Desde muito jovem, eu sabia que desejava ser escritora algum dia. Fosse escrevendo para revistas em quadrinhos, propaganda ou uma maravilhosa obra de ficção, tinha dentro de mim a ideia de que sempre seria levada à escrita. Contudo, jamais pensei que me sentaria um dia para escrever sobre algo tão íntimo.

Obviamente, ninguém está me forcando a escrever, mas à medida que meus dedos voam sobre as teclas, eu sei que estou fazendo isso com um objetivo. Esta é a história da minha primeira experiência no micvê. Escolhi escrever sobre isto para me desafiar como artista, e para desafiar outras como eu – muitas das quais podem ser escritoras – a não terem medo de ser mullheres judias belas e confiantes.

Não sou uma judia observante, não sou casher e dirijo no Shabat. Criada numa família secular, bi-religiosa, jamais pensei duas vezes sobre essas coisas. E apesar disso, no decorrer da infância, faculdade e agora, depois do casamento e filhos, ainda estou procurando algo mais. Jamais senti que D’us desempenhava um papel importante em minha vida, e como sou uma pessoa relativamente feliz, os anos passaram e aquele vazio dentro de mim jamais foi preenchido.

Há alguns meses encontrei minha amiga Sarah e sua família. Ela e o marido são religiosos, mas não foram criados dessa maneira. Escolheram de comum acordo seu estilo de vida, e ao ouvir isto, fiquei logo fascinada pela vida e decisões deles. Minha mãe é judia e lembro-me de minha avó me contando quando eu era pequena que, não importa quem é meu pai, ou com quem eu me casar, sempre serei judia. Com aquilo entranhado nos recessos da minha mente, eu sabia que havia mais no Judaísmo do que aquilo que eu via olhando de fora, e que esta seria a oportunidade perfeita para eu começar. E foi o que eu fiz.

Fui convidada várias vezes para o Shabat na casa de Sarah. Fiz perguntas sobre o Judaísmo e por fim comecei a estudar o texto fundamental de Chabad, o Tanya. Alguns meses depois, descobri que estava grávida do meu segundo filho e algum tempo depois, Sarah perguntou-me se eu gostaria de ir ao micvê. Fiquei completamente petrificada pela ideia, e meu medo cesceu ainda mais depois que passamos algumas horas estudando as leis e atividades relacionadas com os preparativos e a imersão no micvê.

Concordei em passar por todo o processo movida pela curiosidade, e pelo fato de que nas últimas duas gerações as mulheres de minha família não seguiram esta parte importante da Lei Judaica foi o suficiente para me impulsionar. Raciocinei que se nossos ancestrais lutaram muito tempo com firmeza (na verdade, nós – os descendentes – ainda estamos lutando) para poder realizar este profundo ritual espiritual, por que eu não deveria ao menos tentar?

A essa altura, eu estava empolgada pelo meu recém-adquirido conhecimento do papel da mulher judia e estava honrada por receber este presente. Para mim, era apenas o começo de alguma jornada desconhecida que esperara quase trinta anos para começar. Antes tarde do que nunca.

Foram sete dias me preparando para a noite do micvê, mas tudo correu conforme o planejado. Finalmente, chegou a noite (era um sábado), e após o Shabat, fiz todos os preparativos e tomei uma ducha para a imersão baseada nas incansáveis informações de Sarah e muitos telefonemas de última hora. Eu estava um feixe de nervos, queria ter certeza de que minhas unhas estavam curtas e que não havia qualquer sujeira sob elas. Após muita preparação detalhada, liguei para Sarah para dizer que eu iria passar para apanhá-la. Seríamos apenas nós duas no micvê aquela noite.

No trajeto, contei a ela que estava me sentindo um tanto nervosa. Ela também estava, pois era a primeira vez que seria atendente de micvê para alguém.

O local era lindo. Tudo novo, azulejado e limpo. A sala de preparação estava imaculada e havia toalhas e robes felpudos para usar, além de chinelos para que os pés não se sujassem no caminho do chuveiro para o micvê. Havia uma banheira de hidromassagem e um chuveiro na sala. Havia uma pia, e todos os itens de toilete que você pudesse imaginar. Fiquei impressionada. Durante uma fracão de segundo, imaginei que eu era uma rainha, porque tudo aquilo me lembrava um lugar real onde você poderia ver a realeza sendo mimada. Muito apropriado para as muitas mulheres, todas filhas do Rei, que fazem a mesma viagem dia após dia e noite após noite.

