Antes de qualquer outro líder judaico, o Rebe reconheceu o espírito positivo da rebelião jovem que caracterizou grande parte da cultura ocidental durante os anos 60. Para decepção dos mais idosos, judeus, homens e mulheres jovens, estavam se tornando cada vez mais desconfiados de pais e professores, levando-os a se afastar dos valores e tradições com os quais tinham sido criados. Mas o Rebe viu que ao rejeitar os ensinamentos de seus pais, esses jovens estavam começando uma busca por algo mais profundo.
Sob uma perspectiva conservadora, a florescente contracultura parecia ser uma ameaça ao Judaísmo tradicional. Mas segundo a tendência de positividade do Rebe, isso tinha o potencial de engajar e elevar o espírito incansável da geração. Se os hippies fossem realmente devotados aos ideais de paz e amor, então com a adequada exposição, muitos certamente poderiam encontrar caminhos espirituais para expressar seus ideais dentro de um contexto judaico.
Sem dúvida, a filosofia e a prática judaica tinha muita luz a lançar sobre as questões sociais e espirituais do dia – a compaixão de D'us, liberdade, uma espiritualidade de amor, revolução, comunidade, e unidade global – isso tudo estava na Torá, profecias, e tradição mística. As calorosas chamas do Judaísmo estavam esperando para acender ainda mais essas almas apaixonadas, se abertas e apresentadas sincera e sensivelmente.
O desafio era em como, numa ampla escala, conectar os judeus na contracultura com o estudo de Torá e a observância das mitsvot, e como revelar e amplificar a essência Divina em suas almas através do prisma do Judaísmo da Torá.
Degeneração ou Regeneração
Nos anos 60, Chabad Lubavitch começou a promover “Encontro com Chabad”, nos fins de semana para estudantes no Brooklyn, apresentando a jovens, homens e mulheres, o rico mundo da Torá e do Chassidismo. Por volta de 1970, Chabad estava abrindo programas de contato em campus nas universidade em todos os Estados Unidos, trazendo uma nova dimensão espiritual aos judeus jovens que tinham perdido contato com suas tradições religiosas.
o Rebe viu que ao rejeitar os ensinamentos de seus pais, esses jovens estavam começando uma busca por algo mais profundo.Em 1963, o Rebe estava escrevendo para encorajar o movimento jovem americano. Eis aqui um trecho traduzido de uma carta a Rabi Pinchas Mordechai Teitz:1
Toda geração tem sua qualidade particular, única à sua época. Em nossa geração, especialmente nos últimos anos, estamos testemunhando um despertar espiritual, que está sendo chamado – embora aqueles que o chamaram assim não estejam cônscios do verdadeiro significado do termo que cunharam – “um retorno às raízes.” Independentemente de como está sendo entendido atualmente, a busca ao “retorno às raízes” é, em essência, a busca da alma pela teshuvá, para reunião com sua fonte em D'us.
Estamos vendo esse despertar basicamente entre os jovens, que sentem tudo com maior profundidade e maior intensidade. Pessoas jovens também não têm medo de desafiar seu estilo de vida, desde que estejam convencidas de que estão recebendo a verdade, sem compromisso e equívoco. Este é especialmente o caso com os jovens do nosso pais. Em outros países, há um duplo obstáculo a ser superado: primeiro a pessoa deve desenraizar as falsas ideologias que foram instaladas em alguns círculos entre a geração mais jovem, e somente então é possível implantar as ideias corretas em suas mentes. Este não é o caso neste pais, onde [por causa da sua rebelião contra o que eles foram ensinados] o jovem é solo fértil, se apenas receberem a verdade em sua pureza. Temos testemunhado na atualidade que aqueles que não estão intimidados e apresentam a verdade sem equívoco têm encontrado uma verdadeira resposta entre os jovens.
Não desejo ser crítico, mas sou forçado a notar que, para nosso grande aborrecimento, este despertar não tem sido utilizado, até agora, por aqueles que pretendem ser lideres e guias espirituais de suas comunidades, certamente não ao ponto em que poderiam ter sido utilizados.
Nossos sábios ensinaram que “a ação é a coisa básica.” Portanto não é preciso dizer que o objetivo de eu escrever tudo isso não é para discussão, mas na esperança de que você e seus colegas irão lançar um esforço espiritual para encorajar este despertar e – mais importante – tê-lo traduzido em mudanças concretas na vida do dia a dia para aqueles a quem este chamado pode atingir.
