Graduei-me na escola rabínica e servi como capelão na Força Aérea dos Estados Unidos no Japão. Ao retornar aos Estados Unidos em 1967 assumi o cargo de rabino júnior numa sinagoga em Great Neck, Nova York. O mashgiach, que fazia a verificação da cashrut sobre os alimentos, era Rabino Elya Gross, discípulo Chabad-Lubavitch. Quando minha noiva e eu anunciamos nosso noivado, ele sugeriu: “Talvez você deva enviar um convite de casamento ao Rebe.”
Eu achava que tradicionalmente o Rebe, Rabi Menachem Mendel Schneerson, de abençoada memória, não comparecia a casamentos, mas o Rebe com frequência convidava o jovem casal para visitá-lo e receber uma bênção.
Enviei o convite e logo recebi um chamado do secretariado do Rebe, dizendo que ele gostaria de convidar minha noiva e eu para uma audiência privada. O encontro foi marcado para a 1 hora da manhã, algumas semana depois.
Trabalho Com os Vivos
Entramos na sala do Rebe sem agenda e sem pedidos, simplesmente queríamos seus bons votos e bênção para nosso casamento. O Rebe falou em yidish e eu traduzia a conversa para minha mulher, que falava apenas hebraico.
A primeira coisa que o Rebe disse foi: “Moshê [meu nome hebraico], há muito tempo que não o vejo! Você desapareceu. Já basta de trabalhar com os mortos, agora precisa trabalhar com os vivos!”
Eu não trabalhava no ramo de funerais. Não trabalhava com os vivos e não trabalhava com os mortos, portanto respondi: “Rebe, não entendo!”
Mas o Rebe repetiu: “Já basta de trabalhar com os mortos, agora você precisa trabalhar com os vivos.”
Respondi: “Desculpe-me, mas não entendo essa referência. Não trabalho com os mortos nem com os vivos.”
O Rebe explicou que tinha lido um artigo no jornal sobre minha descoberta de um cemitério judaico em Nagasaki, no Japão, quando eu era capelão ali. “Por que está desperdiçando seu tempo procurando cemitérios? Há pessoas vivas no Japão. O Japão é um país em crescimento e eles precisam de um rabino.”
O Rebe continuou: “Nenhuma comunidade deve ser abandonada. Não podemos abandonar o navio. O capitão precisa ser o último a abandoná-lo. Há judeus em toda parte e há uma ótima comunidade judaica no Japão, você deveria ir para lá e tornar-se rabino da comunidade judaica ali.”
Fui completamente tomado de surpresa. Olhei para minha noiva e traduzi: “O Rebe sugeriu que viajemos ao Japão para eu me tornar o rabino da comunidade judaica.”
Ela disse algo semelhante a: “Pode ser mais perto ir para a lua!” Ela não tinha ideia de onde era o Japão, e nenhum de nós falava japonês. Não sabíamos por que o Rebe estava sugerindo que nos mudássemos para lá.
Ela disse não estar interessada, e transmiti a resposta ao Rebe: “Obrigado, mas não creio que estamos interessados em ir para o Japão.”
Apesar disso, por mais que eu desviasse a conversa, durante o restante da audiência o Rebe ficava voltando ao seu pedido. “Será maravilhoso para a comunidade, será bom para vocês e aprenderão muito,” disse ele. “Vocês não têm filhos, portanto não estão presos a um lugar com escolas judaicas. Ainda nem se casaram! Vão para o Japão, fiquem lá o tempo que quiserem e prestem serviços ao povo judeu. Você fala inglês, yidish e hebraico. Tem faculdade completa. Acho que deveriam ir para lá.”
O Rebe também disse: “Quando envio alguém para ser meu emissário, é uma passagem sem volta, eles não regressam. Mas vocês não precisam ficar lá para sempre.”
Apesar dos pedidos do Rebe, ao final dissemos: “Obrigado, mas não, obrigado.” Não estávamos interessados em ir e ponto final. O Rebe se levantou para nos dar uma bênção para o casamento. Deu-nos os melhores votos e acrescentou uma bênção para a paz em Israel. Ele me disse para contar para a família da minha noiva em Israel que todos ficariam bem e que, se houvesse guerra, Israel seria vitorioso.
Assim concluímos nossa audiência privada com o Rebe e viajamos para casa. Minha noiva e eu estávamos ambos surpresos pela conversa, mas logo a tiramos da cabeça.
Japão Novamente?
Pouco tempo depois recebi um telefonema do presidente da comunidade judaica do Japão. Ele ligou do aeroporto em Nova York entre dois voos e perguntou se seria possível eu correr até lá para tomar um café com ele. Eu não o conhecia e jamais ouvira falar nele, mas por curiosidade, fui até o aeroporto para encontrá-lo. Ali, ele pediu-me para ir ao Japão e ser rabino deles. Olhei para ele e disse: “Já ouvi isso antes. Não estamos interessados na oferta.”
Ele respondeu: “Quando eu voltar a Nova York, posso ligar para você?”
