“Um bebê é programado para ser amado pela mãe. Um bebê, uma mãe. É por isso que os bebês não se desenvolvem bem em instituições. Você e seu bebê começam uma canção, e somente os dois têm aquela canção”, diz Chaya ben Baruch, de 52 anos, que mora com sua família em Tzfat (Safed), Israel.

Chaya é mãe de seis filhos biológicos, incluindo um filho, Avichai, com 16 anos, que tem síndrome de Down. Além disso, ela e o marido, Yisroel, são também pais adotivos de mais três crianças com síndrome de Down – duas meninas e um menino, Keren, Shalhevet e Ori, com idades de 15, 10 e 2 anos. Os Ben Baruch se tornaram pais das três crianças com síndrome de Down quando essas foram tragicamente abandonadas pelos pais, ao nascer ou logo em seguida. Eles resgataram essas crianças de destinos incertos, pois no passado, poucas famílias em Israel estavam dispostas a adotarem crianças com Down. (Outro bebê com síndrome de Down, Nachum, foi cuidado pelos Ben Baruch dos seis dias de idade até sete meses. Infelizmente na primavera passada, Nachum faleceu subitamente.)

Chaya Ben Baruch fundou uma organização chamada Birkat Haderech para encorajar mulheres a criar seus filhos com síndrome de Down, ou deixar Chaya ajudá-las a encontrar um lar amoroso para os bebês. A organização tem uma lista de famílias preparadas para abrigar bebês com Down, e entra em contato com elas quando há um bebê precisando de um lar.

Avichai (esquerda) e Keren (direita)
Avichai (esquerda) e Keren (direita)

“A alegria que recebemos é imensa. As pessoas precisam entender que a menos que haja um grande problema médico, o cuidado diário de um bebê com síndrome de Down não é diferente de qualquer outro bebê. Ocorre apenas que seu desenvolvimento demora mais tempo. Mais tempo para deixar as fraldas… mais tempo para andar. Mas o que há de tão ruim sobre isso, para você as abandonar em um hospital?”, diz Chaya.

“As pessoas poderiam pensar que temos nos sacrificado muito para criar essas crianças. Elas estão erradas”, diz Chaya com um sorriso. “Para cada grama de esforço que damos a essas crianças, elas devolvem dez vezes mais. Os abraços dados com plenitude, os beijos de todo coração e ainda mais, a maneira engraçada de apreciarem a vida. As pessoas veem nossos filhos e sabem que alguns são nossos filhos biológicos e alguns são adotados ou cuidados. Quando as pessoas perguntam quem é ‘nosso’, respondemos com frequência: ‘Todos eles são.’”

Chaya nasceu em Far Rockaway, New York, de pais americanos; os ancestrais de seu pai eram chassidim Satmar na Hungria. Seu lar não era observante, mas ela e seus irmãos frequentavam uma escola religiosa. Aos dezessete anos, Chaya terminou o ensino médio e continuou seus estudos na State University de New York em Buffalo durante dois anos. No seu terceiro ano de faculdade, ela se transferiu para a Universidade do Alasca, em Fairbanks – intrigada pelo seu programa de mamíferos marítimos, porque ela queria estudar comportamento maternal marítimo, cujo cuidado com os filhos durava um ano inteiro após o nascimento.

Na Universidade do Alasca, Chaya se formou em Ciências Biológicas e casou-se com seu professor de psicologia. O casal teve dois filhos e uma filha. Chaya completou um curso educacional e tornou-se uma educadora enquanto dirigia uma escola Montessori na própria casa, com suas três crianças frequentando. O casal se divorciou, mas Chaya permaneceu em Fairbanks, Alasca, para que os filhos pudessem permanecer em contato com o pai.

Ela casou-se novamente, e seu marido, Yisroel, trabalhava como conselheiro de jovens no sistema prisional do Alasca. Chaya teve mais dois filhos. Quase na mesma época, seu pai e o pai de seu marido faleceram. Quando nasceu seu sexto filho, em 1991, o casal deu-lhe o nome de Avichai, que significa “Meu pai vive”. Ela o levou para casa, cuidou dele e se apegou emocionalmente com ele antes mesmo que ele fosse diagnosticado com problemas cardíacos, além da síndrome de Down.

“Quando os médicos me disseram que meu bebê precisava de uma cirurgia no coração, a questão da síndrome de Down tornou-se secundária. Eu queria apenas que meu bebê vivesse. E fora uma bênção que eu tenha me unido a ele antes de saber que ele tinha síndrome de Down. Não lamentei pelo filho ‘perfeito’que eu esperara. Aprendi a ver um ‘perfeito’ diferente”.

