Quando as bênçãos começaram a sair de sua boca, Bilam elevou sua voz o mais alto que pôde. Esperava evocar a inveja e hostilidade das nações gentias ao escutarem louvores ao povo judeu.

As bênçãos de Bilam estavam encobertas como parábolas poéticas. Proclamou:

"Balac, o rei de Moav trouxe-me de Aram, das antigas montanhas, dizendo, 'Venhamos, e amaldiçoe (para) mim Yaacov e venha, desperte a ira [de D'us] contra Israel.'"

O profundo significado das palavras de Bilam era: Você, Balac, e eu, somos os mais ingratos dos homens. Ambos devemos nossas vidas aos judeus. Como, então, você pôde trazer-me de Aram para amaldiçoá-los? Foi neste exato local que seu patriarca, Yaacov, ficou com meu patriarca, Lavan. Antes da chegada de Yaacov, Lavan não tinha filhos. Nasci apenas por causa dos méritos de Yaacov.

Você, Balac, sobreviveu por causa das "antigas montanhas," os patriarcas desta nação (chamados de "montanhas"). Você é um moabita, um descendente de Lot. Se não fosse por seu patriarca Avraham, Lot não teria sido resgatado da destruição de Sodoma, e você não estaria vivo hoje.

Mais que isso, não percebe que D'us protege esse povo? Ele prometeu a seu patriarca Avraham: "Os que te amaldiçoarem, Eu os amaldiçoarei." Portanto, alguém que os amaldiçoa está se amaldiçoando. Quando enviou-me a mensagem: "Venha, amaldiçoe (para mim) Yaacov", você na verdade indicava: "Venha, amaldiçoe-me (amaldiçoando Yaacov)."

"Como posso amaldiçoar, enquanto D'us não amaldiçoa [mas ao contrário, Ele os abençoa]?! E como posso despertar a ira [Divina] contra eles, se D'us não está irado?!"

Parece que D'us abençoa os judeus mesmo quando merecem uma maldição. Assim, de que vale minha tentativa de amaldiçoar os judeus, se D'us não deseja que eles sejam amaldiçoados?

Das afirmações acima, de Bilam, podemos discernir seus pensamentos. Em seu coração, implorava a D'us que o deixasse pronunciar uma maldição. D'us, no entanto, frustrou suas intenções, e assim ele proclamou que ninguém poderia amaldiçoar esta nação.

Bilam decidiu então encontrar culpa e defeito nos patriarcas, para que o mal recaia sobre os judeus por causa deles. Por quê foi esta sua primeira maldição?

Duas pessoas entraram na floresta para derrubarem uma árvore. O mais tolo começou a podar um galho após o outro, um trabalho bastante tedioso. O mais esperto raciocinou: "Se pudermos encontrar as raízes desta árvore e fizermos um esforço supremo para cortá-la, conseguiremos também podar todos os seus galhos."

Assim, Bilam, o perverso, pensou: "Em vez de amaldiçoar cada tribo separadamente, erradicarei as raízes. Se encontrar alguma impureza na origem deste povo, eu a amaldiçoarei, e desta forma, prejudicarei o povo inteiro."

Em seguida Bilam concentrou seus pensamentos em nossos patriarcas, com o a intenção de encontrar neles alguma jaça. Mas ao contrário, uma bênção brotou de seus lábios, pois a origem dos judeus era pura:

"Do topo das rochas eu o vejo e das colinas eu o contemplo."

Vejo os judeus descenderem de patriarcas sagrados, chamados de "rochas", e das sagradas matriarcas, chamadas de "colinas". (Como as rochas no mundo físico, os patriarcas são a fundação espiritual do mundo.)

Desde a origem este povo é santo, suas almas anseiam por santidade. Por isso, nunca se assimilarão totalmente como os não-judeus (mesmo se ficarem associados temporariamente.)

Eles guardam e cuidam cuidadosamente de sua origem:

"Eis que o povo viverá na solidão e não será contado entre as nações."

O povo judeu não se casará com não-judeus, tampouco adotarão as crenças e culturas dos não judeus à sua volta. Recusam-se a profanar o Shabat, a abolir o berit milá (circuncisão), ou a adorar as divindades dos não-judeus.

"Quem pode contar o pó de Yaacov?"