Eu disse que podia, e na verdade ele me telefonou quando estava perto de Nova York, e mais uma vez eu disse a ele que não estávamos interessados. Ele ligou uma terceira vez. A essa altura minha mulher e eu já tínhamos discutido a ideia e concordamos em ir por dois anos. Pensávamos que seria empolgante mudar por nós mesmos como um casal recém-casado e ter a oportunidade de visitar Cingapura, Coreia, Bangcoc, Hong Kong e China. Pensamos que teríamos uma aventura interessante e depois voltaríamos aos Estados Unidos.
Tragédia Durante os Preparativos
Quando estávamos ocupados fazendo as malas e procurando informações sobre a comunidade judaica japonesa, meu pai faleceu inesperadamente.
Quando estávamos sentando shiva minha mãe e eu ficamos surpresos por receber uma carta de condolências do Rebe, e ele enviou alguém para nos consolar pessoalmente. Não sei como o Rebe descobriu sobre o falecimento de meu pai, mas aquilo foi muito importante para minha mãe e para mim.
Eu ainda estava nos 30 dias de luto, a casa completamente lotada e estávamos para viajar em breve. Liguei para o escritório do Rebe para perguntar se eu poderia marcar uma audiência privada e recebi um encontro imediato.
A primeira coisa que fiz foi agradecer ao Rebe por enviar um visitante para consolar minha mãe e eu após o falecimento de meu pai. Disse a ele que tínhamos achado sua carta muito confortadora e que ficamos comovidos por ele a ter enviado.
Então discutimos minha mudança iminente, O Rebe sugeriu: “Você está indo ao Japão para ser o rabino, mas é muito jovem. Talvez seja uma ideia sábia deixar crescer a barba.”
Pensei que era interessante o Rebe dizer aquilo, pois os judeus japoneses na época eram basicamente vindos da Sibéria, e se vissem um jovem descendo do avião, perguntariam: “Onde está seu pai?” Atendi ao Rebe e deixei crescer uma longa barba que mantive durante todo o tempo em que fiquei no Japão.
O Rebe também perguntou: “O que acontecerá se você tiver uma questão séria sobre Lei Judaica? Como vai respondê-la?”
Expliquei que com telefones é possível receber respostas imediatas das principais autoridades em Lei Judaica.
Ele perguntou: “Para quem você vai ligar?”
Eu disse: “Qual é a sua sugestão?”
O Rebe disse que eu deveria chamá-lo ou a Rabino Moshê Feinstein, uma autoridade em Lei Judaica na geração passada. Eu disse a ele que seria melhor chamar Rabino Feinstein porque o Rebe era muito ocupado. Ele me deu o número de Rabino Feinstein e apresentou-me a ele, e fiquei muito agradecido. Embora a natureza das perguntas que eu recebia não fosse muito séria, mantive contato com Rabino Feinstein, sabendo que se surgisse uma questão importante, eu teria alguém com quem contar. O Rebe queria assegurar-se de que meus diplomas estavam Ok antes de eu viajar. Como eu seria o único rabino no Japão, ele queria garantir que eu não seria desafiado ou questionado. E de fato não fui durante nossa estada no Japão, e fui aceito como rabino da comunidade.
A Experiência Japonesa
Atuei como rabino durante dois anos e descobri que era algo tão fascinante, incomum e exótico que minha mulher e eu decidimos que não era hora de voltar para casa, ainda havia muito a fazer.
Ficamos por 20 anos! Foram os melhores anos da minha vida. Aprendi muito sobre mim mesmo – como ser humano, como americano e como judeu. Eu era o ponto de contato para todos ali no Oriente, e a maior parte do tempo o único rabino na Ásia. Se alguém na China ou na India estivesse interessado em judeus, Judaísmo ou na Bíblia, eu era o único número de telefone a chamar. Todo dia eu sabia que haveria um telefonema, mas não sabia quem ou o que seria, apenas que seria uma surpresa e uma experiência interessante.
O Oriente Hoje
Cheguei a Tóquio em 1968, há mais de 40 anos. A Ásia certamente mudou. O futuro do mundo de hoje é China, Japão e India. Minha comunidade em Tóquio era formada pela terceira geração de judeus russos. Eles não estão mais lá. Agora a maior parte dos membros da comunidade é formada por americanos e israelenses expatriados. No dia que chegam, eles sabem o dia em que partirão.
Hoje no Oriente quando você viaja para fora das grandes cidades, a única presença judaica é Chabad. Estive na China 25 vezes e conheço muito bem o país. Estive na India 20 vezes. Há rabinos Chabad em toda parte.
Minhas impressões sobre o Rebe
Em meus encontros com o Rebe fiquei impressionado e senti estar na presença de um gigante espiritual. Ele foi um gigante em suas habilidades mentais. Foi um gigante em seu estudo. Foi um gigante no âmbito de seu conhecimento. O Rebe estava familiarizado com tudo e se preocupava com todos. Com frequência um movimento é julgado após o falecimento de seu líder.
Muitas vezes o movimento falha porque o líder carismático não está mais ali. Com Chabad, a energia criada por esse líder carismático se manteve. A dedicação e devoção tem se mantido. Ainda há muita energia e entusiasmo. O legado do Rebe está vivo.
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