsamar e a caixões de metal. Por causa do impacto ambiental negativo da cremação e das modernas práticas problemáticas do enterro, os ambientalistas promovem o “enterro verde”, sem embalsamar nem usar caixões de metal. Soa familiar? A tradição judaica proíbe a cremação, caixões de metal e embalsamamento – e nossa tradição é conhecida como sendo amiga do meio ambiente. - Não há terra suficiente para cemitérios.
Na verdade, há. Vivendo em áreas urbanas e pagando aluguéis altos, é compreensível por que sentimos que não há qualquer terra disponível. Mas os números mostram exatamente o contrário. Mesmo se a morte de todo americano fosse seguida por enterro, levaria mais de 10 mil anos para usar apenas 1% do espaço de terra da América! E presumivelmente, poucos cemitérios, se é que alguns, sobreviveriam tanto tempo. Os enterros usam muito pouca terra, e há bastante disponível – geralmente a uma ou duas horas dos centros urbanos. - Ninguém irá visitar o túmulo de qualquer forma, então por que ter um?
Na verdade, embora visitar um túmulo seja importante e bonito, nada tem a ver com a obrigação de enterrar. No final da Torá, o próprio D'us enterra Moshê e esconde para sempre o local (a fim de evitar que se tornasse um lugar de idolatria). Embora ninguém jamais irá visitar seu local de descanso eterno, D'us escolheu o enterro acima da infinidade de opções disponíveis. - A decomposição é nojenta. (Pule este ponto se você é melindroso).
Na verdade, embora a decomposição dificilmente seja uma visão a contemplar, a cremação não parece nada melhor. Apesar dos anúncios, o processo não é rápido nem limpo. Um corpo em media queima no formo por 1,5 a 2 horas, com corpos maiores demorando mais. Durante este processo, o corpo se move para frente e para trás, estala e crepita. O cérebro solta bolhas. Pense na duração de queimar cabelo e carne. Uma vez que o forno (ou câmara ou incinerador) tenha terminado sua horrível tarefa, os restos ainda não são “cinzas”. O que é deixado no forno na verdade são fragmentos secos de ossos. São tirados manualmente e colocados numa máquina onde são moídos (ou seja, pulverizados, cremados ou processados) por cerca de 20 minutos, a fim de colocar os restos numa pequena urna. O principal não é se enterro ou cremação é mais nojento. O ponto é que cremação não é agradável – é um processo barulhento, repulsivo, violento e artificial. Por outro lado, a decomposição é um processo biológico, e a maneira natural de todo ser humano. - Cremação é mais barata.
Na verdade, essa parte da sabedoria convencional às vezes é verdadeira. Quando todos os custos são adicionados, Sheri Richardson Stahl, diretor de uma funerária em Beaufort, explica que “muitas vezes as cremações são tão caras quanto os enterros”. A menos que a “Cremação Direta” seja escolhida. Nesses casos, uma empresa de cremação é contratada online ou por telefone. Pegam o corpo e entregam à família uma pequena caixa de restos cremados. Os custos estão entre mil a dois mil dólares, incluindo o contrato, nenhum enterro será barato, e as cremações diretas estão se tornando mais comuns.
Isso é uma pena. Aqui está o por quê.
Para algumas situações na vida, certamente é adequado escolher o mais barato. Por que não economizar dinheiro, especialmente em tempos difíceis? Mas não para todas as áreas da vida. Por exemplo, eu farei todo o necessário para enviar meus filhos a uma escola decente, em vez de “economizar” e colocá-los em um ambiente ruim. Similarmente, enterro vale o preço extra. Como vimos, enterro é melhor para o meio ambiente. Mas os motivos são muito mais profundos.
A alma precisa do enterro, como descrito acima. A cremação causa enorme sofrimento, mais do que podemos imaginar. Além disso, o corpo merece o enterro. Note que religiões ocidentais geralmente exigem cremação. Isso não surpreende: eles vêem o corpo como um inimigo a ser lutado contra, e espiritualmente consiste em uma separação do físico. Seus lideres são celibatários e ascéticos (pense na imagem do guru no topo da montanha, completamente afastado da vida mundana). Segundo a Torá, porém, o corpo não é o inimigo: eu não poderia fazer caridade sem minhas mãos, falar palavras de prece sem minha boca ou correr para uma boa ação sem minhas pernas.
Embora a alma deva permanecer no controle, o corpo é um parceiro, e merece ser colocado amorosamente no chão, não queimado como lixo.
Finalmente, o judeu deseja o enterro. Não importa quão judaicamente consciente ou ativa uma pessoa foi durante sua vida, escolher um enterro judaico tradicional declara: “Posso não ter sido um judeu perfeito, mas sou orgulhoso. E quero ser enterrado como os judeus têm sido por milhares de anos. Devo isso aos meus ancestrais. Devo isso aos meus descendentes. Devo isso ao meu corpo – e devo isso à minha alma.”
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