Durante quase vinte anos, durante os anos de 1960 e 1970, morei em Nova York, atuando numa posição sênior com o Mossad, Agência de Inteligência de Israel.
Durante um desses anos – creio que foi no final de 1967 – alguns dos meus colegas no Consulado Israelense em Nova York me convidaram a ir com eles numa excursão ao Brooklyn. Explicaram que estavam indo visitar a sinagoga do Rebe de Lubavitch para participar na celebração de Simchat Torá.
“Quem? O Quê? Sobre o que é isso?” perguntei, mas eles me garantiram que seria um evento muito bom, festivo. “Posso levar minha esposa?” perguntei, e para minha satisfação eles disseram que ela poderia participar. Eu estava totalmente despreparado para onde estávamos indo e para o que iria acontecer.
Quando chegamos à sede de Chabad, vimos uma grande comoção. As hakafot – dança com a Torá – ainda não tinham começado, mas um farbrenguen com o Rebe estava ocorrendo, e parecia que o local era pequeno demais para acomodar os milhares de chassidim que tinham chegado. Porém, nossa visita tinha sido marcada com antecedência, e os assentos estavam reservados para nós ali dentro.
Fomos levados ao grande salão, onde a empolgação era palpável – a multidão estava cantando com grande alegria, e o Rebe estava batendo no ritmo sobre sua mesa.
De repente um chassid se aproximou de mim, dizendo: “O Rebe gostaria de falar com você.”
Fiquei muito surpreso. O Rebe? Falar comigo? Como o Rebe sabe quem eu sou?
“Deve ser um engano,” eu disse. Mas ele insistiu que o Rebe queria conversar comigo.
Voltei-me aos meus colegas e perguntei se alguém tinha informado o secretário do Rebe de que eu estaria vindo. Obviamente, devido à minha posição, eu sempre assegurava de manter um perfil discreto. Ninguém deveria saber minha identidade nem meu local. Mas todos eles deram de ombros, como para dizer: “Não dissemos nada. Não temos a mínima ideia sobre isso.”
Fui levado à plataforma onde o Rebe estava sentado. “É bom ver você aqui,” ele cumprimentou-me, falando iídiche. Além da surpresa de ser chamado pelo Rebe, fiquei chocado por ele estar falando comigo em iídiche.
“Como sabe que eu falo iídiche?” perguntei ao Rebe.
Percebi que era audacioso da minha parte interrogá-lo assim, mas ele apenas sorriu e começou a me inundar com bênçãos para que eu tivesse sucesso no trabalho que estava fazendo, que fosse saudável e tivesse um bom sustento. “Seja cuidadoso e cuide de si mesmo. Seu trabalho é muito importante para o povo judeu,” ele disse.
Como membro do Mossad, de repente me senti muito exposto. Fiquei assustado e não entendi o que estava ocorrendo. Não estava acostumado a ficar surpreso – geralmente as únicas surpresas que eu sentia eram aquelas que eu mesmo tinha orquestrado. Então fiquei convencido de que meus colegas tinham falado sobre mim ao Rebe. Eles devem estar mentindo para mim, pensei. Afinal, são especialistas treinados em esconder a verdade! Resolvi que cuidaria deles mais tarde.
Então o Rebe começou a perguntar sobre minha família. Perguntou-se sobre meu pai, minha mãe, e minha irmã. Como o Rebe sabia que eu tinha uma irmã? Ele também perguntou sobre minha esposa e filhos. Eu disse a ele que minha esposa tinha vindo comigo, e ele respondeu. “Sim, eu sei. Ela está sentada com as mulheres no andar de cima.”
Obviamente, meu espanto somente crescia. Comecei a me sentir como se alguém estivesse zombando de mim. Talvez a conexão entre o consulado e o Rebe fosse tão profunda que eles trabalharam juntos para pregar uma peça em mim. Eu simplesmente não sabia o que pensar.
Outra pergunta que o Rebe me fez foi: “Como você se sente como judeu?” Presumi que ele estava me perguntando isso porque eu não parecia judeu, o que era uma das razões pelas quais eu era capaz de trabalhar na inteligência. Mas eu me sentia judeu em cada fibra do meu ser, e disse isso ao Rebe.
Ele então perguntou como era viajar pelo mundo como judeu.
Respondi que, embora morando nos Estados Unidos, eu assegurava de mandar meus filhos a uma escola judaica. Quanto a me manter casher, eu tinha sido cuidadoso com isso durante minha vida inteira, e quando meu trabalho me colocava numa situação desafiante, eu evitava alimentos não casher declarando ser vegano.
Não sei exatamente quanto tempo continuou essa conversa com o Rebe, mas estou certo de que para mim pareceu mais longa do que realmente foi. Senti que estava ali pelo menos por uma meia hora, mas deve ter sido muito menos, apenas alguns minutos. A certa altura, sentindo que a multidão inteira estava esperando eu terminar, comecei a me sentir desconfortável. Então tentei encerrar a conversa dizendo: “Estamos falando há muito tempo e todos estão esperando...”
Sei que esta foi outra declaração audaciosa da minha parte – quem era eu para dizer ao Rebe o que fazer – mas ele não estava com pressa de terminar de falar.
Ao final, o Rebe me deu um pedaço de bolo e então abençoou-me novamente para que eu tivesse sucesso em tudo que faço e que eu fosse saudável e forte. Esta bênção teve um significado especial para mim porque eu tinha sido ferido algumas vezes durante meu trabalho.
Quando voltei ao meu assento, todos no caminho me pediram um pedacinho do bolo do Rebe, portanto ao final, eu mal tinha algumas migalhas. Quando cheguei até meus colegas exigi: “Pessoal, o que está acontecendo aqui?” Mas eles pareciam tão intrigados quanto eu.
Continuei a interrogá-los no dia seguinte até que finalmente eles me convenceram que ninguém tinha falado com o Rebe ou seu secretário sobre mim. Então eu ainda não entendia como o Rebe sabia que eu falava iídiche, ou como ele sabia o que eu estava fazendo. E meu senso era que ele sabia ainda mais do que ele tinha revelado.
Tudo isso era muito estranho para mim. Eu era tão transparente? Aquilo traria um sério problema. Mas, se eu realmente era tão transparente, por que todos não podiam ver? Por que somente ele?
Essas perguntas ficaram na minha mente por um longo tempo e eu não encontrei respostas até que encontrei um chassid Chabad que me explicou em três palavras: “Esse é o Rebe.”
O fato de que até hoje, mais de cinquenta anos depois, esse evento ainda está gravado na minha memória é testemunho de como fiquei impressionado pela experiência. Saí sentindo que tinha conhecido um homem brilhante, com vasto conhecimento e compreensão, e poder de pensamento analítico excepcional. Também aprendi com o Rebe como escutar. Quando ele me perguntava algo e eu respondia, ele permanecia em silêncio, deixando-me falar enquanto ele ouvia atentamente.
Ele foi uma pessoa notável, um em uma geração. Há muito a aprender com ele, e eu me sinto pequeno demais para realmente entender esse grande homem. Fui afortunado por conhecer um verdadeiro líder, e agradeço a D'us por isso.
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