Dnipro

O rabino Reuven Kaminezki não é um estrangeiro habitando a Ucrânia. Nascido e criado em Dnipro, Reuven retornou para casa várias vezes desde que a guerra começou, em 2022, para apoiar as ações humanitárias e espirituais críticas da comunidade judaica. Assim, junto com sua esposa, Esther Hadassah, natural de Lyon, França, ele tomou a corajosa decisão de se estabelecer permanentemente em sua cidade natal como os mais novos emissários de Chabad-Lubavitch na cidade. Ele estava plenamente ciente dos riscos e incertezas de viver em uma nação devastada pela guerra.

“Não era uma questão de se mudaríamos ou não, mas de quando”, diz o jovem rabino. Hoje, ele e sua esposa são uma parte importante da equipe do Chabad de Dnipro, que seus pais, o rabino Shmuel e Chani Kaminezki, estabeleceram em 1990 a pedido do Rebe, Rabi Menachem M. Schneerson, de abençoada memória.

A história dos Kaminezkis é extraordinária, mas não sem paralelo. Por toda a Ucrânia, inúmeros rabinos Chabad retornaram para casa com suas jovens famílias para fortalecer os esforços de seus pais e de outros emissários em meio à guerra em curso.

Kharkiv

Em Kharkiv, o rabino Sholom Ber Moskovitz, também natural da cidade, juntou-se às fileiras dos shluchim há seis meses, ao lado de sua esposa, Chava, e de seu filho recém-nascido, Menachem Mendel. Antes mesmo do casamento, eles já haviam decidido servir na Ucrânia.“Sempre soube que queria ser um sheliach, mas não tinha certeza aonde”, conta o rabino Moskovitz. “Quando a guerra começou, percebi a imensa necessidade e as milhares de pessoas que dependem do Chabad para sobreviver. Então, quando minha esposa e eu nos casamos em 2023, tomamos a firme decisão de retornar.”

Odessa

Do outro lado do país, em Odessa, uma cidade sob bombardeios quase constantes, o rabino Itamar Wolff e sua esposa, Mussie, retornaram para servir ao lado de seu pai, o rabino-chefe Avrohom Wolff, que permaneceu na cidade durante toda a guerra na direção do Chabad de Odessa.

De acordo com o rabino Reuven Kaminezki, muitos judeus que anteriormente não tinham conexão com a comunidade agora estão participando ativamente dos programas promovidos pelo Chabad. - Chabad de Dnipro
De acordo com o rabino Reuven Kaminezki, muitos judeus que anteriormente não tinham conexão com a comunidade agora estão participando ativamente dos programas promovidos pelo Chabad.
Chabad de Dnipro

Não Importa o Que o Mundo nos Reserva

Quando a guerra começou, os três ainda eram estudantes de yeshivá. Moskovitz e Wolff estudavam na Yeshivá Central Chabad no Brooklyn, Nova York, enquanto Kaminezki estava concluindo estudos pós-rabínicos em Porto Rico. Embora a possibilidade de guerra fosse frequentemente discutida, todos admitiram que ficaram surpresos quando o conflito realmente estourou.

Inicialmente, cada um ofereceu apoio às suas comunidades à distância, coordenando evacuações e organizando remessas de suprimentos essenciais para a Ucrânia. À medida que a guerra se prolongava, cada um começou a fazer a desafiadora jornada de viajar de volta para ajudar seus pais e comunidades durante as festas judaicas e outras ocasiões.

Nos quase três anos desde então, todos os três se casaram e, junto com suas esposas, tomaram a decisão independente de retornar às suas cidades e se juntarem a seus pais como emissários.

O que motiva um jovem casal a começar sua vida em um país devastado pela guerra, onde sirenes, ataques de mísseis e perigo fazem parte da realidade diária? Para o rabino Itamar Wolff, a resposta é simples: “Há judeus aqui. Assim como estamos lá para eles nos bons momentos, precisamos estar nos momentos difíceis também”, afirma.

De Kharkiv, o rabino Moskovitz oferece sua perspectiva: “Meus pais foram enviados para cá pelo Rebe pouco antes da queda da União Soviética, quando o país estava em turbulência. Eles enfrentaram um conjunto diferente, mas semelhante, de desafios, incluindo agitação social, a possibilidade de guerra civil, serviços médicos precários, entre outros.”

Ainda assim, eles estavam determinados a cumprir a visão do Rebe de alcançar cada judeu e ajudá-los espiritual e materialmente. “Continuamos no mesmo caminho, fortalecidos pela visão e pelos ensinamentos do Rebe, não importa o que o mundo nos reserva”, diz Moskovitz.

Em suas respectivas cidades, os três novos rabinos rapidamente se dedicaram ao trabalho central dos emissários do Chabad em todo o mundo: ajudar seus companheiros judeus a se conectar com sua herança por meio de mitsvot, participação nos serviços e atividades da sinagoga, aulas de Torá, programas especiais durante as festas entre outras inúmeras iniciativas.

