Na primeira vez que fui à sala do Rebe foi antes de Rosh Hashaná de 1965. Eu tinha ido junto com vários dos meus colegas da yeshivá em Kfar Chabad, Israel, para passar o ano estudando Torá perto do Rebe. A viagem era longa e custosa, e as pessoas raramente viajavam de Israel para os Estados Unidos de volta. Portanto embora tivéssemos lido sobre o que acontecia ali e tivéssemos gravações do Rebe falando, nunca o tínhamos visto pessoalmente.
Naqueles dias, convidados que iam passar as festas no 770 com o Rebe podiam ter duas audiências privadas – yechidut – com ele, uma na chegada, e uma segunda vez antes de retornar. Nós, no entanto – os alunos da yeshivá que tínhamos ido para passar o ano – fomos informados que não poderíamos entrar na sala do Rebe ainda.
A ideia era que deveríamos primeiro passar um pequeno tempo ao lado do Rebe. Após participar em seus farbrenguens e ouvir seus discursos chassídicos, seríamos preparados para uma audiência privada, e mais equipados para absorver adequadamente a experiência. Portanto nossa primeira audiência foi marcada para quatro meses após nossa chegada.
No dia da minha audiência, eu estava super ansioso. Finalmente entrei na sala do Rebe à meia-noite, e embora eu não tivesse comido durante o dia inteiro – o costume é não comer, somente beber antes de encontrar o Rebe – eu não me sentia nem um pouco faminto.
Eu tinha preparado uma carta de antemão. Em três páginas, eu escrevi uma breve biografia e articulei várias questões e desafios com os quais estava lutando em meus esforços para viver de acordo com o modo de vida chassídico. O Rebe a leu atentamente, e então começou a responder a cada ponto em questão.
Uma pergunta dizia respeito à prece. Naquela época, o mentor chassídico na yeshivá de Kfar Chabad era o Rabino Shlomo Chaim Kessleman. Ele nos educou a colocar maior ênfase em rezar longamente, após fazer as preparações adequadas. Perguntei ao Rebe se eu deveria continuar nesse sentido.
“Continue rezando longamente,” instruiu o Rebe, “e aprenda o Talmud ou os códigos haláchicos em profundidade, junto com os comentários anteriores e posteriores.” Em outras palavras, eu deveria aumentar a intensidade de meus estudos de Torá, sem prejudicar minhas orações.
Outra questão que estava me perturbando dizia respeito à transiçnao abrupta que fazíamos todos os dias na yeshivá: das preces matinais, que eram principalmente sobre contemplar o Divino e dirigir-se a D'us; ao estudo do Talmud e da Halachá, que têm um foco completamente diferente, e estão preocupados com coisas materiais e decididamente não místicas. Eu senti que mergulhar naquele campo exotérico de estudos de Torá, “poderia fazer uma pessoa esquecer sobre De Quem a Torá vem,” como eu disse ao Rebe.
“Mas não é isso que diz no Tanya,” respondeu o Rebe, referindo-se à obra clássica da filosofia Chabad. Ele continuou explicando que pensar sobre o propósito mais profundo de aprender a Torá – que está se aproximando de D'us ao compreender Sua sabedoria – é algo a ser feito quando se senta para estudar pela primeira vez, e apenas intermitentemente depois disso. Somente os tsadikim, perfeitamente justos, são capazes de manter essa intenção mesmo enquanto estudam. Outros precisam estar totalmente engajados no assunto para estudá-lo com alguma profundidade.
No meio daquele ano, eu estava novamente revirando algumas questões em minha mente, e queria ir para outra audiência. Fiz meu pedido por escrito, mas a resposta do Rebe foi: “Você já completou os preparativos necesários?” Foi uma resposta que mostrou quão seriamente o Rebe levava essas audiências e a orientação que ele dava aos jovens estudantes de yeshivá nelas.
E assim, a próxima vez que vim ver o Rebe foi antes de retornar a Israel. Ao final da audiência, o Rebe me entregou uma nota de cinquenta dólares. “Minha participação em suas despesas de viagem,” explicou. Ele então acrescentou que era um ano auspicioso de “Hakhel” – o ano biblicamente ordenado de reunião nacional – e me abençoou com sucesso em meu estudo diligente e prolífico da Torá.
Depois de voltar para Israel, me casei, e após mais dois anos estudando em Kfar Chabad, minha esposa e eu nos juntamos a um grupo de jovens famílias que estavam se mudando para estabelecer a base de Nachlat Har Chabad, uma nova comunidade Chabad na cidade de Kiryat Malachi. Com o tempo, fui nomeado secretário do comitê de bairro.
Na próxima audiência que tive com o Rebe, no início dos anos de 1970, escrevi que meus deveres públicos estavam sendo feitos às custas do meu estudo de Torá.
A isso o Rebe respondeu citando a lei judaica que isentava aqueles ativos em assuntos comunitários de certas obrigações religiosas, como recitar Shemá na hora certa. Ele então continuou: “Pelo contrário, esse trabalho comunitário o ajudará a ver um maior sucesso na qualidade de seu estudo de Torá, apesar do fato de você estar estudando por menos horas.”
“Sem dúvida, “ ele acrescentou em conclusão, “você estabeleceu horários para o estudo da Torá, tanto por conta própria quanto com outros, e que seu trabalho comunitário lhe traga tudo de bom.”
Vários anos depois disso, fui ao Rebe com minha esposa, e entramos juntos para uma audiência. Era sua primeira vez, e o Rebe leu atentamente tudo o que ela havia escrito e abordou todas as questões que ela levantou.
Através da organização feminina Neshei Chabad local, ela era ativa na promoção de várias campanhas de mitsvot que o Rebe havia lançado. Entre outras coisas, ela escreveu sobre algumas das dificuldades que estava encontrando, observando que às vezes sentia que as exigências que lhe eram feitas estavam alem de suas habilidades.
Mais uma vez, a resposta do Rebe provou – como na minha primeira audiência – que para ele, fortalecer os esforços era a única opção. Citando um ditado de seu sogro, o Rebe Anterior, ele disse que “quando alguém decide ir além do que normalmente é capaz, essa decisão abre novos canais de energia, concedendo-lhe mais habilidades do que possuía anteriormente.”
Outras coisa que dizia respeito à minha esposa era que sua voz estava bastante rouca ultimamente, o que tornava o ensino muito difícil. Sobre isso, o Rebe se levantou-se um pouco e declarou com um sorriso: “Que você deixe para trás qualquer rouquidão na América, depois volte para Israel e continue lá!”
Nessa mesma audiência, ela também deu ao Rebe duas fotos de nossos filhos – uma com nossos dois filhos mais velhos, e a segunda com nossos dois mais novos. O Rebe perguntou seus nomes, e depois que dissemos a ele os nomes de cada um de nossos filhos, enquanto apontava para as imagens, o Rebe as virou, e escreveu um número no verso de cada foto indicando a ordem de suas idades. Ficou claro como era importante para o Rebe ver essas fotos e saber quem estava nelas. Naquele momento, sentimos que o Rebe era como um pai perguntando sobre seus próprios filhos.
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