Após o nascimento de Avichai, Chaya começou a acender velas de Shabat com os castiçais de sua bisavó, que tinham chegado da Hungria aos Estados Unidos com a sua avó paterna, Ethel. Chaya tinha levado esses preciosos castiçais com ela desde Far Rockaway até o Alasca, quando tinha dezoito anos. “Lembro-me da Vovó Ethel acendendo velas de Shabat com esses castiçais e trazendo a luz dos céus para dentro de seu lar”,diz Chaya. “Eu também queria trazer essa luz para nosso lar nas noites de sexta-feira”.

Chaya com Ori
Chaya com Ori

Depois que Avichai passou pela cirurgia no coração aos três meses de idade, Chaya e seu marido foram a uma conferência para profissionais e pais de pessoas com incapacidades. “Ouvimos uma história de gêmeos que tinham morrido aos dezoito anos devido a doença congênita. Eles tinham escrito um diário da família, e através dessas anotações, sua mãe pôde ver como era maravilhoso que cada um tivesse o outro. Cheguei em casa vindo da conferência e perguntei ao meu marido se podíamos adotar outro bebê com síndrome de Down para que a vida do nosso filho fosse melhor”.

O casal registrou-se numa agência de adoção especial, naquela época a única que lidava com adoção de crianças com Down. Foi durante o primeiro aniversário de Avichai que Chaya recebeu o telefonema que levou Keren para sua vida. Um casal em Anchorage tinha tido uma filha com a síndrome e não queria criá-la.

“Os pais biológicos vieram para trazer-nos o bebê. Ela estava com nove dias de idade, linda, olhos azuis, e loira. Eles estavam acompanhados por um irmão de quatro anos e uma avó. Chegaram às 10h da manhã e saíram às 2h da tarde, e Keren desde então tem sido nossa. Eu amamentava Avichai e ela juntos. Eles seguravam as mãos enquanto eu os segurava.

No decorrer dessa época, enquanto os Ben Baruch estavam se tornando mais próximos da observância judaica, procuraram os emissários Chabad em Anchorage, Rabino Yossi e Esti Greenberg em busca de conselho, conhecimento e apoio em sua jornada espiritual. “Chabad é realmente a única coisa judaica aqui no Alasca. Yossi, que vem de Bnei Barak, Israel, costumava brincar que fora enviado ali pelo Rebe Lubavitch para aquecer os ‘congelados escolhidos’. Sua esposa Esti vem de Detroit. O único problema é que viajar de Fairbanks até Anchorage leva oito horas de carro. Mesmo assim, íamos visitar os Greenberg o máximo possível, e às vezes, eles também vinham nos ver.”

Da direita para a esquerda - Avichai, Shalchevet e Keren
Da direita para a esquerda - Avichai, Shalchevet e Keren

Os Ben Baruch começaram a investigar a possibilidade de morar em Israel.
Se pelo menos os avós dissessem aos novos pais que tinham tido um bebê com síndrome de Down: ‘Estou tão orgulhoso por D'us ter escolhido vocês para terem este filho!”

O marido de Chaya foi numa viagem rápida para Israel, procurando por uma comunidade que a família pudesse chamar de lar. Eles achavam que a vida no kibutz seria boa para eles. Yisroel foi de kibutz a kibutz, mas ninguém estava disposto a aceitar uma família com dois filhos deficientes. Finalmente, Yisroel recebeu uma bênção de um rabino em Jerusalém, que disse a eles: “Não se preocupe sobre coisa alguma. Apenas venham – vocês verão milagres e maravilhas!”

No verão de 1995, os Ben Baruch chegaram ao Centro de Absorção em Tzfat, ao norte de Israel. “Lembro-me dos nossos primeiros dias, com Yisroel carregando Avichai (quase quatro anos) nas costas e segurando Keren (quase com três) em seus braços. As pessoas atravessavam para o outro lado da rua ao avistarem nossa família, para que não pegassem fosse o que fosse que tínhamos”, lembra Chaya. “Hoje, as pessoas atravessam a rua apenas para dar alô aos meus filhos”.

“Quando estávamos procurando uma pré-escola para Avichai, queríamos integrá-lo num jardim de infância, mas nenhuma professora em nossa região queria aceitá-lo. Finalmente, conheci Rachel. Eu disse a ela que queria que aceitasse meu filho. Ela disse, sem piscar: ‘O prazer é meu!’ Surpreendentemente seu emprego anterior tinha sido tomar conta de bebês abandonados com síndrome de Down no hospital. D'us tinha nos enviado um de seus melhores emissários no decorrer dos anos.

