Fui educado na Yeshivá Ner Yisrael em Baltimore, onde recebi minha ordenação rabínica. Após me casar e começar uma família, aceitei um emprego como líder espiritual da Sinagoga Beth Jacob em Norwich, Connecticut.

Todo ano, Rabi Yosef Wineberg, um arrecadador de fundos para a yeshivá Lubavitch ia a Norwich para coletar doações, e numa ocasião fiz a ele uma pergunta que estava me incomodando naquela época. Era referente à opinião do Shach (um importante comentarista do século 17) sobre as Leis dos Juramentos, e quando expliquei minha pergunta, ele respondeu que para uma questão de tamanha complexidade, eu precisava escrever ao Rebe.

Inicialmente, eu estava relutante para escrever. Em primeiro lugar, eu não era um chassid Lubavitch, e pensava que o Rebe deve receber cartas do mundo inteiro, então ele teria tempo para responder à minha?

Mas, de volta então – isso foi nos anos 1950 – um selo custava três ou quatro centavos, e eu nada tinha a perder. O pior que poderia acontecer seria eu não receber uma resposta. E na verdade, o Rebe nunca escreveu de volta.

Em seguida, deixei o rabinato e entrei no mundo das finanças. Passaram-se alguns poucos anos e então um amigo meu, um judeu russo que tinha imigrado para Israel, veio para uma visita a Nova York e disse que gostaria de encontrar o Rebe. Ele conseguiu ser agendado para o meio da noite, por volta da 1h da madrugada – e fomos juntos.

Quando entramos, o Rebe se levantou para nos cumprimentar, e me apresentei como o ex-rabino de uma congregação em Norwich. Sua reação me surpreendeu: “Sei quem você é. Não escreveu para mim uma vez?” ele perguntou.

E então ele continuou a responder em grande detalhe a pergunta que eu tinha feito a ele anos antes. Não me lembro exatamente o que ele disse, mas lembro que ele falou sobre as obras do Tzemach Tzedek (o terceiro Rebe Chabad) para abordar a pergunta que eu tinha feito.

Fiquei estupefato. O Rebe tinha visto minha carta quatro ou cinco anos antes, porém se lembrava exatamente de quem a enviara e qual era a minha pergunta como se a tivesse lido ontem!

Cerca de dez anos depois – em 1967 – tive motivo para escrever-lhe novamente.

Nessa ocasião, eu tinha uma pergunta sobre algo que o Rebe começara a falar publicamente pouco antes do início da Guerra dos Seis Dias. Como as nações árabes ao redor de Israel estavam aumentando suas ameaças contra o jovem estado judaico e ficava claro que a guerra era iminente, o Rebe lançou sua campanha de mitsvá para conseguir que tantos judeus quanto fosse possível, especialmente soldados israelenses, a colocarem tefilin. Baseado numa declaração no Talmud de que aqueles que colocavam tefilin teriam uma vida longa, ele disse que os tefilin iriam trazer proteção sobre aqueles que cumprissem plenamente a mitsvá e, de fato, na FDI inteira. Ele acrescentou que assim como a guerra é um esforço em equipe, os tefilin usados por um único soldado têm um efeito coletivo sobre o exército inteiro, e os tefilin colocados por qualquer judeu em todo o mundo ajudam os judeus na Terra de Israel.

Na minha mente, o argumento do Rebe parecia contradizer a opinião de Maimônides, o notável filósofo judeu do século 12 e codificador da Lei Judaica conhecido como Rambam, Portanto escrevi a ele sobre isso, dizendo que – enquanto discutia a mezuzá e a proteção que ela oferece ao lar quando é afixada no batente da porta – o Rambam disse que você não afixa uma mezuzá com o objetivo de proteção, mas para cumprir o mandamento de D'us. Se você faz isso por proteção, então está denegrindo a mezuzá transformando-a num amuleto. Para mim era como se aquilo que o Rebe tinha dito sobre a proteção do tefilin parecia estar na mesma categoria.

Uma ou duas semanas depois, recebi uma resposta do Rebe que era bastante complexa, contendo muitos detalhes, citações do Talmud e do Rambam, bem como vários comentários. Em resumo, o Rebe explicava que eu tinha entendido mal aquilo que o Rambam tinha dito e que seu próprio argumento não contradizia de forma alguma o Rambam. Ele enfatizou que o Rambam estava falando sobre acrescentar palavras à mezuzá que a iriam invalidar e transformá-la num amuleto, e não sobre a intenção dos judeus em cumprir uma mitsvá.

O Rebe também citou outras obras do Rambam onde ele escreve claramente que é permitido cumprir uma mitsvá por motivos ulteriores. O Rambam ainda declara que uma pessoa deve influenciar outras a servirem a D'us, mesmo se estiverem fazendo isso meramente em seu próprio benefício e para “encorajá-las e fortalecer sua intenção.”

Além disso, o Rebe enfatizava que quando um judeu coloca tefilin e recita antes a bênção requisitada – declarando que D'us nos ordenou a cumprir essa mitsvá – ele certamente está fazendo isso em prol do Céu, sua recitação da bênção é a prova disso. Embora ele ainda possa ter seus próprios interesses no coração, esses podem ser considerados intenções adicionais e não necessariamente a principal.

Estou mencionando aqui apenas os destaques de uma exposição mais impressionante. E gostaria apenas de afirmar que enquanto muitas pessoas conhecem o Rebe como um líder judeu que teve um impacto global no Judaísmo como o conhecemos, eu pessoalmente cheguei a entender que ele foi também um erudito de eminência mundial. E minha correspondência com ele é minha prova.