Pergunta:
Minha noiva e eu estamos cuidando de ketubot (contratos de casamento) para nosso casamento, que será em breve. Não sei ler aramaico, mas entendo que a tradicional ketubá judaica é sobre as obrigações do marido com sua esposa, mas não há nada ali sobre as obrigações da mulher. Por que o casamento judaico é tão unilateral?
Resposta:
Em primeiro lugar, mazal tov pelo seu noivado! Que o casamento crie um vínculo eterno e traga somente bênçãos, paz e harmonia ao mundo.
Sobre a ketubá: deixe-me explicar o que é e para que foi criada - e você entenderá o motivo para essa parcialidade. Não posso deixar de fornecer algumas dicas que podem ajudar em seu casamento que está chegando.
Como qualquer antropólogo poderá lhe dizer - e qualquer conselheiro matrimonial, além de sua avó também - homens e mulheres não entram num casamento da mesma maneira. Você não precisa de um diploma de biologia para dizer por que o comprometimento do homem com o casamento não tem o mesmo peso que o da mulher. Assim, pense na propaganda do jovem em má forma física colocando carinhosamente as mãos sobre seu abdômen inchado de cerveja com a legenda - “se eu fosse você, você seria mais cuidadoso.”
Uma mulher tem de ser mais cuidadosa. Onde o homem coloca uma ficha, ela coloca vinte. Ele tem tudo a ganhar; ela tem tudo a perder. Portanto, naturalmente, uma mulher entra no casamento buscando segurança e estabilidade para construir um lar e uma família - não para ser deixada de fora com aquela barriga inchada. Um homem entra num casamento como um conquistador assumindo território. Uma vez casado, não demora muito e ele já está procurando novo território para conquistar - no trabalho, no mundo e talvez também em outros locais…
Então, o que prende o homem para fornecer aquela segurança para a mulher? Que tal amor, paixão e toda a loucura que o Criador colocou dentro de nós para juntar homem e mulher? Não é amor tudo de que precisamos?
Há quinhentos anos, o mestre cabalista Rabi Moshê Cordovero escreveu palavras1 sobre paixão humana que ainda parecem estar anos-luz à nossa frente. A paixão de um homem por uma mulher, escreveu ele, não parte realmente da sua masculinidade. É um pedaço de mulher deixado para trás no homem quando eles foram divididos no Jardim do Éden. É por isso que, se ele usar aquela paixão para se gratificar, ela se virará contra ele e o destruirá. É quando chamamos de yetser hará - o mau impulso.
Mas, ele continua, nada que D'us criou é mau, exceto por intermédio dos atos do homem. Até o yetser hará, quando dirigido rumo ao seu verdadeiro objetivo, vai elevar a pessoa e seu mundo. E qual é o verdadeiro propósito dessas paixões? Levar o homem a embelezar a Shechiná (Divina Presença) e fazer para ela uma morada nesse mundo. Em outras palavras, se por causa dessa paixão ele construirá um lar para sua mulher, lhe dará afeição e lhe comprará joias - e se ele fizer tudo isso com a intenção de que ela representa a Shechiná, pois ela é a mãe da vida - então ele sublima suas paixões para se tornar semelhante a D'us.
“Portanto,” ele escreveu, “todos os prazeres que um homem recebe neste mundo deveriam ser apenas em prol de sua esposa.” Eis como as coisas deveriam ser: o amor junta o homem e a mulher. O casamento provê a segurança de que a mulher precisa. E o amor continua levando cada um a prover aquilo de que o outro necessita.
Mas isso tudo é quando as paixões são domadas e direcionadas. Quando uma mulher se rende incondicionalmente à paixão do homem, ela não ganha nada em troca. Não está fazendo a ele nenhum favor - ele está queimando um monte de borracha na estrada da vida, mas não está indo a lugar nenhum.
Sim, ouvimos incontáveis vezes que homem e mulher são duas metades de um todo que somente fica completo quando se juntam na união mística e sagrada do casamento. Mas essa não é uma receita de Duncan Hines. É algo que acontece quando ambos se esforçam para esquecer o próprio pequeno ego e descobrem o “outro” em seu relacionamento. Se deixados aos seus instintos básicos, ensinam nossos sábios, um homem e uma mulher são dois fogos no carvão, e opostos que queimarão um ao outro até virar cinzas.
