Sento-me aqui na mesa da sala de jantar com minha face coberta de lágrimas. Como eu cheguei aqui?
Não é tão simples.
Eu cresci em uma cidade pequena. Havia apenas alguns judeus, incluindo minha família. Sou filha única. Minha mãe é filha única. A mãe dela era a mais nova de filhos. Ela e o marido, meu avô, são sobreviventes do holocausto.
Minha mãe nasceu na Grécia, como sua mãe, e a mãe de sua mãe. A família do meu pai também é da Grécia, mas a família dele veio para a América algumas gerações antes. Já ouvi isso muitas vezes: “judeus gregos? Eu não sabia que havia judeus gregos!”
Gerações de volta, esses judeus gregos não eram gregos; eles eram espanhóis. Um dos lugares para onde os judeus fugiram durante a Inquisição Espanhola foi o Império Otomano, que permitiu que os judeus vivessem vidas relativamente pacíficas em suas fronteiras. Esta é a Grécia atual. Os judeus se reuniram principalmente em uma cidade portuária chamada Thessaloniki, ou Salonica.
Havia milhares de judeus vivendo em Salônica no início dos anos 40. Mas até o final da década, poucos restaram. É por isso que você nunca ouviu falar dos judeus gregos. Mais de 90% deles foram assassinados quando a Alemanha invadiu.1
Meu avô foi levado para Auschwitz com seu irmão. Ele ficou lá por um curto período de tempo e depois foi levado para muitos locais diferentes como trabalhador. Ele limpou o gueto de Varsóvia (é claro, sem saber onde ele estava na época), ele experimentou e sobreviveu a uma marcha da morte, ele estava na Polônia e na Alemanha e, graças a D'us, ele sobreviveu milagrosamente.

A história da minha avó também é milagrosa. Ela deveria ser levada nos vagões para uma certa morte às 4 h de uma manhã. Às 17h do dia anterior, ela, sua mãe e alguns de seus irmãos receberam documentos italianos e ficaram livres da deportação. Ela tem uma história longa e complicada, mas acabou se escondendo nas montanhas com parte de sua família. Toda a sua família - seus irmãos e irmãs, sobrinhas e sobrinhos que foram deportados naquele dia – para nunca mais voltar. Sua mãe também era de uma família numerosa. Minha Nana disse que, no total, perdeu 170 familiares próximos no Holocausto.
Avançando 50 anos para a minha infância… Embora meus avós tivessem uma forte identidade judaica - na verdade, eles viviam em uma cultura completamente judaica - eu era uma de dois judeus na minha escola primária e não sabia quase nada sobre o que isso significava.
Mas havia uma coisa que minha mãe sempre me dizia para fazer: recitar a prece do Shemá à noite. O que sempre fiz. Na verdade, eu não pronunciaca apenas o Shemá, mas também conversava com D'us. Eu colocava minha cabeça embaixo do travesseiro e contava a D'us tudo sobre o meu dia. Eu sempre senti que D'us estava escutando.
O que acontece depois de apenas duas gerações de uma exposição limitada à observância da Torá? Quando eu tinha 18 anos, fui para a faculdade e larguei o pouco em que me apegara. Mas havia uma coisa que eu nunca abandonei. Eu sempre falava o Shemá à noite.
Quando um sério desafio surgiu no meu segundo ano de faculdade, eu falei o Shemá. E rezei. Quando o desafio se tornou mais desafiador, eu falei o Shemá. Meu Shemá me levou a visitar o Chabad no campus, que se tornou meu local de refúgio. Eu continuei a dizer o Shemá.
De alguma forma, acabei aqui. Nesta cidade judaica em expansão. Uma esposa e mãe, e uma mulher que se considera parte da comunidade Chabad também.
Minha história realmente se conecta aos meus avós? Além do fato de serem meus avós? Até alguns dias atrás, eu realmente não pensava assim.
Então eu descobri uma gravação do meu avô de 1981. Foi a primeira vez que eu ouvi a voz dele. Sentei e o ouvi sendo entrevistado por uma hora. No final, o entrevistador fez uma pergunta: você alguma vez perdeu sua fé?
Ele respondeu: “Nunca. Todas as noites, eu falei o Shemá.” Mesmo nas barracas de Auschwitz.
E agora eu sei por que estou aqui. Por que me tornei a mulher que sou. Como fui guiada a essa vida incrível. Foi pelo Shemá do meu avô.
E então, eu choro aqui por todas as vítimas do Holocausto. Pelos 170 membros da família da minha avó, que eu nunca conheci. Eu sei que suas orações, suas lágrimas, suas boas ações e seus Shemás continuarão vivos. Mesmo se percebemos isso apenas 70 anos depois.
Gosto de pensar que foi decretado nos céus: porque você, Isaac Sevi, disse Shemá em Auschwitz, sua única neta também recitará o Shemá.
Clique aqui para comentar este artigo