Cada pedaço de história traz imagens à mente de Roman Kent. O vagão estacionou na entrada no Museu da Herança Judaica, em Manhattan . Parecia aquele que o levou a Auschwitz.
"Acordei cercado de centenas de pessoas", lembra ele. "Graças a Deus estava com a minha família, mas não conseguia me mexer. Ficamos amontoados daquele jeito por quatro dias e três noites. Não havia balde para as nossas necessidades. Mal tinha água".
Dentro do museu, ele identificou um caldeirão - o mesmo tipo usado para fazer a sopa de nabo rala entregue diariamente aos famintos, junto com um pouco de pão. "Você tinha que calcular quando entrar na fila. No fim, colocavam vegetais na sua sopa. Mas havia o risco de não terem mais sopa", diz.
O museu abre uma exposição sobre o período que irá também, inevitavelmente, reabrir feridas. Intitulada "Auschwitz, não muito tempo atrás, não muito distante", a mostra conta a história do campo de concentração e do Holocausto a partir de 700 itens, a maioria trazidos de Auschwitz, onde morreram 1,1 milhão de pessoas - dessas, um milhão de judeus. A mostra itinerante, produzida na maior parte pela empresa espanhola Musealia e com apoio do Memorial e Museu de Auschwitz-Birkenau, ficou em Madrid por 14 meses e recebeu mais de 600 mil visitantes.
O museu permitiu que a reportagem acompanhasse a visita de Kent, sobrevivente do Holocausto e presidente do Grupo Americano de Judeus Sobreviventes e de Seus Descendentes . Aos 90 anos, frágil, Kent parecia decidido quando começou a ser guiado pelas galerias. Sua postura mudou quando ficou diante das malas tomadas dos judeus quando chegavam ao campo e eram divididos em dois grupos. Um era de trabalhadores; o outro, enviado à morte imediatamente. Kent lembra dos nazistas gritando para sua família: "Vá rápido! Vá rápido!"
Surras nos homens e nas mulheres. Os cachorros que mordiam. Os cavalos atropelando os prisioneiros. Essa foi a última vez que ele viu a mãe: no momento em que os judeus eram divididos.
O museu espera receber vários visitantes como Kent - Nova York abrigava 50 mil sobreviventes do Holocausto até 2017. Desde então, muitos morreram.
O museu afirma que a tentativa de retratar as brutalidades passadas é urgente num momento de crescimento do antissemitismo nos EUA.
Elizabeth Edelstein, vice-presidente do Museu da Herança Judaica, diz que a instituição conversa frequentemente com sobreviventes sobre "quais aspectos dessa dolorosa história eles acham que precisam ser explorados, e sobre como o conteúdo reflete suas experiências".
Kent passou grande parte da vida adulta chamando a atenção para o que foi feito aos judeus durante décadas de relativo silêncio após a guerra. Ele retornou a Auschwitz, que hoje é um museu, várias vezes. Durante sua visita ao museu, ele parou para observar uma seção com postes cercados de arame farpado ("Quase sempre eram eletrificados"), beliches de três andares, uniformes listrados e sapatos confiscados de mulheres e crianças.
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