Nota do Editor

Em nosso trabalho para registrar o testemunho de experiências individuais com o Rebe, com frequência encontramos aqueles que nos dizem que o seu encontro foi tão pessoal e tão privado que não pode ser compartilhado.
Embora sempre tentemos persuadi-los que exatamente essas histórias pessoais são tão relevantes, muitos decidem guardar suas histórias para si mesmos.
Somos especialmente gratos à Sra. A. por partilhar sua história conosco. Embora fosse difícil para ela reviver essa parte da sua vida, ela generosamente concordou em fazê-lo sob a condição de que sua identidade não seja revelada.
Esperamos que outras pessoas que tenham suas histórias em segredo sejam encorajados a seguir esse exemplo dela.

Num lindo dia ensolarado há pouco tempo, eu estava no carro com uma amiga – uma mulher solteira com trinta anos – quando, por um motivo que não consigo explicar, decidi partilhar com ela uma história bastante pessoal da minha vida envolvendo o Rebe, uma história que não contei a ninguém. Quando terminei de falar, ela parou o carro, colocou a cabeça em suas mãos, e começou a chorar.

Quando ela se acalmou um pouco, perguntou-me: “Por que decidiu me contar essa história agora?”

“Não sei,” respondi. “Apenas tive vontade de falar.”

“Você não tem ideia do que acaba de fazer para mim,” continuou ela. “Minha situação é muito semelhante ao que foi a sua. Eu, também, tenho carregado sentimentos de raiva por um longo tempo, e penso que é isso que me impediu de casar-me até agora. Ouvir aquilo que o Rebe lhe falou me ajudou imensuravelmente.”

De fato, apenas alguns meses depois da nossa conversa, ela ficou noiva. E aquele resultado feliz tem me convencido de que valeria a pena partilhar minha história com outros e talvez diminuir seus fardos.

Essa é a minha história:

Quando eu era pequena – somente quatro anos de idade – meus pais se divorciaram. Eles tinham se casado na Europa após a guerra sem conhecer muito bem um ao outro, e somente mais tarde, quando começaram uma família, perceberam que tinham pontos de vista muito diferentes sobre a vida.

Um grande motivo de desacordo entre eles era decidir onde morar. O sonho do meu pai era viver em Israel, enquanto minha mãe queria se juntar à sua grande família na América. Então eles se separaram, e fui criada pela minha mãe na América, ouvindo coisas muito negativas sobre meu pai e desenvolvendo sentimentos de raiva contra ele. Naqueles dias, o divórcio não era comum e eu não conhecia qualquer criança (exceto meu irmão) que tivesse pais separados, portanto eu sofria muito por ser a única no meu bairro que vinha de um lar partido.

Eu estava sempre criando histórias e tentando inventar desculpas para explicar a ausência de meu pai. Quando meus amigos perguntavam onde ele estava, eu respondia: “Oh, ele vai voltar para Pessach.” Quando Pessach chegava, e eles perguntavam se ele já estava em casa, eu dizia que ele estaria chegando para Sucot.

E não eram apenas as crianças que estavam fazendo perguntas. Sempre que eu fazia uma nova amiga e era convidada, inevitavelmente os pais dela queriam saber sobre os meus. Tipicamente, o pai perguntava: “E qual sinagoga seu pai frequenta?” Eu rapidamente pensava numa sinagoga bem longe da casa de minhas amigas. Se elas morassem perto da Kingston Avenue, eu dizia que ele rezava numa sinagoga em Troy. Se eles estivessem perto da Albany Avenue, eu falava sobre outro local.

Tudo isso era muito difícil para mim, e meu ressentimento contra ele crescia cada vez mais. Finalmente, quando eu estava com dez ou onze anos, as perguntas pararam, porque a essa altura todos sabiam da verdade, porém meus sentimentos de raiva jamais me deixaram.

Em 1963, aos dezoito anos, fiquei noiva. Enquanto planejava meu casamento, disse à minha mãe que não queria incluir o nome do meu pai nos convites. Mas quando discuti o assunto com meus parentes – que também tinham sentimentos amargos contra meu pai – eles sentiram que isso, apesar de tudo, era um erro. Eu estava firme em minha opinião, mas decidi perguntar ao Rebe sobre isso quando meu noivo e eu fomos pedir uma bênção a ele.

O Rebe nos deu uma linda bênção. E então abri meu coração com ele, explicando por que eu me sentia tão furiosa com meu pai e o que eu queria fazer. “Por que meu pai teria a honra de ter seu nome no meu convite quando ele nos deixou sozinhas e não fez nada para me criar?” eu perguntei.

O Rebe olhou-me bondosamente e disse com simplicidade:
“Um filho não pode julgar um pai.”

Essa breve frase mudou a minha vida. Saí do escritóriodo Rebe me sentindo vinte quilos mais leve, porque o enorme peso do ódio fora tirado dos meus ombros. E creio que o motivo pelo qual suas palavras tiveram esse efeito sobre mim foi porque eu sabia que ele entendia completamente a minha situação, então confiei nele.

Todos os anos de raiva e hostilidade para com meu pai voaram pela janela. De repente percebi que a separação dos meus pais fora algo ocorrido entre eles, e nada tinha a ver comigo. E incluí o nome do meu pai nos convites. Depois que o Rebe tinha falado, não havia dúvida de que isso era o certo a fazer.

Numa maneira tão simples e direta, o Rebe me lembrou que eu estava obrigada a honrar meu pai como a Torá ordena. Ao lembrar-me disso, o Rebe mostrou como eu poderia começar minha vida de casada sem o fardo do ódio que estava carregando comigo, e que estava me machucando mais que qualquer outra coisa. Finalmente, eu estava livre.