Quem pode contar o número de mitsvot que um judeu realiza desde a hora em que nasce até a hora em que retorna ao pó?! Já está circunciso na tenra idade de oito dias. Se for um primogênito, é redimido por um cohen quando atinge a idade de trinta dias. Aos três anos, seus pais começam a educá-lo em Torá e mitsvot; aos treze, toma sobre si a responsabilidade de todas as mitsvot. Um judeu nunca se senta para uma refeição sem a bênção de "hamotsi"; e após a refeição, novamente recita bênçãos.

Quem pode amaldiçoar uma nação cujos membros dedicam suas vidas a cumprir os mandamentos de D'us?

Quem pode contar o número de mitsvot que um judeu realiza, mesmo com materiais inferiores, como terra e pó?

Quando o judeu ara, observa a proibição de "Não ararás com um boi e um burro juntos," e quando semeia, "Não semearás teu campo com duas espécies de sementes." Ele utiliza cinzas para a mitsvá da vaca vermelha, e pó para as águas de Sotá.

Quem pode amaldiçoar uma nação que cumpre até mesmo a mais pequena das mitsvot de D'us?

Quem pode contar as pequenas crianças judias que, como D'us predisse, "multiplicar-se-ão como o pó da terra"? (Todas as contagens no deserto excluíam os varões com menos de vinte anos de idade.)

Através da bênção de Bilam podemos discernir a maldição que elaborara em seu coração; ele desejava diminuir o número de judeus.

"E o número da quarta parte de Israel."

Quem pode contar a população de mesmo uma das quatro divisões de estandartes dos judeus?

De acordo com outra interpretação, Bilam disse: "D'us conta a semente dos judeus, esperando que nasça um tsadic."

Quando Bilam pronunciou estas palavras proféticas, comentou intempestivamente: "Como pode D'us, Que é santo, e seus anjos, que são santos, mesmo olhar para tais assuntos?"

Como punição, Bilam ficou cego de um olho.

"Que eu morra a morte dos justos e que meu fim seja como o deles!"

Ao perceber que em vez de amaldiçoar os judeus estava involuntariamente abençoando-os repetidamente, Bilam decidiu que seria melhor morrer a continuar sofrendo tal agonia!

Entretanto, o espírito de profecia que falava através de seus lábios também elevou esses pensamentos, e ele encontrou-se pedindo a morte dos judeus justos e virtuosos, que entrassem no Paraíso depois de partir deste mundo.

Este é um dos versículos nos quais a Torá Escrita expressa a crença fundamental de que a alma continua a existir depois da morte física, e que os tsadikim experimentam a plenitude e felicidade eternas do Paraíso. Por isso, Bilam teria desejado a morte dos judeus justos.

Balac ficou escutando as palavras de Bilam com cada vez mais assombro e consternação.

"O que você fez comigo?" - censurou-o. "Eu lhe convoquei para amaldiçoar meus inimigos, e você os abençoa!"

"Não posso fazer nada a esse respeito," replicou Bilam, "pois sou forçado a falar o que D'us coloca em minha boca."

Quando os príncipes de Moav ouviram essas palavras, perceberam que Bilam não conseguiria amaldiçoar os judeus. A maioria partiu, apenas alguns permaneceram com Balac, na vã esperança de que Bilam ainda obtivesse êxito.

Balac disse então a Bilam: "Deixe-me levá-lo a outra colina, onde estou tendo a visão, através de meus poderes mágicos, que os judeus, um dia, sofrerão uma trágica perda. Talvez essa calamidade seja resultado de minha maldição!"

Balac levou Bilam à montanha sobre a qual Moshê estava destinado a falecer.

"Medite sobre os perversos do povo," aconselhou Balac a Bilam, "e não sobre os tsadikim. Talvez você consiga prejudicá-los."

Bilam instruiu Balac a erguer novamente sete altares, e a sacrificar um touro e um carneiro sobre cada um.

"Permaneça aqui para oferecer os sacrifícios," disse Bilam a Balac. "Eu ficarei mais adiante, para que D'us se dirija a mim."

Ao ser instruído por D'us para conceder mais bênçãos sobre os judeus, não quis voltar a Balac. "Por que devo voltar e deixá-lo irado?" - disse.

Contudo, D'us forçou Bilam a voltar e pronunciar a próxima bênção.

Ao ver Bilam se aproximando, Balac perguntou-lhe cinicamente: "O que D'us, a Quem você é obviamente subserviente, lhe disse para profetizar?"

Por conseguinte, Bilam começou seu discurso censurando Balac por essas palavras desrespeitosas.