O que para muitos parecia na superfície uma rebelião forte era na verdade uma expressão de uma geração desejando se comprometer com ideias mais elevadas, mais significativas.O emergente movimento e a cultura jovem não estão trazendo crises, mas oportunidades para conexão e crescimento espiritual. O que para muitos parecia na superfície uma rebelião forte era na verdade uma expressão de uma geração desejando se comprometer com ideias mais elevadas, mais significativas.
Sob a perspectiva do Rebe, foi importante à liderança judaica reconhecer e reagir autenticamente às necessidades e desafios da juventude; engajá-los, não enfurecê-los deixando-os de lado.
Ouse Ser Diferente
Ao contrário de muitos tradicionalistas, o Rebe não desprezou o cabelo longo, costeletas, e as roupas chamativas da juventude dos anos 1960. Ele certa vez 2 recebeu a visita de Yosef Dov Krupnik, um jovem de uma yeshivá da Lituania que tinha deixado crescer a barba. Seus professores não gostaram porque pensavam que parecia muito com o estilo dos hippies, mas o Rebe disse a ele para mantê-la e disse que não era algo mau parecer diferente dos outros, expressando que: nossos sábios dizem que o povo judeu foi salvo do Egito porque enfrentaram os egípcios de três maneiras essenciais: conservaram suas vestimentas, seu idioma e seus nomes judaicos.
Uma ideia semelhante é verdadeira para os hippies judeus, o Rebe explicou, dos quais muitos eram lideres proeminentes de todo o movimento. Eles tinham sobrenomes judaicos [o Rebe mencionava Abbie Hoffman, Allen Ginsberg e Mark Rudd, nascido Rudnitsky). Usavam roupas diferentes (como capas e ponchos]. E embora não falassem hebraico, tinham suas próprias gírias dentro do inglês, que era diferente do inglês falado pelo povo. Na verdade, quem diz que esses “rebeldes” eram menos merecedores da redenção que o restante do povo judeu?
Entre Pais e Filhos
Embora o Rebe desse aos jovens o mandamento de honrar os pais, também reconhecia que havia algo positivo e renovador sobre os jovens tendo a coragem de pensar por si mesmos e até influenciar seus pais e professores. Nesse tom, ele citava uma passagem talmúdica 3 dizendo: “É ensinado numa Baraita que R. Nehorai diz: ‘Durante a geração na qual o filho de David [Mashiach] virá, os jovens irão humilhar os idosos e os idosos ficarão em deferência perante os jovens, uma filha vai se rebelar contra sua mãe, uma noiva contra sua sogra, a face da geração será como a face de um cão, e um filho não ficará envergonhado perante seu pai.”
Embora os sábios sem dúvida estivessem criticando a degeneração da sociedade que iria ocorrer pouco antes de começar a era messiânica, o Rebe via algo positivo nessa passagem, ou seja, a habilidade para os jovens atuarem como agentes positivos de mudança.
O Rebe também sugeriu, em 1970, que se os jovens estivessem se rebelando contra o sistema estabelecido, os defensores daquele sistema tinham de examinar melhor o que eles estavam defendendo e como eles o estavam defendendo:
As reclamações que as pessoas têm contra a geração mais jovem, que eles estão destruindo o assim chamado estabelecimento, deveriam ser endereçadas aos seus educadores. Quando pais e professores ensinavam à geração mais jovem o comportamento adequado, eles explicavam isso como os meios de poder ter uma boa casa, ter uma grande conta bancária, possuir dois Cadillacs (dele e dela), e serem honrados e se sentarem à cabeceira da mesa nos banquetes…
Quando isso constitui a razão para escolher entre o bem e o mal… é compreensível por que os jovens irão terminar perdendo toda a paciência por tamanha falsidade… Os jovens estão no processo de uma jornada espiritual. Não podemos permitir que eles se afastem e se percam. Devemos educá-los segundo suas necessidades, numa maneira agradável e gentil, e levá-los a uma compreensão adequada do certo e do errado.4
O Rebe percebia que a juventude ansiava por algo mais significativo que aquilo que viam como a norma, e em algumas maneiras semelhante ao próprio Rebe, eles estavam desejando virar o mundo de cabeça para baixo para conseguir isso.Sempre é muito mais fácil colocar a culpa em outra pessoa numa determinada situação. Mas aqui vemos o Rebe admoestando não as rebeliões jovens, mas o próprio sistema no qual eles foram criados. Se a geração mais jovem está rejeitando as maneiras de seus mais velhos, este é acima de tudo um chamado aos pais e professores para refletirem sobre seus próprios valores que estão tentando transmitir. Na verdade, com frequência são nossos filhos que nos ensinam, as lições mais profundas, como amar e apoiar cada indivíduo na maneira única que ele precisa.
