Quando eu trabalhava em Nova York para a Agência Judaica Para Israel, atuando como diretor do departamento de educação de Torá e cultura nos Estados Unidos e Canadá, sempre visitava os bairros Chabad para participar nos farbrenguens do Rebe. Como eu e meus colegas éramos reconhecidos como representantes seniores do Estado de Israel, éramos convidados a nos sentar perto da frente onde o Rebe e outros destacados chassidim se sentavam.

Na véspera de Simchat Torá de 1973 – que caiu duas semanas depois do início da Guerra de Yom Kipur – fui com meu amigo Dr. Shlomo Levin, então cônsul encarregado de assuntos religiosos no Consulado Geral de Israel em Nova York. Como éramos de Israel, o feriado já tinha terminado para nós, mas ainda fomos participar da celebração e ver o Rebe.

Quando irrompeu a guerra, fiquei ocupado organizando eventos públicos – como ralis pró-Israel de estudantes judeus fora do prédio da ONU – mas as notícias que chegavam de Israel eram bastante deprimentes. Apesar disso, eu sabia que se havia algum lugar de onde eu poderia ouvir uma mensagem animadora e ganhar algum encorajamento seria no farbrenguen do Rebe.

Quando Shlomo e eu entramos na sinagoga, ela já estava lotada com milhares de chassidim. Apesar da multidão, assim que o Rebe nos viu, ele fez sinal para nos aproximarmos dele. Embora as hakafot – as danças com a Torá – estivessem para começar, o Rebe começou a falar conosco sobre a situação em Israel.

O salão lotado caiu em silêncio, pois todos tentavam ouvir aquilo que o Rebe estava nos dizendo. E ele disse muito – na verdade, a conversa durou uma hora inteira pois o Rebe descrevia em detalhes sua opinião sobre a situação e suas recomendações, baseadas em fontes da Torá, sobre como Israel deveria agir. Ele queria que Shlomo e eu transmitíssemos essa mensagem aos chefes do governo israelense.

Ele começou com uma frase otimista, dizendo que essa guerra não apresentava uma ameaça existencial para Israel. Mas, interessantemente e contrário ao pensamento divulgado na época, ele sentia que a maioria do esforço de guerra deveria se concentrar ao norte na batalha contra a Síria, e não ao sul na batalha contra o Egito. Isso foi surpreendente, pois o pensamento convencional percebia o Egito como a principal ameaça.

Àquela altura da guerra, Israel já tinha expulsado as forças egípcias e até conseguiu atravessar o Canal de Suez e avançar mais ao sul. Mas o Rebe argumentou que a maior invasão ao território egípcio não iria trazer verdadeiros ganhos, pois não havia possibilidade de mudar a posição estratégica de Israel ali. O supremo e mais difícil inimigo de Israel, o Rebe dizia, era a Síria, cuja antiga capital, Damasco, era considerada como um símbolo de força por todo o mundo árabe. “Eu não entendo por que Israel não está seguindo em frente para conquistar Damasco,” ele dizia.

Vale a pena notar que, àquela altura, Israel já tinha se recuperado do choque inicial do ataque combinado pelos exércitos árabes, que surpreendeu até as agências de inteligência militar, e tinha mudado de defesa para ofensiva. O Rebe pensava que as FDI tinham de tirar vantagem dessa ocorrência e não ficarem satisfeitas com a volta às fronteiras pré-guerra.

O Rebe argumentava que conquistar Damasco, mesmo que por um curto período, não somente iria permitir o resgate de presos israelenses, mas causaria o colapso do regime sírio, que estava levando a oposição à própria existência do Estado de Israel. Enquanto o governo em Damasco permanecesse forte, o Rebe argumentou, não haveria paz com o mundo árabe.

Nesse contexto, o Rebe citava o Tratado Meguila do Talmud: “Se alguém lhe disser ‘Ambas Cesareia e Jerusalém foram destruídas,’ não acredite. ‘Ambas permanecem’ – não acredite. Mas se alguém lhe disser ‘Cesareia foi destruída e Jerusalém permanece,’ ou ‘Jerusalém foi destruída e Cesareia permanece’ – nisso você pode acreditar.”

Assim como a cidade de Cesareia a princípio simbolizava a força do Império Romano no Oriente Médio, também Damasco simbolizava a força da Liga Árabe. O Rebe estava convencido de que aproveitar esta oportunidade para derrotar Damasco traria paz para todos no norte e libertaria os recursos vitais de Israel.

Em resposta, tentamos explicar que os tomadores de decisão em Israel estavam preocupados sobre a reação dos soviéticos que tinham adotado a Síria sob sua asa, e tinham ameaçado se envolver na guerra se Israel invadisse a Síria. Os líderes em Israel temiam que ir contra Damasco nos faria pagar um preço muito alto e sangrento. Além disso, os Estados Unidos se opunham ao nosso avanço em território sírio, e não queríamos enfurecer nosso maior aliado.

O Rebe rejeitava esses argumentos um a um. Sobre os soviéticos, ele dizia que as ameaças deles eram vazias, e que não havia nada para se preocupar. Sobre os americanos, ele dizia que contrário às suas declarações, eles na verdade estavam interessados em Israel dominar os sírios. Quanto à perda potencial de vidas humanas, o Rebe sugeria que mais sangue poderia ser derramado no futuro se a ameaça árabe não fosse reduzida agora. Essa era a mensagem que ele queria que levássemos ao governo de Israel – e queria que transmitíssemos a mensagem agora mesmo.

Quando finalmente começaram as hakafot, ficamos apenas para a primeira, e então corremos para cumprir nossa promessa ao Rebe de comunicar sua perspectiva ao governo de Israel. Telefonei ao meu amigo Zevulon Hammer, um dos líderes do Partido Religioso Nacional, e transmiti a ele os principais pontos do Rebe. Ele ouviu mas disse que temia que o Ministro da Defesa, Moshe Dayan, ficaria preocupado demais sobre a intervenção soviética para assumir este risco. Enquanto isso, Shlomo ligou para o escritório da Primeira Ministra, Golda Meir, e comunicou a mesma mensagem, recebendo uma resposta semelhante.

Em retrospecto, não há dúvida de que o Rebe estava certo em sua análise estratégica. A Síria ainda é uma ameaça para Israel, serve como uma extensão do Irã, e é uma base para a organização terrorista Hezbola. Como resultado, a fronteira norte permanece insegura.

O Rebe tinha imensa influência em todos os círculos judaicos ao redor do mundo, e tinha muitas conexões, tanto conhecidas como desconhecidas, com os chefes do governo em Israel. É uma vergonha que a solução sugerida por ele não tivesse sido aceita naquela época. Quem sabe quantas guerras teriam sido impedidas e quantas vidas teriam sido poupadas se os líderes de Israel tivessem dado ouvidos ao seu ousado conselho.