Enquanto eu estava matriculado como aluno na yeshivá Chabad em Crown Heights, ocorreu um evento notável, que envolveu um objeto não menos marcante:o Sefer Torá de Mashiach que o Rebe Anterior tinha encomendado porém nunca tinha sido concluído.

Na época do Holocausto – em Simchat Torá de 1941 – o Rebe Anterior tinha anunciado que planejava escrever um Rolo de Torá para saudar Mashiach. Foi o período mais sombrio para o povo judeu e o Rebe Anterior procurava trazer alguma medida de segurança e conforto a todos aqueles profundamente abalados pelo que estava acontecendo no mundo. Essas eram as “dores de nascimento de Mashiach”, ele disse, “e escreveremos um Rolo de Torá com o qual dar as boas vindas à sua chegada.”

Embora fosse preciso grande sofrimento para obter o pergaminho de alta qualidade e o melhor escriba, e embora o projeto tivesse começado com grande entusiasmo, o Rolo de Torá nunca foi completamente escrito por razões desconhecidas. O projeto foi suspenso e o Rolo foi colocado numa antiga arca de madeira – que ficava no escritório do Rabino Shmuel Levitin no 770 – um Aron kodesh – onde permaneceu durante muitos anos. A Torá colocada ali estava noventa e nove por cento completa.

Em 1968, o secretário do Rebe Anterior, Rabino Eliyahu Simpson, percebeu que a antiga arca de madeira – que estava no escritório do Rabino Shmuel Levitin no 770 – tinha se deteriorado com o passar do tempo, e ordenou uma nova. E então ele pediu que o Rebe mudasse o Sefer Torá para a nova arca. O Rebe respondeu que faria isso naquela tarde, antes do início do Shabat.

Naquela época eu costumava rezar Minchá, as preces da tarde, na sinagoga do Rebe antes do Shabat. Eu estava sempre ali quando o Rebe rezava junto com um pequeno grupo, e era sempre um serviço de prece muito bonito, extraordinário. Naquele dia, espalhou-se a notícia de que o Rebe iria mover o Rolo de Torá do antigo Aron kodesh para o novo, e as pessoas estavam de pé para ver se conseguiam vislumbrar esse evento. Era possível sair do prédio e olhar para dentro da sala através de uma janela para assistir a cena, mas por respeito ao Rebe, eu não faria isso. Resolvi esperar, junto com alguns outros, todos nós aguardando para ter uma visão através da porta de entrada.

Enquanto estávamos ali, ouvimos um ruído e vimos o Rebe chegando. Quando ele desceu na entrada, passou por uma pequena sala e percebeu que alguns casacos tinham caído no chão, então ele se curvou para apanhá-los. Quando o Rebe começou a pendurar os casacos, todos correram para ajudá-lo. Então ele entrou na sala, deixando a porta aberta, e o vimos movendo o Rolo de Torá.

Depois disso, todo o assunto foi esquecido até dois anos mais tarde, quando o Rebe decidiu concluir a escrita deste Rolo de Torá.

A decisão veio quando estavam sendo feitos os planos para celebrar o vigésimo aniversário de falecimento do Rebe Anterior e marcar vinte anos da liderança do Rebe. Ideias sobre como fazer isso vieram do mundo inteiro, mas foi uma mulher em Kfar Chabad, Israel, que sugeriu que o Sefer Torá de Mashiach fosse finalmente acabado.

Quando o Rebe lançou este projeto, um conceituado escriba teve de ser contratado. Um dos escribas originais – Rabino Shmaryahu Faktor – novamente foi o escolhido. Apenas faltavam umas poucas linhas para o Sefer Torá ser terminado e o Rebe convidou qualquer um que desejasse ter o mérito de participar nesse projeto sagrado a tomar parte doando um dólar para a compleição. Embora os primeiros participantes no projeto, na época do Rebe Anterior, pudessem subsidiar a escrita das cartas, agora havia muitos doadores e poucas letras, portanto isso não foi possível mas, disse o Rebe, “os anjos iriam dividir as letras entre todos [os contribuintes].”

Chegou o dia para o Rolo de Torá ser acabado. Isso ocorreu na tarde da sexta-feira, 9 de Shevat de 5730 janeiro de 1970) – e eu estava lá. Os rabinos se sentaram na primeira fila de bancos atrás do Rebe e eu estava bem atrás deles. Foi um evento tão solene como o 770 nunca tinha visto.

Lembro-me bem do Rabino Simpson descendo as escadas com o Rolo de Torá em seus braços, e o Rebe atrás dele carregando uma caixa grande. Ninguém tinha qualquer ideia sobre o que havia naquela caixa e, é claro, não podíamos deixar de nos perguntar.

O Rebe colocou a caixa sobre a mesa, e então a compleição das últimas poucas letras começou. Finalmente, a pena foi passada ao Rebe para conclusão final, mas ele fez do escriba seu agente, por assim dizer, e Rabino Faktor terminou a escrita do rolo.

Então começou a cerimônia com a recitação de Salmos e a entoação de várias canções selecionadas pelo Rebe. E foi então que, para surpresa da multidão, o Rebe abriu a caixa que tinha trazido para mostrar uma magnífica coroa de prata e ouro que ele colocou no topo do Rola de Torá.

Mais tarde, eu soube que na semana anterior ao evento, o Rebe tinha chamado o artesão que deveria fazer esta coroa. O homem tinha meia dúzia de amostras para apresentar ao Rebe que as olhou e disse: “Eu quero a base como essa aqui, a do meio como essa, e a do topo como aquela.”

O homem perguntou: “Para quando o Rebe precisa?” “Para a próxima semana.”

O homem olhou para o Rebe e disse: “Mas demora três ou quatro semanas para fazer.”

“Mas eu preciso na próxima semana,” disse o Rebe.

O homem concordou e produziu uma linda coroa.

Caminhando sob uma canópia em meio a velas acesas, o Rebe carregou o Rolo de Torá para a frente da sinagoga e colocou-o sobre o Aron kodesh. Depois disso, ele voltou ao seu lugar e começou um discurso chassídico sobre o tema de escrever um Rolo de Torá. Quando ele terminou, concluiu: “Acabamos de completar algo que estava faltando. Agora cabe a cada um de nós escrever as poucas últimas coisas que precisam ser feitas para romper o exílio e trazer Mashiach.”

Que isso ocorra brevemente, em nossos dias!