Ouve, ó Israel
Por fim, segundo o Rebe, a tendência da contracultura a se rebelar e desobedecer era semelhante à tradição judaica antiga de questionar a autoridade, como pode ser visto nas ações de Avraham, Moshe e muitos outros lideres na Torá. O Rebe também parecia admirar os jovens pela sua aderência ao princípio e seu desligamento dos confortos oferecidos pela sociedade. Ele percebia que a juventude ansiava por algo mais significativo que aquilo que eles viam como a norma, e em algumas maneiras semelhante ao próprio Rebe, eles estavam desejando virar o mundo de cabeça para baixo para conseguir isso.
“Já vimos que em tempos de emergência, uma crise, quando um fogo está ardendo, nossos jovens estão preparados para real abnegação e sacrifício,” o Rebe disse a um repórter de um jornal. “Por natureza, o judeu não tem medo de dificuldades. Por natureza, o judeu é desafiador. Somos um ‘povo de pescoço duro,’ um povo de auto-sacrifício, uma nação de rebeliões habituais.”5
Através das lentes redentoras de sua Positividade na Atitude, o Rebe via que a juventude judaica que fez tanto do que poderia ser a contracultura, e talvez em alguns casos já eram dirigidos rumo a servir a D'us e dar prioridade à vida da alma.
“Em nossa era, prevalece, em certos círculos, uma forte tendência rumo à auto-asserção e independência, não somente nas esferas materiais, mas também na ideológica,” escreveu o Rebe 6 pouco antes de Rosh Hashaná em 1967.
Para alguém que não está acostumado a se subordinar, mas é independente em seu pensamento – uma pessoa assim deveria chegar à convicção de que deve reconhecer a Suprema Autoridade, que o permeia completa e fundamentalmente, e ele encontra a força para se reorientar completa e permanentemente. As qualidades exibidas pelos jovens em sua rebelião cultural eram exatamente aquelas que iriam inspirar e sustentar o espírito numa vida significativa de devoção religiosa e comunitária. O Rebe via isso claramente.
No verão seguinte, após protestos de jovens em Nova York, Chicago e Paris, o Rebe fez uma conexão direta 7 entre a audácia e a paixão dos aderentes judeus à contracultura e seu potencial como líderes no Judaísmo da verdadeira Torá:
O Rebe via na rebelde juventude judaica dos anos 1960 o início do movimento de baal teshuva que explodiu no início dos anos 1970. Ele entendia que por fim muitos judeus jovens iriam trocar seus cordões por tefilin, seus ponchos feitos à mão por um talit, e seu desejo por revolução por revelação.“Os jovens são ousados, têm chutzpá [ousadia], e não são detidos por nada – não pela opinião mundial, nem por seus pais ou famílias, nem mesmo pelas opiniões que eles próprios defendiam um dia antes… Em vez disso, eles proclamam orgulhosamente sua absoluta liberdade de fazer o que desejam. Especificamente por causa da sua chutzpá, é mais fácil levá-los ao verdadeiro caminho da Torá e mitsvot… Quando conseguimos inspirar os jovens, eles não vão ficar apenas com observância pessoal da Torá, mas – devido ao seu espírito valente e indomável – eles também vão inspirar outros a fazerem o mesmo. Eles serão uma força inevitável que vai transformar o mundo inteiro e levá-lo a um alinhamento com integridade e justiça.”
Previsor como sempre, o Rebe via na rebelde juventude judaica dos anos 1960 o início do movimento de baal teshuva que explodiu no início dos anos 1970. Ele entendia que por fim muitos judeus jovens iriam trocar seus cordões por tefilin, seus ponchos feitos à mão por um talit, e seu desejo por revolução por revelação. Eles iriam pegar a paixão que tinham colocado em ativismo social e os tratados de revolta política e canalizá-los em estudo de Torá e trazer energia fresca e espírito ao Judaísmo americano e além desse.
Essa expressão específica da Positividade do Rebe – ver a centelha redentora na juventude desafiando as maneiras dos mais idosos – é uma das mais impactantes. Pode ser aplicada não apenas socialmente e em larga escala, mas também pessoalmente, para pais lutando para entender o que seus filhos estão tentando dizer por baixo da superfície de suas “ações”. Segundo o Rebe, não essa coisa de “agir para fora”. Há sempre algo mais profundo sendo expressado, uma necessidade ou uma lição, se apenas abríssemos nossos olhos, ouvidos e corações para aquilo que nossos filhos estão tentando nos dizer.
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