Na Ucrânia, no entanto, o papel dos shluchim tem uma dimensão adicional. Além da orientação espiritual, os rabinos são cada vez mais solicitados a fornecer ajuda humanitária vital—distribuindo alimentos, medicamentos e geradores, e ajudando os membros da comunidade com necessidades básicas. Embora esta tenha sido uma parte do trabalho do Chabad na ex-União Soviética desde os anos 1990, a guerra tornou esses esforços mais urgentes do que nunca.

O rabino Simcha Levenharts, de camisa branca, do Chabad de Kiev é o coordenador das operações da JRNU na Ucrânia, enquanto também trabalha na Simcha Jewish Day School de Kiev. - Jewish Relief Network Ucrânia
O rabino Simcha Levenharts, de camisa branca, do Chabad de Kiev é o coordenador das operações da JRNU na Ucrânia, enquanto também trabalha na Simcha Jewish Day School de Kiev.
Jewish Relief Network Ucrânia

‘Você Sabe Que Fez Uma Verdadeira Diferença’

Ajudando-os em sua missão humanitária está a Jewish Relief Network Ukraine (JRNU). Lançada logo após o início da guerra, a JRNU é a maior organização judaica de ajuda humanitária atuando em solo na Ucrânia. Eles assistem mais de 50.000 homens, mulheres e crianças em todo o país com vales para compras em supermercados, cestas básicas, medicamentos, cuidados médicos e de saúde mental, programas infantis, itens domésticos e pessoais.

O rabino Simcha Levenharts, do Chabad de Kiev, é o coordenador das operações da JRNU na Ucrânia, enquanto também trabalha na Escola Judaica Simcha em Kiev. Ele e sua esposa, Malka, que se casaram em 2020, são ambos emissários de segunda geração na Ucrânia. Seus pais, o rabino Moti e Devorah Levenharts, lideram a comunidade Simcha de Kiev, enquanto os pais de Malka, o rabino Yosef e Nechama Dina Segal, são diretores da Comunidade Judaica de Poltava, a 320 quilômetros a oeste de Kiev.

Ele já servia como rabino na Ucrânia antes da guerra começar. Assim como seus colegas do Chabad em todo o país, Levenharts optou por permanecer, mesmo enquanto a guerra continuava.

“Antes da guerra, tínhamos vários planos em andamento, incluindo a possibilidade de abrir um centro Chabad em outra área de Kiev ou até mesmo em outra cidade”, ele comenta. “A guerra mudou esses planos. Hoje, nosso foco principal são os esforços humanitários.” Levenharts observa que entre os desafios únicos estão as separações familiares, com mulheres e crianças fugindo para lugares seguros enquanto seus maridos e pais, em idade militar, precisam permanecer no país.

Outro grande desafio são os ataques com mísseis à infraestrutura energética. Os ucranianos enfrentam frequentes apagões—às vezes durando meio dia ou mais—deixando muitos sem eletricidade ou aquecimento. No último ano, a JRNU forneceu geradores para ajudar aqueles que estão sem energia em temperaturas congelantes.

Kaminezki, Moskovitz e Wolff dão crédito à JRNU por permitir que eles forneçam assistência humanitária em suas comunidades na escala que eles fazem. Eles concordam que o impacto de seu trabalho é o que os motiva a continuar, apesar dos muitos desafios que enfrentam.

"À medida que vemos o impacto do nosso trabalho diariamente, como ele literalmente salva vidas, ele nos mantém em movimento", diz Kaminezki.

Em 2012, Chabad de Dnipro abriu o Menorah Center de 20 andares, o maior centro judaico do mundo. Embora tenha oferecido ajuda médica e humanitária desde o início, a guerra o transformou literalmente em um farol de esperança para milhares na cidade e para aqueles de passagem. "Pegue, por exemplo, um homem idoso, de 80 anos, vivendo com uma pensão de apenas 3.000 hryvnia [cerca de US$ 80 por mês]", diz Kaminezki. “Quando damos a ele um estipêndio para suas necessidades básicas ou o ajudamos a fazer uma operação que salva sua vida em nosso centro médico no Menorah Center, você sabe que fez uma diferença real. Você realmente salvou a vida de alguém. Isso é algo que você não encontrará em muitos outros lugares.”

Chava Moskovitz uniu-se ao seu marido Sholom Ber para servirem como emissários em Kharkiv, apesar da guerra em andamento. - Chabad de Kharkiv
Chava Moskovitz uniu-se ao seu marido Sholom Ber para servirem como emissários em Kharkiv, apesar da guerra em andamento.
Chabad de Kharkiv

‘Agora Eles Aparecem Todos os Dias’

Um aspecto que todos os quatro jovens rabinos consideram notável é o número de judeus “não afiliados” que se aproximaram do judaísmo desde o início da guerra.