Chegou a hora. Virei-me e deixei o robe cair até o meio das minhas costas, para que Sarah pudesse ver se eu tinha algum fio de cabelo caído sobre o corpo. Ela então segurou o robe para que eu pudesse descer as escadas até o micvê enquanto Sarah continuava a segurar o robe para não comprometer minha privacidade. Entrei.

Estava quente e gostoso, uma mudança bem-vinda ao ar frio e meus arrepios no topo das escadas.

Deixei meu corpo ir ao fundo e a água fluir sobre tudo que eu tinha, até minha alma. Eu não queria deixar o calor do micvê, mas sabia que Sarah estava esperando ali em cima. Subi para respirar e ela disse-me que era um bom mergulho. Era “casher”.

Então ela recitou a prece e repeti depois dela. Eu tinha uma sensação morna dentro de mim; era a nutrição que minha alma, minha mente e meu corpo tinham esperado. Eu sabia mais e entendia mais. Eu tinha preparado, assim como meus ancestrais há séculos. Era real. Mais dois mergulhos casher e eu tinha terminado. Não podia acreditar que tinha chegado ao fim.

De certa forma eu estava aliviada, e em outras maneiras, triste por ter de deixar a segurança do micvê. Eu estava tão feliz por ter escolhido Sarah para partilhar a experiência comigo. Ela segurou o robe para mim enquanto eu subia as escadas.

Enquanto eu me vestia, Sarah ficou sentada na área de espera lendo um dos livros sobre micvê. A porta estava aberta e ficamos tagarelando. Ela abriu o livro numa página na qual várias mulheres falavam sobre sua primeira experiência no micvê.

A história que ela leu era tão semelhante à minha que chegava a ser sobrenatural. Descobri que esses tipos de coisas acontecem sempre que estou com Sarah e sua família, como se alguém estivesse tentando me dizer que estou no caminho certo e para continuar assim.

Entramos no carro, eu úmida e com frio. A caminho de casa, conversamos um pouco sobre nossa experiência em conjunto e àquela altura, eu estava tão dominada por emoções diferentes que tudo que conseguia dizer era obrigada.

Quando chegamos ao apartamento dela, Sarah correu para dentro e pediu-me para esperar. Quando voltou deu-me um CD com melodias sagradas para escutar a caminho de casa, e aceitei com alegria. Despedimo-nos e saí do seu complexo de apartamentos. Estava frio, mas meu rosto ainda conservava o calor do micvê.

A caminho de casa, o processo começou. Coloquei o CD e quando entrei na estrada, comecei a chorar. Poderiam ter sido os hormônios, o estresse da situação, ou qualquer coisa. Porém aquela música despertou algo dentro de mim e transformou tudo que eu fizera naqueles meses em algo tangível para minha alma se apegar.

Creio que as lágrimas no carro naquela noite foram por muitas coisas. Para as mulheres judias que não podiam ir ao micvê devido a perseguições religiosas; para as pessoas que não entendem a beleza de ser mulher; e pela minha família com quem eu não poderia partilhar minha experiência, nem física nem verbalmente.

Estou definitivamente na minha jornada de explorar o Judaísmo. Não estou certa aonde isso me levará a essa altura, porém, aprendi uma lição importante com o micvê. Vá com a corrente e deixe a água levar você. Então, aqui estou eu, ainda uma mulher, escritora, esposa, mãe e judia – com o evento abençoado – se D’us quiser – do nascimento de meu segundo filho se aproximando rapidamente.

Sei que estou longe de onde queria estar e de onde preciso estar, e não sei quando, ou se jamais chegarei lá. Porém, minha experiência no micvê permitiu-me fazer muitas coisas nesta jornada espiritual de cabeça para baixo, sendo que o mais importante é que ajudou-me a finalmente permitir D’us na minha vida, meu casamento e no meu lar.

Tendo aceitado esse desafio, sinto que me tornei uma pessoa mais forte, e uma judia mais consciente. Pela primeira vez, sinto que algo significativo foi acrescentado àquele eterno vazio com o qual eu lutava há tanto tempo. Pelo menos agora eu sei que era o Judaísmo que estava faltando todo esse tempo. Agora cabe a mim reconhecê-lo, abraçá-lo e colocá-lo em prática. Há muito a ser feito e muito mais a ser descoberto, mas dessa vez, para não patinar pelo desconhecido, deixarei que a água seja o meu guia.