Nas várias coleções de correspondência do Rebe, algumas das cartas em hebraico e yidishe estão assinadas “Em prol do Rebe, E. Quint.”
E. Quint era meu pai – Rabi Eli Quint – que não era Lubavitch, e essa é a história de como ele chegou a escrever e assinar todas aquelas cartas.
Meu pai nasceu e foi criado em Bialystok, na Polônia, de onde saiu para frequentar a famosa yeshivá Slabodka na Lituânia, e quando aquela yeshivá mudou para Hebron, na Terra de Israel, ele foi junto. Após receber sua ordenação rabínica – do rabino chefe do Mandado Britânico para a Palestina, Rabi Avraham Kook – ele casou-se com minha mãe, e eles se mudaram para Nova York, onde eu e minha irmã nascemos.
Em 1940, morávamos na Eastern Parkway 816 em Crown Heights, que ficava apenas a uma quadra da sede Chabad no 770. Como a sinagoga Chabad era tão próxima, meu pai sempre ia rezar lá, e ficou amigo de Rabi Mordechai Hodakov, o chefe do secretariado do Rebe, que lhe ofereceu um emprego. Meu pai aceitou e começou a trabalhar na Merkos L’inyonei Chinuch, onde suas responsabilidades incluíam ajudar o Rebe (que ainda não era o Rebe) em muitas maneiras - como editar várias publicações educacionais Chabad e cuidar da volumosa correspondência do Rebe.
No decorrer de seu trabalho, ele desenvolveu um relacionamento com o Rebe e se tornaram muito próximos. Na verdade, seus escritórios ficavam a pouca distância um do outro, e sempre que o Rebe caminhava pela sala principal para ir a algum lugar, passava pelo escritório que meu pai dividia com Rabi Hodakov – então eles se falavam todo dia.
Esse arranjo continuou depois que o Rebe Anterior faleceu em 1950 e o Rebe assumiu a liderança de Chabad-Lubavitch. Para alguém de fora, pode ter parecido um tanto estranho que uma pessoa como meu pai tivesse um cargo tão alto embora não fosse um Lubavitcher – ele costumava brincar dizendo que era o único não-chassid no edifício inteiro – mas devido ao seu vasto conhecimento talmúdico, ele era uma opção muito valiosa.
Na verdade, meu pai era um erudito de Torá do mais alto calibre – tendo estudado na mesma classe que algumas das maiores autoridades em lei judaica da geração passada – ele e o Rebe frequentemente entravam em discussões sobre temas da Torá. Eu sabia disso, porque na ocasião eu lia notas sobre eles, mas meu pai não tornava isso público. Em seus livros, quando ele mencionava suas discussões com o Rebe, ele o identificava apenas como ish gadol, “um grande homem”.
Quanto a mim, além de ser um mensageiro entre meu pai e o Rebe, eu também cuidava de organizar alguma arquivo no escritório do Rebe, porque o Rebe era meticuloso em manter um registro de toda a sua correspondência. Enquanto trabalhava, eu às vezes o ouvia dizer para meu pai: “Rabi Quint, preciso de uma carta escrita sobre esse tema, pode preparar?”
Meu pai perguntava o que a carta deveria dizer, e então a compunha, datilografava e a entregava ao Rebe. Tipicamente, o Rebe assinava seu nome e a carta era despachada. Mas às vezes meu pai era quem assinava e ele escrevia: “Em nome do Rebe, E. Quint...” Porém, com maior frequência, o próprio Rebe assinava as cartas.
Quando consegui o emprego, estava no início dos vinte anos e frequentava a Faculdade Brooklyn. Eu também não era um Lubavitch e não me comportava como um Lubavitch.
Em certa ocasião, eu estava saindo do 770 quando o Rebe estava entrando, e me aproximei para apertar sua mão. Os chassidim que estavam presentes chamaram a minha atenção: “O que está fazendo? Você não pode apertar a mão do Rebe!” Mas o Rebe me disse: “Tudo bem – você pode apertar minha mão.” Ele entendia que eu estava vindo de um mundo diferente. Ele também sabia que eu não rezava na sinagoga Chabad, que eu ia para a Young Yisrael na Eastern Parkway, e ele me perguntou sobre aquela comunidade.
Em 1959, após eu me formar na faculdade de direito e me tornar engajado, meu pai partilhou a notícia com o Rebe, que me desejou Mazal Tov e pediu para conhecer Rena, minha futura esposa. A princípio, Rena estava com medo de ir, porque então, ela estava ensinando numa escola Conservadora e ela pensava que o Rebe não iria aprovar. Mas quando fomos, o Rebe focou no positivo. Ele disse a ela: “Você está fazendo uma coisa maravilhosa ensinando crianças judias. É algo precioso o que você está fazendo.”
Assim era o Rebe – ele nunca depreciava ninguém – ele era uma pessoa excepcional. Quando minha mãe faleceu em 1960 e meu pai estava de shivá por ela, o Rebe veio à nossa casa para confortá-lo. E quando meu pai faleceu em 1974, o Rebe foi ao funeral para me confortar.
Como enlutado, eu sabia que tinha de falar primeiro, mas o Rebe estava de pé à minha frente e eu não sabia o que dizer. Ou seja, o que eu poderia dizer ao Rebe? Portanto eu disse: “Sei que eu deveria falar primeiro, mas encontro as palavras.”
O Rebe me olhou com seus olhos bondosos e disse: “Vou lhe dizer o que falar.”
Hoje, eu não me lembro o que ele disse, mas lembro que suas palavras me trouxeram um verdadeiro consolo.
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