“Temos muitas aulas de Torá que começaram depois do início da guerra, onde cada participante nunca tinha pisado em uma sinagoga antes”, diz Wolff. “Alguns vieram inicialmente para obter ajuda humanitária e só mais tarde desenvolveram interesse no judaísmo. Outros não precisavam do nosso apoio material, mas sentiam uma profunda necessidade de se conectar com D'us durante esses tempos difíceis. O ponto em comum é que eles nunca tinham vindo antes e agora são membros ativos da nossa comunidade.”

É assim também em Dnipro, onde, apesar de uma parcela significativa de sua comunidade estabelecida ter saído cedo, eles notaram um aumento expressivo.

“Há pessoas que eu conhecia, mas que não vinham regularmente, e agora elas aparecem todos os dias para colocar tefilin”, diz Kaminezki. “Outros participam de eventos em números que nunca vimos antes. Por exemplo, no último Rosh Hashaná, tivemos várias centenas de pessoas participando da refeição festiva, muito mais do que em qualquer outro momento antes da guerra.”

Entre esses recém-chegados, os rabinos estão conhecendo indivíduos que viveram a União Soviética e seu colapso, mas só agora, cerca de 30 anos depois, se sentem capazes de se conectar com sua herança judaica.

“Tivemos vários septuagenários que escolheram passar por um brit milá nos últimos dois anos”, diz Moskovitz. “Outros que nunca pisaram em uma sinagoga, mesmo nas Grandes Festas, agora usam orgulhosamente uma kipá e tsitsit, colocam tefilin diariamente e participam dos serviços regularmente.”

Notavelmente, apesar dos imensos desafios que enfrentam, os judeus ucranianos mantêm uma conexão profunda com seus irmãos e irmãs judeus em todo o mundo, empatizando com suas lutas. Esse vínculo foi poderosamente demonstrado quando, poucas horas depois que as autoridades dos Emirados recuperaram o corpo do rabino Zvi Kogan — o emissário Chabad nos Emirados Árabes Unidos assassinado por terroristas — dois judeus em Odessa que estavam fazendo o brit milá escolheram o nome Zvi em sua memória.

“Esses dois homens queriam ter um brit há algum tempo, e finalmente conseguimos trazer um mohel para Odessa”, explica Wolff. “Ambos os homens já tinham escolhido nomes, mas depois de ouvir as trágicas notícias dos Emirados Árabes Unidos, eles decidiram adicionar o nome Zvi em memória do Rabino Kogan. Agora, um é Moshe Zvi, e o outro é Baruch Zvi.”

Wolff ressalta que ambos os homens passaram os últimos três anos vivendo em uma zona de guerra, onde testemunharam inúmeras tragédias. No entanto, quando ouviram sobre o rabino Chabad que foi assassinado, isso os afetou profundamente.

“Eles sentem a interconexão do povo judeu — sabendo que quando outro judeu do outro lado do mundo sofre, isso os afeta também, mesmo enquanto eles enfrentam e lutam em suas próprias dificuldades”, diz ele. “E eles sentem um vínculo particular com os emissários do Rebe, onde quer que estejam.”

Quando perguntado sobre a mensagem que os judeus ucranianos desejam compartilhar com seus irmãos ao redor do mundo, Levenharts reflete sobre a dinâmica de mudança desde o início da guerra. “Quando a guerra começou, o mundo se uniu para ajudar, com fundos significativos enviados para a Ucrânia”, ele diz. “Mas, naturalmente, com o passar do tempo e o surgimento de outras crises, a Ucrânia foi um tanto esquecida.”

Essa perda de atenção tornou seus esforços cada vez mais difíceis. “A situação não melhorou desde o início da guerra; só ficou mais difícil com o surgimento de novas ameaças”, explica Levenharts. “Recentemente, até os EUA fecharam sua embaixada devido a ameaças à segurança. Há uma tensão constante, e ninguém sabe para onde isso nos levará.”

Ainda assim, ele oferece uma perspectiva esperançosa. “Apesar de tudo, acreditamos que, com a ajuda de D'us, essa guerra acabará. Esperamos e rezamos para que não haja mais vítimas e que todos possam viver em paz.”

Os outros rabinos ecoam esse senso de otimismo.

“Não importa em que situação estejamos, estamos prontos para enfrentar qualquer desafio”, diz Wolff. “No final, temos certeza de que tudo acabará bem. Como a Chassidut ensina, é especificamente dos pontos mais baixos que se pode alcançar as maiores alturas.”

Rabino Itamar Wolff, à esquerda, toca o shofar, e sua esposa, Mussie, que retornaram a Odessa para servir ao lado de seu pai, o Rabino Chefe Avrohom Wolff. - Chabad de Odessa
Rabino Itamar Wolff, à esquerda, toca o shofar, e sua esposa, Mussie, que retornaram a Odessa para servir ao lado de seu pai, o Rabino Chefe Avrohom Wolff.
Chabad de Odessa