-“Devolva minha boneca!"
- Não.
"É minha, é minha!"
Eu agarrei a boneca e a arranhei. Ela me empurrou "Pare de chorar! Eu vou contar até três"e fugiu rindo.
Eu me aposentei, machucada, sob a mesa de fórmica com tampo vermelho na nossa sala de café da manhã. Mamãe estava assando suas receitas semanal: cupcakes, biscoitos, pão de gengibre, mas mesmo aquele delicioso aroma não poderia aplacar meu orgulho ferido.
"Pare de chorar! Vou contar até três."
Eu conhecia aquela voz absurda, e assim reduzi meus soluços a uma suspiro e comecei a fungar. Mas eu prometi a mim mesmo: “quando eu crescer, vou deixar meus filhos chorarem o quanto precisarem..”
O choro e a dor de outras pessoas… Você já observou como nós frequentemente reagimos a essa situação? Olhe só o que falamos para consolá-las: “Não aja como um bebê chorão; recomponha-se; não resolverá nada chorar sobre o leite derramado; coloque um sorriso em seu rosto; siga em frente. Oferecemos uma xícara de chá ou um doce saboroso para secar as lágrimas de outras pessoas, como se isso pudesse ajudar.
Fugimos da tristeza profunda; após a shivá (os sete dias de luto por um parente próximo que faleceu), poucas pessoas vêm para ver como a pessoa recentemente enlutada está gerenciando sua vida, agora que ela tem que voltar para a vida real. E quantos visitantes você vê ao redor da cama ou na casa de uma mãe que acaba de dar à luz um recém-nascido com síndrome de Down?
Muitos de nós não reagimos bem diante da dor - seja física, emocional, nos outros, ou em nós mesmos. É justo que haja quase um tabu contra expressar a miséria em público? Será que aqueles que estão sentindo um peso pela tristeza têm a obrigação de esconder esse fato e sentem-se culpados e ainda mais tristes se falharem? Temos razão ao insistir em cotas de aceitabilidade para a miséria: dois minutos para o joelho esfolado de uma criança, uma semana ou duas sobre um emprego perdido, alguns meses talvez para um ente querido falecido?
Não importa o quão restritos e bem disciplinados que sejamos, a dor de longa data às vezes pode nos pegar desprevenidos. Em seguida, nossos dutos lacrimais vão derramar como lava quente que explode de uma cratera. Às vezes, uma dor desconhecida nos atinge entre os olhos. Às vezes, sem uma lágrima sendo derramada, a nossa dor pode preencher o nosso entorno com um peso palpável e um silêncio audível. Se observarmos tal dor em outros, sentiremos vontade de nos afastar, ou talvez ofereceremos um pedaço de chocolate colocado em local estratégico (coisas doces ajudam a melhorar, não?).
São inúmeras as cenas de grandes rabinos que, quando compartilham histórias trágicas, choram com as vítimas e se juntam a elas com declarações como "isso é uma tragédia." Uma expressão de dor nem sempre conserta a situação. É mais um desabafo – uma resposta ao fato de que um valor, uma expectativa foi violada, a de que "brinquedos novos não devem quebrar" e "as pessoas não devem se comportar daquela maneira". Sentam-se em silêncio ao lado daquele que está sofrendo; unem-se em sua dor como um; "Eu sinto muito pelo o que aconteceu com você"; e deixam ao seu alcance lenços de papel para suas lágrimas. Apenas esteja lá.
Muito cedo numa certa manhã, fui chamada para fazer shmirá para uma amiga querida ("guardar", quando ficamos junto ao corpo de uma pessoa falecida “guardando” seu corpo para não deixá-lo só) até que a chevra kadisha (entidade responsável por enterros judaicos) chegasse. Lá fora, tudo estava em silêncio. Corri rapidamente para aliviar outra amiga, Sara, que ficara com o corpo desde o momento que ela falecera. Sara estava me esperando fora da casa.
- Já a levaram. Eu estava com ela a noite toda. Estava lá quando aconteceu. "
Eu segurava Sara muito perto, e choramos juntas. Quando ela estava pronta, eu a levei até sua casa e fiquei até que ela pudesse decidir o que fazer em seguida.
Numa outra situação, eu estava esperando fora do escritório de um ginecologista no final da tarde. Era só eu e outra senhora que parecia muito perto de dar à luz, sentada em cadeiras duras em um corredor branco estéril voltado para uma porta fechada. Ouvi a conversa que ela estava tendo ao celular. Soou como se o feto que ela estava carregando não tivesse ido a termo, e ela estava esperando para ouvir o que ela deveria fazer em seguida. Quando ela desligou o celular, sentei-me ao lado dela, oferecendo-lhe um lenço de papel. Não havia nada que eu pudesse dizer, mas eu poderia tentar mostrar que ela não estava sozinha, que alguém se importava.
Frequentemente, as pessoas reagem a expressões de dor e tristeza tentando consertá-las. Elas estão fora da dor e tentam mostrar como é inútil reagir miseravelmente. Podem fornecer boas razões pelas quais a causa da dor não é tão ruim. "Isso irá ajudá-la a lidar com qualquer coisa que você terá que enfrentar."
Em Ética dos Pais (capítulo 4:23), está escrito: "Não tente consolar o enlutado quando seu morto estiver diante dele". Comentaristas escrevem que o enlutado não será consolado. Na verdade, você irá lhe causará mais dano, porque ele vai sentir que você não entende sua dor, e se sentirá ainda mais infeliz. O Midrash Shmuel explica que tudo que o enlutado deseja nesse momento é que seus amigos estejam tristes com ele. Na verdade, há um costume de não ir a uma casa de shivá nos primeiros dias após o enterro, a menos que você seja muito próximo do enlutado, pois a dor é muito recente para aceitar o conforto de visitantes.
A maioria das pessoas que tiveram uma dor de dente se viram irresistivelmente colocando a língua explorando a área dolorida, causando mais dor repetidas vezes. Pessoas em sua dor tendem a fazer a mesma coisa; repetem sua história repetidas vezes, apesar de causar-lhes dor. É muito tentador atravessar a estrada quando se avista “oh, sou eu” à distância”. Muitas vezes estamos envergonhados e entediados por tais encontros, e nós realmente não temos tempo a perder. A verdade é que contar e recontar pode ajudar a pessoa em sua dor; cada avanço de aceitação e cuidado é um bálsamo para almas em sofrimento.
Você não precisa ser uma terapeuta para sentar-se em silêncio ao lado de uma pessoa em sua dor; apenas esteja lá. Nem precisa ser uma amiga de longa data para realmente expressar seu apoio e pesar por outro ser humano que esteja passando por uma experiência dolorosa.
A capacidade de sentir dor mostra que estamos vivos, mas dói. Frequentemente, essa dor não pode ser consertada. Entretanto, saber que tem alguém ao seu lado como um bom ouvinte para poder desabafar ajuda a pessoa a passar por mais um dia, e outro até que, com a ajuda do Todo-Poderoso, a vida torna-se suportável novamente.
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