O mais surpreendente é a rapidez com que tudo aconteceu. Em questão de minutos, centenas de milhões de lâmpadas, aparelhos de ar condicionado, fornos de microondas, computadores, geladeiras, sistemas de telefonia, luzes do tráfego, caixas registradoras, metrôs e secadoras morreram. Pararam. Cessaram. Assim.

Na verdade, não foi preciso muito para isso ocorrer. Porque nada aconteceu. Em vez disso, parou de acontecer. O fluxo de eletricidade, da qual a vida moderna se tornou tão dependente, parou de correr. O delicado equilíbrio de fluxo e refluxo que permite a transmissão da energia elétrica de um ponto geográfico a outro foi rompido, e milhares de cidades ficaram às escuras, uma a uma.

Luminosidade, movimento e pensamento artificial não vêm naturalmente com a lâmpada, trens do metrô e computador. Essencialmente, estes são apenas peças modeladas e montadas de plástico, metal e vidro. Ocorre que foram tão engenhosamente projetadas e construídas de uma maneira que uma corrente de eletricidade passando através delas as faz realizar uma variedade de tarefas complexas – e muito úteis. Porém mesmo enquanto realizam essas tarefas, elas permanecem sendo pedaços imóveis, escuros e imóveis. Eles não estão realmente agindo – estão sofrendo a ação dada a ela pela corrente de energia que lhes dá “vida”. O momento em que essa força externa para de agir, esses objetos simplesmente revertem ao seu estado natural. O trem do metrô se torna uma sala de espera e o computador se torna um enfeite sobre a mesa.

Quando o suco parou de fluir nas cidades do Nordeste, não voltamos no tempo apenas 150 anos. Há um século e meio atrás conseguíamos viver muito bem sem aparelhos elétricos. Em 2003, tivemos de aprender novamente a aceitar a temperatura da atmosfera numa noite de verão, conseguir usar fontes de luz mais simples, usar os próprios pés como meios de transporte, e fazer nossos trabalhos de computação com a mente humana nua, ajudada, quando muito, por lápis e papel.

Porém imagine que a própria vida funcionasse a eletricidade. Que o motor do nosso coração, a memória RAM ou ROM de nosso cérebro, os campos de força que reúnem incontáveis bilhões de células, átomos e peças formando um “corpo”, as ondas de vontade e desejo que formam o âmago de nosso “ser” – fomos todos conectados a uma enorme “estação de força”. Imagine que vivemos com a consciência de quem em todo instante da vida, estávamos completamente dependentes dessa fonte externa de força para a existência e vida. Que nossa existência e vida não eram qualidades inerentes que de alguma forma “possuímos”, mas agiram sobre nós por aquela fonte externa de energia, e que no momento em que aquela fonte de energia cessasse de agir, nós simplesmente pararíamos.

Assim, de fato, é como o fundador do Chassidismo de Chabad, Rabi Shneur Zalman de Liadi (1745-1812), descreve a totalidade da criação. Toda a existência, explica Rabi Shneur Zalman, foi criada por D'us ex-nihil (“algo a partir do nada”). Como “algo a partir do nada” é uma impossibilidade absoluta, isso significa que a natureza essencial de nossa existência permanece sendo “nada”; nosso algo é uma qualidade que deve ser constantemente imposta sobre nós por uma força externa que está além, tanto do “algo” quanto do “nada”, (pois na verdade Ele criou ambas as noções) e pode assim manipular as duas, impondo uma sobre a outra.

A criação do mundo, por D'us, portanto, não foi um ato de uma só vez. D'us constantemente “fala” ao mundo para ser, exatamente como Ele fez na primeira vez que pronunciou “Que haja…”

“Se as letras,” escreve Rabi Shneur Zalman, “dos Dez Pronunciamentos pelos quais a terra foi criada durante os Seis Dias da Criação se afastassem dela por um instante, D'us não o permita, tudo reverteria ao nada e à nulidade, exatamente como era antes dos Seis Dias da Criação” (Tanya, parte II, cap. 1).

Uma ideia assustadora? Não creio. Na verdade, quanto mais penso sobre isso, mais encorajador se torna. O que isso basicamente significa é que cada nanossegundo de tempo em que D'us contempla nosso mundo, contempla todo o bem e o mal, bondade e crueldade, triunfo e fracasso, imperfeições e esforços que continuam existindo, e toma uma decisão consciente de conceder a ele existência e vida. É como se você pedisse ao Criador, um bilhão de vezes por segundo, “Vendo o que ele se torna, você faria tudo de novo outra vez?” e D'us diz: “Sim, Eu faria, exatamente como é” e o faz.

Se D'us vê algo que valha a pena aqui, estou presumindo que nós, também, podemos fazê-lo.