Quando chegou a hora de Moshe terminar sua jornada terrestre, a Torá estabeleceu suas instruções finais:
“O Senhor falou a Moshe naquele mesmo dia, dizendo: Suba o Monte Avarim [para] o Monte Nebo … e morra na montanha…” 1
O que significam as palavras “naquele mesmo dia” ?
Rashi compara este verso com dois casos anteriores onde a mesma frase é usada.
A primeira é quando a Torá diz que Noach entrou na arca “naquele mesmo dia”. 2 Nesse caso, as pessoas ao redor de Noach haviam jurado impedi-lo de entrar na arca à força, e até mesmo cortá-la em pedaços, para evitar que o dilúvio ocorresse. Portanto, D'us instruiu Noach a entrar na arca “em plena luz do dia”, como se desafiasse qualquer um a tentar intervir.
A segunda ocasião em que a frase “naquele mesmo dia” é usada é quando os israelitas deixaram o Egito. 3 Aqui também, muitos egípcios juraram que impediriam a saída do povo judeu por meio do uso de armas. Em resposta D’us, os fez sair "no meio do dia", desafiando qualquer um a tentar ficar em seu caminho.
Da mesma forma, em nosso caso, Rashi interpreta “naquele mesmo dia” como “no meio do dia”. Ele explica que o versículo pretende transmitir que Moshe iria terminar sua vida naquele dia, quer o povo gostasse ou não, pois quando os israelitas souberam da morte iminente de Moshe , muitos deles declararam que não deixariam isso acontecer.
Eles protestaram: “O homem que nos tirou do Egito, dividiu o Mar Vermelho para nós, trouxe o maná, fez bandos de codornas voarem até nós, trouxe o poço e nos deu a Torá – nós não o deixaremos (ir para seu lugar de descanso final)!”4
Assim, D'us instruiu Moshe a subir a montanha “no meio do dia”, deixando claro que eles não tinham poder sobre o que ocorreria.
Em que eles estavam pensando?
Embora a explicação de Rashi forneça uma razão para as palavras “naquele mesmo dia”, ela também cria várias dificuldades. Mais significativamente, como os israelitas poderiam imaginar que seriam capazes de impedir a morte de Moishe? D'us é o Criador supremo da Vida, e não há como um ser humano impedir que outro morra! Enquanto os pares de Noach ou os egípcios que se opunham ao Êxodo poderiam ter tentado usar a força para atingir seu objetivo, não havia realmente nada que alguém pudesse ter feito para impedir que Moshe morresse se D'us retornasse a sua alma.
Também é difícil entender o que Rashi ganha ao nos contar sobre as outras duas situações em que a frase “neste mesmo dia” é usada. Quando ele dá sua explicação sobre a entrada de Noach na arca, ele não delineia as outras duas ocasiões em que essa frase é usada. Por que agora, em sua terceira aparição, Rashi decide elaborar tão extensivamente?5
Justa Indignação
O Rebe explicou que a razão para o comentário mais detalhado e complexo de Rashi é porque Rashi está realmente ciente do problema inerente colocado pelo texto. Embora as palavras “naquele mesmo dia” sejam claramente supérfluas e sugiram que D'us pretendia especificamente que a morte de Moshe acontecesse no meio do dia – essa explicação é altamente problemática. Nos outros dois casos – oponentes de Noach e do Êxodo – podemos supor que aqueles que tentaram intervir eram pessoas perversas que não tiveram problemas em se opor à vontade de D'us. Em contraste, os israelitas na época da morte de Moshe poderiam ser considerados justos. Por que pensaríamos que eles tentariam transgredir tão abertamente o plano do Todo-Poderoso?
Dado que é contra-intuitivo que os israelitas tivessem procurado se opor a uma instrução divina clara, Rashi sentiu-se compelido a começar compartilhando o precedente para seu entendimento.
Mas como os israelitas teriam pensado que seria possível impedir a morte de seu líder? Rashi não explica isso, pois um olhar mais atento ao texto da Torá torna óbvio. Moshe é instruído a subir a montanha e ele deveria dar seu último suspiro assim que chegasse ao local de seu eventual enterro. Moshe não poderia morrer até que chegasse ao local designado. Assim, tudo o que os israelitas teriam que fazer para impedir (ou pelo menos atrasar) a morte de Moshe seria bloquear sua subida à montanha.
No entanto, isso ainda levanta a questão: por que os israelitas justos contemplariam desafiar a D'us?
Uma instrução direcionada
Rashi explica que os israelitas sentiam grande lealdade a Moshe por tudo que ele havia feito por eles. Sentiram que era seu dever não abandonar “O homem que nos tirou do Egito, dividiu o Mar Vermelho para nós, trouxe o maná, fez bandos de codornas voarem até nós, trouxe o poço e nos deu a Torá.” O judaísmo atribui grande importância à virtude da gratidão, então os israelitas se sentiram justificados em mostrar sua gratidão a Moshe.
Embora a gratidão seja de fato uma virtude importante, ainda parece difícil aceitar que qualquer israelita imagine que isso lhe dê o direito de agir em conflito direto com a vontade divina claramente expressa. Afinal, D'us não instruiu explicitamente a Moshe que ele deveria subir a montanha?
Mas esse é precisamente o ponto!
Somente Moshe foi instruído a subir a montanha. Ao objetar, eles não estavam indo contra nenhuma instrução que haviam recebido de D'us.
Rashi insinua isso quando cita: “D'us falou com Moshe”. Foi a Moshe que foi dito que era hora de ele morrer ; no que dizia respeito aos israelitas, isso não era assunto deles.
Temos aqui uma grande lição sobre a importância da gratidão, um dos valores fundamentais do judaísmo. Quando as pessoas nos ajudam ou nos mostram bondade, mostrar apreço deve ser nossa principal prioridade. Devemos olhar em volta para todas as pessoas que continuam a fazer contribuições importantes para nossas vidas e nos perguntar: quando foi a última vez que lhes disse o quanto aprecio tudo o que fazem por mim?
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