Eu tinha doze anos quando fui matriculado na yeshivá em Crown Heights junto com meu irmão. Nossa família tinha fugido de Viena antes do início da Segunda Guerra Mundial, e embora houvesse muitas yeshivot perto de nossa casa em Williamsburg, nós gravitamos para ensinamentos chassídicos. No Chabad, encontramos nosso lar espiritual e nosso pai espiritual, o Rebe.

Minha primeira grande impressão sobre ele remonta a Rosh Hashaná de 1951. Quando o farbrenguen do Rebe terminou na conclusão da festa, ele recitou a bênção após a refeição e então começou a distribuir vinho do seu copo. Embora o Rebe Anterior também tivesse distribuído do seu copo numa cerimônia conhecida como kos shel brachá, essa era a primeira vez que o Rebe – que tinha aceitado a liderança de Chabad mais cedo naquele ano – pessoalmente dava vinho a todos, não apenas para pessoas importantes. Cada um de nós se aproximava para receber vinho, e o Rebe dirigia algumas breves palavras para cada pessoa.

Eu também fui, e embora fosse apenas um adolescente, achei este encontro com o Rebe muito importante. As palavras que ele escolheu para me dizer eram bastante pessoais – não eram apenas frases padrão mas uma mensagem sob medida diretamente a mim. Naquele momento eu soube que estava na frente de alguém muito especial, a quem passei a chamar de meu “pai”.

Apenas para dar um pequeno exemplo: quando adolescente, eu era muito hábil, e fazia trabalhos esporádicos como construir beliches para o acampamento de verão e reforçar os bancos de madeira que eram usados para os farbrenguens no 770. Nos anos seguintes, eles tinham suportes de ferro, mas naquela época eram feitos de madeira. Após alguns poucos farbrenguens, eles começavam a ficar fracos e cambaleantes, e às vezes eu era chamado para consertá-los.

Eu levava um serrote, um martelo e alguns pregos, entrava no shalash - o quintal ao lado do 770 onde uma tenda foi colocada então – e começava a trabalhar. Um dia, quando eu estava no meio da martelada, olhei para cima e fiquei surpreso ao ver o Rebe ali de pé, olhando-me com um grande sorriso no rosto. Ele disse: “Está frio, por que você não está usando sua jaqueta?”

Esta não é uma pergunta que um grande erudito faria – embora certamente o Rebe fosse um grande erudito – é uma pergunta que um pai faria.

Com o passar do tempo, entendi que o Rebe tinha um interesse pessoal em todo aluno da yeshivá. Se tivéssemos qualquer problema – não importa quão insignificante – poderíamos escrever um recado para ele, e ele respondia cada uma das nossas estúpidas pequenas perguntas. (Como: “Eu deveria tirar uma carteira de motorista?”) Além disso, cada um de nós recebia conselhos pessoais, individualizados do Rebe numa base contínua. Geralmente, ouvíamos aqueles conselhos dos nossos professores, mas agora entendo que estavam vindo diretamente do Rebe que discutia cada um dos alunos com a administração da yeshivá em reuniões mensais. Ele sabia tudo sobre nós e acompanhava nosso progresso.

Quando fiquei mais velho, comecei a pensar que poderia estar na hora de me casar. Quando fui para minha audiência anual com o Rebe – por ocasião do meu aniversário, como era o costume naqueles anos – eu nem tive que trazer esse assunto à tona. O Rebe fez isso primeiro, dizendo: “Você sabe, Moshe, está na hora de você começar a procurar alguém para casar.” O Rebe estava bem informado sobre a minha situação.

Quando recebi minha ordenação rabínica em 1958, meus pais queriam que eu começasse a ganhar meu sustento. Eles estavam preocupados de que eu iria sentar e permanecer na yeshivá durante a vida inteira, e foram falar com o Rebe sobre isso. Embora nenhum dos meus pais fosse chassídico, eles se sentiam muito à vontade com o Rebe porque ele falava um alemão perfeito – tendo estudado na Universidade de Berlim – e ele falou com eles como ninguém mais poderia.

Ele lhes deu sua bênção, prometendo que eu encontraria um bom par para o casamento e que eu nunca teria problemas financeiros. Ele sabia como falar com o coração deles – em particular com o coração da minha mãe. Como qualquer outra Yiddishe Mame, ela estava preocupada com seu filho, mas o Rebe sabia como aliviar seus temores.

Ele disse a ela, nomeando uma família rica em Williamsburg, “Ele vai se casar numa família como aquela e ele não terá de se preocupar com dinheiro.” Ela ouviu aquilo e ficou satisfeita. E na verdade, foi isso que aconteceu. Em todos os anos em que eu estava trabalhando como emissário Chabad em Milão, na Itália, eu nunca precisei lutar para as coisas darem certo.

Obviamente, meus pais convidaram o Rebe para oficiar meu casamento – que ocorreu em março de 1960 – mas ele não aceitou. Minha mãe, que não era tímida, perguntou: “Por que não? Moshe é tão ativo em Chabad, ele faz tantas coisas; ele até construiu uma biblioteca inteira na yeshivá!” Ela sentia que eu merecia isso.

Então, o Rebe sorriu e disse: “Sim, eu sei. Mas agora há uma nova ordem de coisas, e não posso mais oficiar casamentos. Mas tenha certeza de que estarei lá em espírito.”

Foi difícil para mim aceitar isso, mas eu não era o primeiro aluno da yeshivá cujo casamento o Rebe se negara a oficiar. Eu era o segundo, portanto já tinha sido divulgado que o Rebe estava diminuindo sua participação nesta área. Mas isso ainda era um grande desapontamento. Eu tive de me contentar com a promessa de que ele estaria pensando em mim naquele dia.

Olhando para trás, eu não deveria ter ficado desapontado porque o cuidado do Rebe pelos seus chassidim era constantemente tornado evidente numa miríade de maneiras.

Depois que eu já tinha sido enviado como emissário Chabad a Milão, retornei com minha esposa e bebê para visitar Nova York. Meus sogros nos pegaram e fomos para a casa deles para comer algo e então fui ao 770 onde um farbrenguen estava ocorrendo. Quando entrei pela porta, imediatamente ouvi: “Onde você estava? O Rebe já perguntou três vezes por você!”

O Rebe prolongou o farbrenguen até que eu pudesse chegar. Quando me sentei, o Rebe fez uma breve palestra e o farbrenguen terminou.

Então é por isso que considero o Rebe como meu pai espiritual.

Eu apenas gostaria de acrescentar que as pessoas não percebem o quanto o Rebe era humilde. Ele nunca queria nos impressionar com sua grandeza – pelo contrário, ele queria que nós, seus filhos, percebêssemos nossa própria grandeza. E ele era bem sucedido brilhantemente com todos os seus jovens seguidores, que hoje chefiam algumas das maiores e mais influentes organizações judaicas no mundo.

Como isso aconteceu?

Não tínhamos qualidades especiais mas o Rebe nos formou, pouco a pouco, com paciência sobre-humana. Ele pegava todo e cada um de nós e nos ajudava a descobrir nossos talentos dados por D'us e nossa missão na vida. Ele nos ajudou a encontrar nossa própria grandeza.