Saudações e Bênçãos,

Tenho em mãos sua carta. Por ser costume lembrar de alguém em oração citando o nome hebraico completo e o nome hebraico da mãe, solicito que me informe estes nomes na próxima vez em que me escrever.

A respeito do assunto de sua carta, especificamente no que se refere ao seu sucesso ao defender sua tese, não ficou bem claro porque isso o deixou com um gosto amargo, como escreveu. Certamente você sabe que é procedimento usual criticar-se uma tese; na verdade, este é o propósito de cada defesa. Não é infrequente, também, que quando a tese recebe forte apoio, terá também fortes críticas. Finalmente, tenho certeza de que será uma fonte de satisfação para você que, apesar dos ataques à tese, você conseguiu superá-los e defendeu sua obra com sucesso.

Com referência a sua dúvida sobre se você escolheu o caminho certo, etc., confio que você sabe os princípios básicos de nossos sábios, de abençoada memória, que o essencial é o ato que leva ao resultado prático. Similarmente, no seu caso, se você tomou o caminho certo ou não vai depender de como você utiliza sua graduação: se o faz em direção ao bem e ao sagrado, usando-a para iluminar seu ambiente – isto provará que está no caminho certo.

Por outro lado, se suas qualificações e capacidades não forem utilizadas desta forma, ou são usadas em outra direção, a conclusão inevitável, com o devido respeito, será que então não é o caminho certo. Pois uma pessoa pode não ser um observador passivo em seu ambiente e sociedade, para não mencionar um fator negativo; ela tem um dever para com a sociedade de ser um agente positivo e ativo para aperfeiçoar seu ambiente. E todos têm a capacidade de fazê-lo, pelo menos num certo grau. Se o exposto acima é verdadeiro a respeito de qualquer ser humano, há um aspecto adicional e essencial no seu caso, como judeu.

Considere: o povo judeu, cada membro dele, tem sempre se achado na situação ímpar de ser uma pequena minoria entre as nações, muitas das quais não eram amigáveis, e frequentemente hostis. Nesta circunstância desfavorável, a sobrevivência judaica tem sido sempre um problema e um desafio.

Consequentemente, esta situação acarreta um dever especial e sagrado para cada judeu, homem e mulher, a fazer o máximo para fortalecer e assegurar a sobrevivência judaica. Entretanto, um judeu não deveria olhar este dever simplesmente como uma obrigação, mas sim vê-lo como sua missão privilegiada e divina neste mundo, através da qual o judeu atinge a plenitude.

Além disso, isto não é algo que possa ser deixado à escolha do judeu, pois sua única escolha é se ele deseja, ou não deseja, cumprir seu dever; mas aquilo que é seu dever sagrado não é uma escolha sua, pois nasceu judeu. E tendo nascido judeu, chega a este mundo com um rico legado, que o equipa com capacidades especiais, privilégios especiais, e obrigações especiais. Não tem o direito de argumentar dizendo que não foi consultado, etc., pois, seja este argumento válido ou não, de forma alguma muda a realidade, da mesma maneira que a realidade para todo homem é que, visto que como alguém recebe da sociedade uma variedade de benefícios positivos, é obrigado a compensar a sociedade com seus melhores esforços. Retrucar dizendo que estas obrigações lhe foram impostas sem o seu consentimento, etc., não serve como desculpa para esquivar-se às responsabilidades.

Sinto-me no dever de adicionar mais um aspecto. A sobrevivência de nosso povo judeu, e o impacto que isso tem em cada indivíduo, não é algo que deva ainda ser investigado e experimentado. O povo judeu é um dos mais antigos do mundo, e sua longa história como nação tem passado incólume por muitas condições e circunstâncias, a maioria desfavoráveis, conforme mencionado acima. Se alguém deseja saber o segredo da sobrevivência judaica sob circunstâncias que obliteraram nações maiores e mais poderosas, deve aplicar os mesmos métodos científicos que em outros casos. Em outras palavras, é necessário encontrar o fator, ou fatores, comuns, em todos os vários períodos da história judaica, o que teria que ser considerado como a base da sobrevivência judaica. Se forem encontrados dois ou três fatores, seria uma questão de se todos eles foram indispensáveis à sobrevivência, ou talvez apenas um ou dois teriam sido suficientes. Porém, se apenas um fator comum for encontrado, então não pode haver dúvida de que esta é a única base da sobrevivência. Isto, como mencionado acima, é a abordagem científica e não um problema de falta de fé. Além disso, como em todos os campos da ciência, não importa se alguém entende ou não as descobertas científicas. De fato, em ciências mais exatas, os fatos e fenômenos reais são primeiro verificados, somente então uma explicação científica é procurada.

Voltando à longa história de nosso povo por um período de trinta e cinco séculos, vê-se que há apenas um fator que tem preservado a identidade e sobrevivência judaicas durante os vários períodos de nossa história. Este fator não foi o idioma, ou país, nem qualquer dos fatores que são normalmente associados com nacionalidade e nacionalismo; pois em todas estas coisas têm ocorrido mudanças radicais de um período a outro, como qualquer um que esteja familiarizado com a história judaica sabe. O único fator, e enfatizando, o único fator, que tem preservado nosso povo judeu através das eras, sob todos os tipos de circunstâncias, tem sido o cumprimento das mitsvot na vida cotidiana, como a observância do Shabat, vestir tefilin, e a educação de Torá ministrada às nossas crianças. Estas e todas as outras mitsvot já estão incorporadas na Torá e têm sido cumpridas pelos judeus desde a outorga da Torá no Monte Sinai, e têm sido observadas da mesma maneira no decorrer dos séculos, sem mudanças.

Uma prova adicional de que este é o “segredo” da sobrevivência judaica, se alguma prova mais se faz necessária, é o fato de que sempre têm havido dissidentes; a própriaTorá relata que imediatamente após a outorga da Torá no Monte Sinai, houve os adoradores do Bezerro de Ouro. Similarmente, através do período dos Juízes, Profetas e Reis, bem como no período pós-bíblico do Segundo Bet Hamicdash, e mais tarde. Estes dissidentes tentaram tomar outro rumo, à parte do judaísmo tradicional, mas nunca puderam se enraizar dentro do povo judeu. Até mesmo estes que se desviaram acabaram por perceber seu equívoco e retornaram ao aprisco da observância da Torá e mitsvot, ou então foram completamente assimilados entre as nações do mundo, sem ter mais nada a ver com o povo judeu, menos ainda com a sobrevivência judaica.

Baseado no princípio de que o principal é a ação, como foi citado antes, quero expor a conclusão prática dos pensamentos expressados nessa carta, isto é, que independentemente de como sua vida diária expressou-se no passado, é meu dever, visto que estabelecemos contato entre nós, mostrar-lhe que seu dever consigo mesmo, com o que o cerca e com nosso povo judeu como um todo, é ordenar sua vida em total concordância com a Torá e mitsvot na conduta diária.

Desnecessário dizer, entendo que tais mudanças acarretam dificuldades e a desistência de várias coisas, mas certamente é um pequeno sacrifício em relação ao enorme privilégio de cumprir uma obrigação sagrada com nosso povo, em adição à sua obrigação com a comunidade judaica na qual vive com sua família. Possa D’us garantir que você tenha boas novas a dizer sobre tudo que foi discutido acima.

Com estima e bênçãos,