por Kolel Rio

O principal tikun (conserto) da nação judacia durante os dias da contagem do ômer, relaciona-se ao assunto do aprimoramento dos bons princípios e do bom comportamento entre o homem e seu próximo. Assim sendo é bom destacar o estudo e as leis referentes à proibição de Lashon Hará (maledicência).  
  A definição de Lashon Hará é qualquer comentário negativo sobre alguma pessoa, ou um comentário que possa causar qualquer tipo de dano ao próximo. Se a pessoa faz um comentário negativo sobre seu próximo, incorre na transgressão de Lashon Hará, mesmo que lhe esteja claro que isto não causará dano a este sobre quem falou, pois o simples fato de abordar alguma deficiência de seu próximo já representa a transgressão de uma proibição. Contar algo sobre alguém, que possa causar-lhe dano, seja financeiro, corporal, emocional ou de qualquer espécie, traduz-se em Lashon Hará, mesmo que o conteúdo do comentário não tenha sido negativo. 

Preservar o Bom Conceito

É proibido contar sobre alguém que tenha transgredido algum preceito da Torá ou dos Sábios, mesmo que tenha sido um siag ("cerca") que os sábios instituíram, ou um costume tradicional consagrado. Tais transgressões são encaradas como ações negativas pela Torá, portanto, contar sobre tais ações equivale a denegrir a imagem desse alguém. Por isso, é proibido contar sobre um acontecimento, por meio do qual se revela que fulano não cumpriu ou transgrediu uma halachá, mesmo que se trate de uma halachá que a maioria das pessoas não cuida. Por exemplo, contar que a pessoa conversa durante a Tefilá ou leitura da Torá é considerado Lashon Hará.


              Telhado de ‘Vidro’

É proibido dizer que determinada pessoa é pouco cuidadosa no cumprimento de determinadas mitsvot. Assim, é proibido comentar que alguém dedica pouco tempo para o estudo da Torá, ou que não se esforça para fazer o bem ou ajudar o próximo, mesmo quando os próprios interlocutores (o que fala e o que escuta o comentário) admitem abertamente que tampouco eles mesmos são cuidadosos e/ou esforçados nestes âmbitos. Como o Judaísmo eleva o estudo da Torá e a Guemilut Chassadim (beneficência) ao topo da escala de nossas prioridades comportamentais, é terminantemente proibido revelar que alguém é desleixado com relação a estes assuntos.  

Ser discreto e não rotular

Lashon Hará (maledicência) quando são ditos com relação a uma pessoa, enquanto que podem ser considerados até mesmo um elogio, quando ditos em relação à outra pessoa. Por exemplo, quando se diz sobre um homem de negócios que ele estuda 5 horas de Torá por dia, certamente este é um elogio; por outro lado, se o mesmo comentário é feito com relação a um avrech (estudante) de um colel, que deve se esforçar para dedicar todas as horas do seu dia ao estudo da Torá, isso se torna um comentário negativo. Da mesma forma, é proibido comentar sobre a quantia de dinheiro que uma pessoa doa para a tsedacá (caridade), se esta quantia é considerada razoável como doação apenas no âmbito de pessoas que têm dificuldades financeiras.

Um exemplo frequente de comentário objetivo sobre alguém, cujo conteúdo é negativo, é dizer que tal pessoa possui más qualidades. Portanto, é proibido dizer que alguém é irascível, ou que gosta de discutir, ou que é avarento, ou orgulhoso, etc.

Proibição de rotular, qualificar

É proibido dizer algo, cujo significado ou essência propriamente ditos não sejam considerados negativos, quando se sabe que esse comentário será encarado ou interpretado como negativo pelo falante ou pelo ouvinte. Por exemplo, comentar sobre a aparência e as vestes de uma pessoa. Embora seja possível que não haja nada de errado com as vestimentas da pessoa sobre quem se fala, mesmo assim, é proibido comentar sobre como ela está vestida, se o falante ou o ouvinte não encaram com bons olhos pessoas que se vestem daquela maneira.

 Parece, a princípio, que não há nada de errado em se comentar sobre gostos pessoais. Quando uma pessoa diz: "não gosto de vinho seco", isto representa a manifestação de uma de suas preferências, e não há nisto uma crítica à qualidade do vinho. De acordo com este raciocínio, pareceria permitido comentar que não se aprecia o estilo de um determinado palestrante ou professor. No entanto, na prática, de modo geral, é proibido tecer tal tipo de comentário, pois ele traz a conotação de que tal palestrante ou professor não é qualificado.  

Proibição de falar mal de si próprio

No caso em que aquele que fala Lashon Hará inclui a si mesmo no comentário, e argumenta que também ele participou do acontecimento, ou que ele também apresenta tal característica negativa, mesmo assim, tal comentário continua sendo considerado Lashon Hará, portanto, segue sendo proibido. Aprendemos isso da severidade do Todo-Poderoso com o profeta Yeshaiahu (Isaias), por seu comentário: "Pois sou um homem de lábios impuros e no meio de um povo de lábios impuros eu sento". Além disso, é proibido fazer Lashon Hará mesmo quando o falante não tem más intenções ou não pretende causar qualquer dano à pessoa de quem fala.

O Livre arbítrio e a veracidade

É proibido falar mal sobre qualquer pessoa, mesmo quando está claro e evidente que esta não se incomoda com o comentário, pois, como foi dito anteriormente, o simples fato de se falar algo negativo sobre o próximo traduz-se na proibição de Lashon Hará propriamente dita, não havendo relação com os sentimentos da pessoa sobre quem se fala. Fazer Lashon Hará representa atingir o oposto extremo em relação ao elevado nível do ser humano como a única criatura dotada de imagem e semelhança do Criador, e este fator não está sujeito a prazos de duração, modismos ou adaptações pelo fato do ser humano ter a possibilidade (por seu livre arbítrio) de tecer comentários negativos.

