A porção da Torá de Vayishlach começa com a narrativa dramática de Yaacov sendo perseguido por seu irmão gêmeo hostil, Esav. Embora já estivesse acostumado a ser perseguido por seu inimigo, desta vez, após passar duas décadas com Lavan, as circunstâncias de Yaacov eram bem diferentes. Ele agora tinha uma grande família e acumulou uma riqueza imensa.

Ao saber que Esav estava vindo atrás dele novamente, Yaacov agiu rapidamente. Ele enviou mensageiros (que, segundo os comentaristas, eram na verdade anjos) com a seguinte mensagem: “Vivi com Lavan... e acumulei grande riqueza: bois, jumentos, rebanhos de ovelhas, servos... Vamos fazer as pazes.” 1

Infelizmente, os mensageiros retornaram com más notícias. “Esav está vindo ao seu encontro com 400 homens armados até os dentes!”

Aterrorizado, Yaacov se preparou para o confronto. Em uma tentativa desesperada de evitar a batalha, ele enviou um enorme presente para Esav, uma leva substancial de animais valiosos. Milagrosamente, Esav foi tocado pelo gesto, acalmou-se e, ao finalmente encontrar Yaacov, o saudou com um abraço e um beijo.

Observando a família numerosa de Yaacov, incluindo seus 11 filhos, Esav perguntou: “Quem são estes para você?”

“Estes são meus filhos,” respondeu Yaacov, “com os quais D'us me abençoou, seu servo.”

Ao nos aprofundarmos nesta narrativa, adquirimos uma apreciação profunda pelas lições de vida derivadas dessa história.

Vivendo com Lavan

Ao saber que seu irmão perverso, Esav, estava vindo ao seu encontro, que mensagem Yaacov enviou? “Tenho vivido com Lavan!”

O que Esav deveria fazer com essa informação?

A resposta está no comentário de Rashi, que nos incentiva a ler nas entrelinhas. Yaacov disse: "Im Lavan garti" – “Vivi com Lavan.” A palavra hebraica garti tem o valor numérico de 613, representando os 613 mandamentos da Torá. Esta foi a mensagem de Yaacov para Esav: “Vivi na casa de Lavan. Vivi na cidade de Aram Naharayim, onde todos são moralmente corruptos e perversos. E, mesmo lá, cumpri todas as leis da Torá. Não adotei os maus caminhos de Lavan. Não comprometi nem uma vírgula da minha vida judaica.”

Mas por que Esav ficaria impressionado com o fato de Yaacov ter permanecido fiel à Torá?

A explicação está no fato de que Esav queria mais do que apenas eliminar Yaacov; ele queria destruir o povo judeu. Ele pretendia garantir que não houvesse descendentes de Israel. Uma conversa mais profunda estava se desenrolando. Esav, de quem descendeu o Império Romano, estava dizendo a Yaacov: “Eu vou te matar. E sem você, seus filhos crescerão para se tornarem bons romanos.”

E Yaacov respondeu: “Você não vai me matar, e não influenciará meus filhos. Você pode ser um guerreiro superior, mas eu sou mais forte! Vivi com Lavan. Vivi em um antro de imoralidade, e, mesmo assim, veja os filhos que criei lá – bons meninos judeus! Cada um dos meus filhos usa uma kipá. Minha filha acende velas de Shabat!”

Resiliência Programada em Nosso DNA

Esav ficou chocado.

“Como você conseguiu criar filhos assim em um lugar como aquele?” ele perguntou. “Você não tinha infraestrutura judaica – sem sinagogas, sem escolas judaicas, nem um único restaurante casher! Qual é o seu segredo?”

“D’us me abençoou com esses filhos,” respondeu Yaacov, usando a palavra hebraica chanan. As três letras que compõem a palavra chanan – chet, nun, nun – formam um acrônimo para os três mandamentos centrais de um lar judaico: chalá, representando as leis de cashrut; nidá, representando as leis de pureza familiar; e ner, representando as velas do Shabat.

Quando criamos nossos filhos na observância da cashrut, na pureza familiar e no Shabat, nenhum Esav – nenhum inimigo físico ou espiritual do povo judeu – pode exercer poder sobre nós.

Lutando com Anjos

A parashá desta semana também contém a narrativa fascinante da luta de Yaacov com o anjo de Esav, durante a qual o anjo deslocou a coxa de Yaacov.

Pode-se perguntar: por que o anjo não deu um golpe direto no rosto?

Há um simbolismo profundo aqui. O anjo de Esav percebeu que não poderia derrotar Yaacov diretamente, então, em vez disso, ele mirou os "lombos de Yaacov" – seus filhos. 2

“Não posso derrotá-lo”, admitiu o anjo. “A vitória está além do meu alcance. Em vez disso, vou mirar em seus filhos. Tentarei desviá-los através da assimilação, atraindo-os a abandonar os ensinamentos da Torá e a observância das mitsvot.”

