Na minha juventude, trabalhei na área de educação especial durante muitos anos, principalmente com adolescentes que tinham cometido crimes. Por causa do meu trabalho, fui convidado em 1964 a participar do primeiro curso em criminologia oferecido pela Universidade Bar Ilan, onde estudei com outros profissionais da justiça criminal, incluindo juízes da corte juvenil, oficiais de polícia, oficiais de condicional etc.

Como parte dos meus estudos em criminologia, recebi uma bolsa para um ano de treinamento avançado nos Estados Unidos. Quando estava lá, decidi aproveitar a oportunidade para encontrar alguns líderes do Judaísmo Americano, para fazer-lhes perguntas que estavam na minha mente como um jovem judeu israelense.

Eu queria especialmente encontrar o Rebe de Lubavitch por causa da minha conexão familiar. Como ele, sou um descendente do Rebe Anterior, o fundador do Movimento Chabad no Século 18, embora ao contrário dele, eu traço minha árvore familiar através da neta do Rebe Anterior, Rebetsin Menucha Rochel Slonim, que veio a Israel em 1845 e se estabeleceu na cidade de Hebron.

Quando liguei para o secretariado do Rebe e pedi para marcar um encontro, especifiquei que eu não queria ver o Rebe como um chassid – apenas queria me apresentar, pedir uma bênção e sair; eu queria ter uma conversa adequada com ele, sem ser pressionado pelo tempo.

Passaram-se oito meses até que meu pedido fosse atendido, quando um grupo de doadores de outro país cancelou devido a um atraso no voo. Corri assim que fui avisado, e ao chegar, fui aconselhado sobre como me comportar perante o Rebe – não me sentar na sua presença, não tentar apertar sua mão etc. Essas regras pareciam estranhas para mim, mas me comprometi em obedecê-las.

Esperei na frente da porta do escritório do Rebe pleno de ansiedade, e de repente a porta se abriu e vi o Rebe de pé à minha frente. Ele estendeu a mão e por um instante eu não sabia o que fazer. Aqui estava ele estendendo a mão para mim, então como eu poderia não retribuir?

Em seguida, o Rebe convidou-se a sentar, mas segundo as instruções, continuei de pé. Somente quando o próprio Rebe se sentou eu também me sentei.

Uma das coisas que mais me impressionaram no escritório do Rebe foi o número de livros. Não somente as paredes estavam lotadas de prateleiras, mas sobre a mesa do Rebe também havia pilhas de livros. Olhei para as capas e fiquei surpreso pela variedade – eram livros sobre todos os tipos de assuntos e em diversos idiomas!

A conversa entre nós foi principalmente em iídiche e inglês com um pouco de hebraico no meio. Embora eu nunca tivesse me correspondido com o Rebe antes disso, fiquei surpreso ao saber que ele sabia quem eu era e o que eu fazia. Não somente isso – o Rebe mostrou grande interesse pelo meu trabalho e fez muitas perguntas específicas. Fiquei impressionado pelo seu conhecimento sobre criminologia. Por exemplo, a certa altura ele me perguntou: “Você está familiarizado com as obras de Cesare Lombroso?”

Lombroso foi um importante criminologista judeu que trabalhou na Itália ao final do século 19, mas creio que a maioria dos criminologistas no mundo nunca sequer ouviram falar dele, muito menos estar familiarizados com as teorias de Lombroso que o Rebe discutiu comigo.

O Rebe também queria saber sobre a instituição para meninas que eu estava gerenciando na época, e fez muitas perguntas a respeito. Ele ficou feliz ao ouvir que eu organizo refeições de Shabat para as meninas, bem como Sedarim de Pessach, e que em Rosh Hashaná eu formo um minyan de homens para que as meninas possam participar dos serviços durante a festa.

Nossa conversa durou três horas, e abordamos também outros tópicos, mas ficou claro para mim que o Rebe estava mais preocupado sobre a meninas delinquentes. Eu não poderia imaginar que o Rebe estaria interessado em questões como essa, mas ele realmente queria saber sobre todo aspecto do tratamento delas e ouvir descrições detalhadas das meninas e seus conflitos. Ele fez perguntas sobre estudantes individuais, esforçando-se para conseguir perfis individuais para entender as dificuldades que cada uma estava passando. Isso me fez relatar alguns fatos bem difíceis, mas o Rebe não se esquivou de nenhum deles. Em geral, era um diálogo escolarizado com um colega conhecedor, e causou uma forte impressão sobre mim.

A certa altura o Rebe me perguntou: “Diga-me, como você abre e fecha a porta?”

A princípio, não entendi o por quê dessa pergunta, portanto pedi a ele para esclarecer. Ele explicou: “Seu trabalho é como um bombeiro; você é forçado a jogar suas mãos dentro do fogo todo dia. Então quando você termina o trabalho do dia e fecha a porta da instituição para ir para casa, como abre a porta da sua casa, onde sua esposa e filhos esperam por você, sem permitir que os problemas do trabalho entrem junto com você? Como lida com a transição? Como garante que as dificuldades da instituição não sejam transferidas para seu ambiente privado?”

Expliquei ao Rebe que faço uma total separação entre meu trabalho e meu lar, e que meus relacionamentos familiares permanecem sem serem afetados. Disse também que tinha conseguido influenciar a instituição mais do que ela me influenciou. O Rebe me olhou com admiração e disse que gostaria de conhecer minha esposa e lhe dar uma bênção.(Infelizmente, não conseguimos ver o Rebe antes de voltar para Israel. Numa carta que ele me enviou depois, me criticou por eu não ter ido me despedir).

Ao final do encontro, ele me deu uma bênção muito especial, e disse: “O trabalho que você faz está certamente num caminho Divino.”

Eu não tinha ido ao Rebe para bênçãos, mas as recebi de braços abertos e agradecia ele do fundo do meu coração. Tive a oportunidade de ver o Rebe mais algumas vezes em vários farbrenguens quando visitei Nova York, e também mantive contato por cartas, mas aquela foi a única vez que o encontrei numa audiência privada. Saí daquela audiência com a impressão de que tinha conhecido um gigante de um homem que, sem dúvida, fortalecera minha fé e influenciara minha vida ao longo da estrada.