         • Comentários negativos são considerados Lashon Hará mesmo quando estes são do conhecimento geral. É proibido reproduzir comentários negativos que foram publicados na imprensa ou mídia, sobre qualquer judeu. Muitas vezes, os jornais divulgam algo negativo com base em rumores, sendo proibido até mesmo acreditar nestas alegações, se o jornal, ou outro meio de comunicação for a única fonte. Mesmo depois de se comprovar a veracidade da notícia, é proibido reproduzi-la. 

Segulá: Estudar as leis de lashon hará

A partir do momento em que um comentário se enquadra na definição de Lashon Hará (maledicência), passa a ser proibido reproduzi-lo a qualquer pessoa. É proibido contar a um amigo Lashon Hará que se ouviu ou se viu, mas também a um familiar, inclusive à esposa. No entanto, deve-se enfatizar que contar Lashon Hará ao cônjuge não tem o mesmo rigor de se contar a outras pessoas. Não é apropriado e não é bom se ater às falhas do nosso próximo. Nesta ocasião, vale a pena divulgar a "segulá" ("simpatia" ou bom costume) que recomendou a Rabanit Kanievsky z"l: que todo casal estude duas halachot de Shemirat Halashon (cuidados com a fala) por dia. Isso trará muita bênção aos seus lares, e tais casais terão o mérito de testemunhar um milagre revelado, neste contexto, caso necessitem.

Intenção/Ação

Todo judeu é ordenado pela Torá a tomar muito cuidado com sua fala para não fazer comentários que possam ser interpretados como negativos. Um exemplo de comentário ambíguo, que é proibido fazer, é: “fulano teve boa intenção”, pois pode ser entendido como “ele teve boa intenção, mas não se destaca em inteligência, por isso não obtém sucesso no que intenta”, ou “suas intenções são boas, mas suas ações são ruins”. Se uma pessoa tem de fato a finalidade de simplesmente dizer que as intenções de alguém são boas, e essa pessoa é bondosa e correta, deve manifestar isso de forma clara, e não dizer frases que possam ser entendidas de diferentes maneiras, fornecendo sentido âmbiguo ou dúbio.

Não envergonhar, nem constranger, nem falar do passado

O que uma pessoa diz sobre seu próximo pode chegar aos seus ouvidos, e até mesmo ser dito na sua presença. Portanto, é proibido fazer qualquer comentário sobre o próximo que possa envergonhá-lo ou causar-lhe sofrimento, caso seja feito na sua frente, mesmo que não haja nada aparentemente negativo neste comentário. 

Tratar do passado de uma pessoa, mesmo após passado muitos anos desde que esta pessoa fez teshuvá completa (arrependimento e conserto), é proibido pois pode lhe causar mal estar, constrangimento ou vergonha ou ser alguém sensível a esse assunto.

deve-se tomar cuidado para não envergonhá-la ao se falar sobre o seu passado, se isso for feito na frente de mais pessoas ou em público.
   Ao buscar informações

É proibido contar qualquer coisa sobre alguém que, ao ser divulgado, possa causar dano a este alguém em assuntos como sustento, shiduch (encontrar o cônjuge) ou qualquer outro assunto, mesmo que o conteúdo do comentário não algo negativo. Esse tipo de Lashon Hará é muito comum quando as pessoas são requisitadas a fornecer informações para um shiduch ou oferta de emprego e todo tipo de perguntas são feitas sobre os candidatos. É proibido comentar sobre os defeitos físicos da pessoa em questão, ou sobre suas limitações intelectuais, mesmo que o falante e o ouvinte não vejam nisso qualquer mal. Divulgar esse tipo de informações pode causar à pessoa sobre quem se fala perdas e danos.

Em encontros sociais e públicos

No caso em que uma determinada pessoa está reunida com várias outras pessoas em um encontro social, em uma conversa descontraída e ingênua, e, de repente, alguns dos presentes começam a fazer Lashon Hará – sendo que a pessoa citada tem total noção da gravidade em se transgredir a proibição de fazer maledicência –, ela tem a obrigação de tentar evitar que a conversa siga abordando tais temas pejorativos.

Se, por qualquer motivo, ela não puder abandonar o local, deve fechar seus ouvidos para não escutar tais conteúdos proibidos de forma alguma. Se isso também for impossível, ficará no local, mas, em seu coração, pensará e lembrará das advertência da Torá e dos dizeres dos Sábios, que nos alertaram quanto à gravidade da transgressão da proibição de Lashon Hará. Em especial, a pessoa deve cuidar para não considerar como verdadeiras, de forma alguma, as informações negativas transmitidas. É também seu dever tomar cuidado para não parecer, perante as demais pessoas, como parte dos que tecem tais comentários, como alguém que costuma fazer Lashon Hará ou rechilut (fofoca ou intriga), ou mesmo como conivente de tais procedimentos. Portanto, a pessoa deve demonstrar a todos, de maneira clara e evidente, que não concorda com os comentários citados e que sua consciência não está tranquila com relação aos mesmos. Se ela não pode ou não consegue, por qualquer motivo fazer com que as pessoas parem de falar Lashon Hará, mudem o assunto ou foco da conversa, ela terá a obrigação haláchica e moral de deixar este grupo imediatamente e, talvez, até mesmo ir embora do encontro.