Assim, Yaacov e o anjo travaram uma batalha feroz, culminando com o anjo cedendo e reconhecendo a vitória de Yaacov.

E assim, até a chegada do Mashiach, o povo judeu continuará aqui, reconhecidamente judeu, orgulhosamente judeu, apesar dos 400 terroristas de Esav.

Salvo pela Associação

Meu pai, o rabino Sholom B. Gordon, de abençoada memória, serviu como rabino da Congregação Ahavath Zion, a maior congregação ortodoxa em Newark, Nova Jersey.

Um membro do conselho da sinagoga uma vez procurou meu pai com um problema sério. Sua jovem filha havia chegado em casa e declarado: “Pai, vou me tornar observante do Shabat!”

O pai quase desmaiou. “Você está louca?!” exclamou. “Shomer Shabat? Observante do Shabat? Você está se inscrevendo para uma vida de pobreza! Você nunca vai ganhar a vida.”

Devastado, ele foi até meu pai em desespero, buscando sua ajuda. “Rabino,” disse ele, “sou seu amigo. Preciso que você me faça um grande favor. Você precisa salvar minha filha de um destino certo! Ela decidiu tornar-se shomer Shabat! O irmão dela é médico, e sua irmã trabalha no Departamento de Estado – e ela quer ser shomer Shabat?! Por favor, rabino, faça-a mudar de ideia.”

“Deixe-me ver se entendi,” disse meu pai. “Você quer que eu, o rabino, convença sua filha a não observar o Shabat?!”

Então, utilizando seu incrível senso de humor, meu pai compartilhou um ensinamento do Midrash: Esav se aproximou de Yaacov com a intenção de feri-lo, mas eles acabaram se abraçando e se reconciliando.

O que causou essa mudança repentina de atitude? O Midrash explica que um grupo de anjos se aproximou e começou a bater em Esav. “Não me batam!” gritou Esav. “Sou neto de Avraham!” Mas o anjo principal insistiu em continuar. “Sou filho de Yitschac!” gritou Esav, mas o anjo principal persistiu. “Sou irmão de Yaacov!” lamentou Esav, e, ao ouvir isso, o anjo principal ordenou: “Parem de bater. Ele é irmão de Yaacov; ele merece proteção total.”

Essa foi a história, segundo o Midrash, por trás da mudança de atitude de Esav.

“Após 120 anos,” continuou meu pai, “quando você chegar ao céu para o dia do julgamento, os anjos vão revisar sua vida, ver que você não foi perfeito e começar a bater em você. ‘Parem!’ você gritará. ‘Meu filho é médico!’ Mas eles continuarão batendo. ‘Parem!’ você implorará. ‘Minha filha trabalha no Departamento de Estado!’ Mas eles continuarão batendo. ‘Parem de me bater!’ você gritará. ‘Minha filha é shomer Shabat!’ e as batidas pararão imediatamente.

“Você realmente quer que eu tire sua fonte de proteção? Não farei isso.”

Com seu humor característico e abordagem sábia, ele trouxe essa negociação a uma conclusão maravilhosa. A menina cresceu para se tornar uma jovem temente a D’us, que construiu uma linda família judaica tradicional. Essa foi a mensagem que Yaacov estava enviando a seu irmão Esav. “Sou forte; seus 400 terroristas não me assustam. Nas condições mais difíceis, mantive-me fiel à Torá e criei uma geração de filhos que seguem o mesmo caminho!”

Prescrição Divina para a Paz

Em 1977, meu pai foi a Encino, Califórnia, para celebrar o nascimento de nosso filho Eli. Durante essa visita, ele compartilhou uma mensagem poderosa com nossa comunidade. Naquela época, Egito e Israel estavam dando os primeiros passos que eventualmente levaram aos Acordos de Camp David, e o mundo judaico estava repleto de um espírito de otimismo.

“Apertar as mãos com seu inimigo e cantar Hava Naguila no gramado da Casa Branca certamente é muito bom,” comentou meu pai, “mas a Torá nos ensina o que realmente traz a paz duradoura para Israel.” Para isso, ele disse, precisamos apenas internalizar o versículo dos Salmos: “E que você veja filhos [nascidos] dos seus filhos—paz sobre Israel.” 3

Disse meu pai: “Trazer mais uma criança judia a este mundo e criá-la como judeu fará mais pela paz no Oriente Médio e trará mais paz para Israel do que qualquer outra coisa.”

Devemos criar crianças judias onde quer que estejamos, mesmo nos ambientes espiritualmente mais desolados. Devemos ser fortes, resilientes e destemidos. Embora sempre exista um Esav, D’us estará sempre lá por nós, enviando uma mensagem que ajusta nossas atitudes. Nossa responsabilidade é garantir a criação de uma geração após a outra, com filhos e netos conectados à Fonte.