“Se pelo menos os avós dessem encorajamento aos seus filhos que tinham tido um bebê com síndrome de Down. Se ao menos eles dissessem aos novos pais: ‘Estou orgulhoso porque D'us escolheu você para ter esta criança, para trazer este tsadic (justo) à nossa família’ – porque se todos tivessem essa atitude, então nenhuma atendente de jardim de infância poderia dizer não para meu filho”.

Dois anos depois da família chegar a Israel, uma amiga mencionou que tinha visto um bebê com síndrome de Down sozinho no hospital de Tzfat. Não demorou muito e Chaya estava visitando o bebê, uma menina, durante todo o dia e formando um profundo apego emocional com ela. Chaya a pegava no colo, cantava para ela, a alimentava e assinou o cartão de registro, “Ima (Mãe)”.

Por fim, Chaya e Yisroel quiseram levá-la para casa e juntá-la à família, onde já havia dois outros irmãos com Down, Avichai e Keren. Porém, os Ben Baruch agora enfrentaram o departamento israelense de bem-estar, que não aprovava a família adotando mais este bebê. “A política em Israel é que se você já tem dois filhos com incapacidades, não pode adotar um terceiro”.

Finalmente, eles me deixaram levá-la para casa temporariamente. Era época de Chanucá, portanto a chamei de Shalchevet (chama).

O departamento de bem estar continuava sua oposição, concedendo à família somente um a dois anos para cuidar de Shalchevet. Foi somente quando ela tinha oito anos de idade que o Ben Baruch receberam a guarda permanente.

Yisroel e Shalchevet
Yisroel e Shalchevet

Em 2005, Chaya ouviu falar de Ori, um bebê de um mês com síndrome de Down abandonado pela mãe num hospital na região de Tel Aviv. Chaya começou a visitar este bebê também no hospital onde ele tinha sido deixado. “Uma hora tornou-se duas, duas se tornaram quatro, e logo eu me vi mudando para o hospital para ficar perto dele vinte e quatro horas por dia.” A mãe de Ori queria que os Ben Baruch se tornassem pais adotivos do bebê, mas o departamento de bem-estar iniciou uma forte batalha, processando a mãe de Ori por não colocá-lo numa instituição.

“Milagrosamente, o juiz que ‘por acaso’ nos atendeu tinha sua própria filha em uma instituição. Ele entendia plenamente a diferença entre um lar amoroso e caloroso e uma instituição, e concedeu-nos guarda permanente de Ori.”

Seis meses depois, Ori passou por uma cirurgia no coração no Hospital Schneider em Petach Tikva. Chaya teve de deixar todos os outros filhos com seu marido em Tzfat e viajar com Ori ao hospital. No hospital, na cama vizinha à de Ori, havia outro bebê abandonado, uma menina com síndrome de Down que tinha sido deixada sozinha no hospital durante cinco meses. Chaya encontrou um lar maravilhoso para a bebê, - surpreendentemente, na casa do advogado que tinha vitoriosamente cuidado da batalha legal para Ori. Assim, a organização Birkat Haderech nasceu, sua meta para encorajar mães novas a manter seus bebês com Down, ou ajudar a colocar esses bebês em lares adotivos amorosos.

Os Ben Baruch mantêm uma grande conexão com Chabad em Tzfat. Yisroel estuda Tanya pela manhã. Ori, com dois anos e meio, frequentemente vai com ele para os serviços matinais antes de entrar em seu ônibus escolar. Yisroel continua a aprender Torá no decorrer do dia numa yeshivá para baalei teshuvá, àqueles que retornam as suas raízes.

“Minha perspectiva e a de meu marido são baseadas em três perguntas, e suas respostas: D'us é perfeito? Sim! Ele faz somente aquilo que é certo e bom para nós? Sim! Ele comete erros? Não! Nossa mazal (boa sorte) é que estamos ambos juntos nisso. Alguém mais teve de dar à luz a nossos filhos adotados para que eles pudessem vir até nós”.

Chaya aconselha pais de crianças com síndrome de Down a ignorar fatos convencionais de desenvolvimento e aceitar seus filhos com suas formas únicas de progresso.“Eu sei como amar incondicionalmente? Sim”.

“Antes, eu pegava as informações de desenvolvimento da criança que diziam em quais meses a criança deveria atingir cada passo – e cortava os meses. Quando meus filhos Down se desenvolveram ao seu próprio passo, eu me fazia essas perguntas: ‘Demorou mais do que o normal? Sim. Ele precisou de mais apoio? Sim. Eu o teria amado menos se ele não atingisse uma conquista? Não. Eu sei como amá-lo incondicionalmente? Totalmente.’”