Pense na linha do Gênesis que descreve a primeira mulher como “uma parceira contra ele”. Literalmente, isso significa que ela é uma parceira igual. Mas a estranha expressão levou nossos sábios a fornecer uma leitura mais profunda: “Se ele merecer, ela é uma parceira. Caso contrário, ela está contra ele para fazer guerra.” Então você tem: para o casamento ser sobre fazer amor, não guerra, os seres humanos precisam se elevar acima da natureza. Quando ao estado natural, instintivo da humanidade no mundo - ali o amor, guerram e uma vasta gama de patologias nadam juntas num único pântano malcheiroso. Como algo tão bonito como o amor pode destruir? O mestre chassídico Rabi Shneur Zalman de Liadi explicou2 que é porque o amor de um homem por uma mulher e o amor de uma mulher por um homem são dois opostos. O amor de um homem, ele disse, flui como a água, ao passo que o amor de uma mulher queima como o fogo.
Seu filho, Rabi DovBer, explicou:3 a paixão de um homem aumenta como água por trás de uma represa, desesperada para passar, e finalmente irrompe numa grande enchente. Mas depois que a enchente termina, a paixão se dissipa - até que o reservatório por trás da represa possa se encher novamente. As paixões de uma mulher seguem um padrão oposto. São como um fogo que deve ser aceso com pedaços de madeira, cuidado e abanado até ficar quente o bastante para pegar as toras de madeira, e somente então arde sozinho. Depois que o fogo sai dos seus limites, arde e arde, e nunca pode ser satisfeito - até que nada reste para ser queimado.
Dois opostos, totalmente fora de sincronia. A única solução, diz Rabi Shneur Zalman, é que os dois encontrem um vínculo mais profundo, algo além deles dois. Cada um deixa seu próprio minúsculo ser, e sente o que é ser como o outro. Então a mulher entende por que esse homem que tão apaixonadamente precisava dela ontem agora parece estar em outro mundo no qual ela mal existe. O balão estourou e precisa de tempo para se reencher.
E um homem entende que as paixões de uma mulher não podem ser acesas como uma lâmpada elétrica, pois são mais como uma fogueira que precisa de atenção para começar, e ainda mais cuidado quando as chamas começam a subir, e até um cuidado maior para não abandonar os carvões brilhantes.
Enquanto você está procurando aquele vínculo mais profundo, voltemos à ketubá. É um passo que os sábios deram para lidar com esse desequilíbrio e introduzir alguma paridade no relacionamento.
Como dissemos, a mulher quer segurança - por bons motivos. Aqui está algo que ainda não mencionei: um estudo feito pela Iniciativa da Paternidade Nacional4 encontrou uma forte correlação entre um relacionamento próximo com o pai e a violência adolescente. Outro estudo5 descobriu que a proximidade com o pai é um fator importante para reduzir o risco de abuso de drogas pelo adolescente - enquanto a proximidade com a mãe não tem qualquer impacto relacionado. Não é surpresa que a proximidade com o pai foi mais elevada em “famílias intactas”.
Portanto, mesmo se você é autossuficiente, se quer filhos saudáveis e bem ajustados, é melhor que haja um pai dedicado por perto.
Embora muitos homens sejam colocados como provedores, protetores e papais, não são necessariamente programados para fazer esse papel pela vida toda. À certa altura, o macho conquistador poderia apenas dizer: “Hora de cair fora desta gaiola e continuar com a vida.”
Aí entra a ketubá, um contrato de casamento que basicamente diz: “Aqui estão suas obrigações para com sua esposa enquanto você está casado, e aqui a penalidade que terá de pagar se quiser cair fora.” Quais são essas obrigações? Prover alimento, roupa, afeição e um lar, e cumprir todas as expectativas de um marido padrão, aquilo que a sociedade espera que você cumpra. Qual é a penalidade para o divórcio? Aquilo que a maioria dos homens vai sentir mais falta: muito dinheiro.
Veja, está longe de estar a salvo de falhas. Ainda exige muito trabalho, comprometimento e sacrifício por parte de cada membro dessa parceria. Portanto, pode chamar de uma peça do quebra-cabeças. Para nossos propósitos aqui, porém o importante é:
É por isso que a ketubá é desequilibrada: porque está ali para proteger as mulheres, não os homens. Em resumo, os sábios viram que as mulheres recebem o lado curto do bastão e entraram para fazer algo a respeito. Para meu conhecimento, as coisas não mudaram.6
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